Avaliação de pacientes com sintomas articulares

PorAlexandra Villa-Forte, MD, MPH, Cleveland Clinic
Revisado/Corrigido: fev. 2024
Visão Educação para o paciente

Alguns distúrbios osteomusculares afetam primariamente as articulações, causando artrite. Outros afetam principalmente os ossos (p. ex., fraturas, osteíte deformante, tumores), músculos (p. ex., miosite), nervos periféricos (p. ex., compressão do nervo ulnar) ou outros tecidos moles periarticulares (p. ex., bursite, tendinite, entorses, lesões ligamentares). A artrite possui uma série de causas possíveis, inclusive infecção, doença autoimune, inflamação induzida por cristais e doenças ósseas e cartilaginosas minimamente inflamatórias (p. ex., osteoartrite). A artrite pode comprometer uma única articulação (monoartrite) ou várias articulações (poliartrite), de maneira simétrica ou assimétrica, com ou sem envolvimento da coluna vertebral.

História em pacientes com sintomas articulares

O médico deve perguntar ao paciente sobre sintomas sistêmicos e extra-articulares, bem como sobre sintomas articulares (1). Vários sintomas e achados clínicos, incluindo os seguintes, podem estar associados a várias doenças articulares e fornecem pistas para o diagnóstico de uma doença sistêmica específica:

  • Febre

  • Calafrios

  • Mal-estar

  • Perda ponderal

  • Fenômeno de Raynaud

  • Exantema

  • Úlceras das mucosas

  • Vermelhidão ou dor ocular

  • Exantemas fotossensíveis

  • Disestesia

  • Sintomas gastrointestinais

  • Sintomas cardiopulmonares

A dor é o sintoma mais comum de muitos distúrbios articulares (ver Dor monoarticular e periarticular e Dor poliarticular). A história deve enfocar característica, localização, gravidade, fatores que agravam ou pioram a dor e período de duração (nova ocorrência ou recorrente). O médico deve determinar se a dor piora com o movimento da articulação ou após uso prolongado, e se a dor está presente ao despertar ou aparece durante o dia. A dor proveniente de estruturas superficiais geralmente é mais facilmente localizada do que a dor que se origina de estruturas mais profundas. A dor originária de pequenas articulações distais tende a ser mais bem localizada que a dor que se origina nas articulações proximais maiores. A dor articular pode ser referida em estruturas extra-articulares ou outras articulações. A artrite frequentemente causa dor “constante”, ao passo que as neuropatias frequentemente causam dor profunda e penetrante ou dor superficial “em queimação”.

Rigidez refere-se à dificuldade de mover uma articulação, mas, para os pacientes, rigidez também significa fraqueza, fadiga ou limitação de movimentos. O médico deve isolar uma incapacidade de movimentar uma articulação da relutância de movimentar a articulação em virtude da dor. As características da rigidez podem sugerir uma causa, como descrito abaixo:

  • O desconforto que ocorre quando se tenta mover uma articulação depois de um período de descanso ocorre na doença reumática sistêmica.

  • A rigidez é mais intensa e prolongada com o agravamento da inflamação articular.

  • O “sinal de teatro” (rigidez rápida do joelho ou quadril ao se levantar precisando andar lentamente após ficar sentado por algumas horas) é comum na osteoartrite.

  • A rigidez matinal nas articulações periféricas que dura > 1 hora pode ser um importante sintoma inicial de inflamação articular, como na artrite reumatoide, artrite psoriática ou artrite viral crônica.

  • Na região lombar das costas, a rigidez matinal que perdura > 1 hora e melhora com o movimento pode indicar espondilite.

A fadiga é um desejo de repousar que reflete exaustão. Ela difere da fraqueza, da incapacidade de mover-se e da relutância de mover-se em decorrência de dor ao movimento. A fadiga pode refletir a atividade de um distúrbio inflamatório sistêmico, bem como de outros distúrbios. Os médicos devem tentar diferenciar fadiga de sonolência.

A instabilidade (flambagem de uma articulação) sugere um desarranjo interno da articulação ou fraqueza dos ligamentos ou outras estruturas periarticulares que estabilizam a articulação, que são avaliados por teste de estresse no exame físico. O encurvamento ocorre com mais frequência no joelho.

Tabela
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Referência sobrea anamnese

  1. 1. Guidelines for the initial evaluation of the adult patient with acute musculoskeletal symptoms. American College of Rheumatology Ad Hoc Committee on Clinical Guidelines. Arthritis Rheum. 1996;39(1):1-8. doi:10.1002/art.1780390102

Exame físico em pacientes com sintomas articulares

Cada articulação envolvida deve ser inspecionada e palpada, e a amplitude de movimentos deve ser estimada. Com a doença poliarticular, certos sinais não articulares (p. ex., febre, exantema, fraqueza muscular) podem refletir distúrbios sistêmicos.

A posição de repouso das articulações é observada, bem como qualquer eritema, edema, deformidade e abrasões ou lesões cutâneas. As articulações envolvidas são comparadas às não envolvidas do lado oposto ou com as do examinador.

As articulações são suavemente palpadas, observando-se a presença e a localização de calor, dor e edema. É particularmente importante determinar se a dor está presente ao longo da linha articular, sobre inserções tendinosas ou bolsas. Massas moles, edemas ou tecidos que preencham concavidades ou espaços normais (representando derrame articular ou proliferação sinovial) são observados. Algumas vezes, a palpação de articulações edemaciadas pode diferenciar derrame articular, espessamento sinovial e deformidade capsular ou óssea. Pequenas articulações (p. ex., acromioclaviculares, tibiofibulares, radioulnares e esternoclaviculares) podem ser a fonte da dor que acreditou-se inicialmente como originária de uma articulação adjacente maior. A deformidade óssea é notada (frequentemente causada por osteófitos).

A amplitude ativa dos movimentos (a amplitude máxima em que o paciente pode mover a articulação) é avaliada primeiro; a limitação pode refletir fraqueza, dor ou rigidez, bem como anormalidades mecânicas. A amplitude passiva de movimentos (a máxima amplitude em que o examinador pode mover uma articulação) é avaliada; a limitação passiva tipicamente reflete anormalidades mecânicas (edema, cicatrizes, deformidades), em vez de fraqueza ou dor. O movimento ativo e passivo de uma articulação inflamada (p. ex., devido a infecção ou gota) pode ser muito dolorido.

A incapacidade de reproduzir a dor com o movimento passivo ou ativo ou por palpação da articulação sugere a possibilidade de dor referida.

O padrão de comprometimento da articulação deve ser observado. O comprometimento simétrico de várias articulações é comum nas doenças sistêmicas (p. ex., artrite reumatoide); o comprometimento monoarticular (comprometendo uma articulação) ou oligoarticular assimétrico (comprometendo 4 articulações) é mais comum na osteoartrite e artrite psoriática. Pequenas articulações periféricas são normalmente afetadas na artrite reumatoide; articulações maiores e a coluna são mais afetadas em espondiloartropatias. Entretanto, um padrão completo de comprometimento pode não estar aparente no início da doença.

Observa-se crepitação, um ranger audível ou palpável produzido pelo movimento das estruturas articulares danificadas. Ela pode ser causada pela deformidade da cartilagem articular ou dos tendões; a crepitação ao movimento deve ser determinada e pode indicar quais estruturas estão envolvidas.

Há várias características específicas que devem ser vistas em cada articulação. Detalhes do exame físico são discutidos separadamente para as seguintes articulações:

Exames em pacientes com sintomas articulares

Os testes de laboratório e de imagem frequentemente fornecem menos informação que a história e o exame físico. Embora alguns testes possam ser justificados em alguns pacientes, testes extensivos não se justificam. Os testes podem incluir

Às vezes, realiza-se biópsia do osso, sinóvia ou de outro tecido.

Exames de sangue

Exames de sangue devem ser selecionados com base na história e em resultados do exame físico. Alguns exames, embora inespecíficos, podem ser úteis para corroborar ou excluir a possibilidade de certas doenças reumáticas sistêmicas, como:

Exames como hematócrito, velocidade de hemossedimentação (velocidade de hemossedimentação) e proteína C reativa (CRP) podem determinar se a artrite é inflamatória, decorrente de infecções ou de outras doenças sistêmicas; porém, tais testes não são altamente específicos ou sensíveis. Por exemplo, anemia normocítica ou VHS ou CRP elevada sugere inflamação articular ou pode ser decorrente de um grande número de condições inflamatórias não articulares (p. ex., infecção, câncer). A elevação também pode não ocorrer em todos os distúrbios inflamatórios.

Exames de imagem

Os exames de imagem não costumam ser necessários. Em particular, as radiografias revelam, principalmente, anormalidades ósseas, e a maioria das doenças articulares não afeta primariamente o osso. No entanto, os exames de imagem podem ajudar na avaliação inicial de anormalidades localizadas, inexplicáveis, persistentes ou graves, particularmente na coluna; elas podem revelar tumores primários ou metastáticos, osteomielite, infartos ósseos, calcificações periarticulares (como na tendinite calcificante) ou outras mudanças em estruturas profundas que podem passar despercebidas no exame físico. Se houver suspeita de artrite reumatoide crônica, gota ou osteoartrite, será possível visualizar erosões, cistos e diminuição do espaço articular com presença de osteófitos. Na artrite por pirofosfato de cálcio (pseudogota), depósitos de pirofosfato de cálcio podem ser visíveis na cartilagem intra-articular (condrocalcinose).

Para a imagem musculoesquelética, radiografia simples deve ser obtida primeiro; ela é menos exata, particularmente durante o estágio inicial da doença, que a tomografia computadorizada (TC), ressonância nuclear magnética (RM) ou ultrassonografia. A RM é o estudo mais acurado para fraturas não visíveis em radiografias simples, particularmente no quadril, na pelve e nas lesões internas dos tecidos moles do joelho. A TC é útil se a RM for contraindicada ou indisponível. A TC também é útil para detectar calcificação periarticular (p. ex., na síndrome do dente coroado), que não seria detectada na RM. TC de dupla energia é útil para detectar deposição de ácido úrico e diagnosticar gota. A ultrassonografia pode detectar proliferação sinovial e hiperemia sugestiva de inflamação nas pequenas articulações das mãos e dos pés, e pode identificar deposição de urato nas articulações afetadas pela gota, mesmo entre crises clínicas. Artrografia e escaneamento ósseo podem ajudar em certas alterações.

Artrocentese

É o processo de puncionar a articulação com uma agulha. Se houver um derrame e a artrocentese for realizada corretamente, os líquidos geralmente serão retirados. O exame do líquido sinovial é a maneira mais precisa de excluir infecção, diagnosticar artrite induzida por cristais e ajudar a determinar a causa dos derrames articulares (1). Indica-se esse procedimento para todos os pacientes com derrames não articulares agudos ou inexplicáveis e para pacientes com derrames poliarticulares inexplicáveis.

A artrocentese é realizada utilizando-se uma técnica estritamente estéril. Uma contraindicação é a presença de infecção ou exantema sobre a região utilizada para a penetração na articulação. Os preparativos para se coletar as amostras devem ser feitos antes de se realizar o procedimento. Anestesia local com lidocaína e/ou spray de difluoretano costuma ser utilizada. Para evitar nervos, artérias e veias que normalmente estão na superfície flexora da articulação, muitas articulações são puncionadas na superfície extensora. Deve-se retirar o máximo de líquido possível. São utilizados reparos anatômicos específicos (ver figuras Artrocentese do ombro, Artrocentese do cotovelo e Artrocentese do joelho). A orientação por ultrassonografia mostrou aumentar a probabilidade de aspiração bem-sucedida.

Exame do líquido sinovial

Ao término do exame são avaliadas características macroscópicas do líquido, como sua cor e claridade.

As características macroscópicas permitem que muitos derrames sejam classificados como não inflamatórios, inflamatórios ou infecciosos (ver tabela Classificação dos derrames sinoviais). Os derrames também podem ser hemorrágicos. Cada tipo de derrame sugere determinados distúrbios articulares (ver tabela Diagnóstico diferencial pela classificação do líquido sinovial). Os chamados derrames não inflamatórios costumam ser levemente inflamatórios e sugerem doenças como osteoartrite e osteonecrose, nas quais a inflamação não é grave.

Tabela
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Os exames laboratoriais comumente realizados do líquido sinovial são a celularidade, contagem diferencial de leucócitos, coloração por Gram e cultura (se houver suspeita de infecção) e exame microscópico a fresco do líquido sinovial para identificar células e cristais. No entanto, os exames exatos frequentemente dependem da suspeita diagnóstica.

Tabela
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O exame microscópico a fresco do líquido sinovial para cristais (são necessárias somente algumas gotas de líquido sinovial) utilizando luz polarizada é essencial para o diagnóstico definitivo de gota, artrite por pirofosfato de cálcio e outras artrites induzidas por cristais. Um polarizador sobre a fonte de luz e outro entre a amostra e o olho do examinador permitem a visualização de cristais com birrefringência branca e brilhante. Fornece-se luz polarizada compensada inserindo-se uma placa vermelha de primeira ordem, como encontrado em kits de microscópio comercialmente disponíveis que podem ser adaptados a microscópios de luz padrão.

Os cristais mais comumente vistos são aqueles diagnósticos de gota (uratos monossódicos, cristais em forma de agulha birrefringência negativa) e artrite por pirofosfato de cálcio (cristais romboides e cilíndricos de pirofosfato de cálcio que com birrefringência positiva ou não birrefringentes). Se a microscopia revelar cristais que não são típicos de uratos monossódicos (gota) ou pirofosfato de cálcio (pseudogota), será necessário considerar os vários cristais menos comuns (colesterol, cristais lipídicos, oxalato, crioglobulinas) ou outras substâncias (p. ex., depósito de cristais corticoides).

Outros achados do líquido sinovial que ocasionalmente podem sugerir um diagnóstico específico incluem:

  • Organismos específicos (identificáveis por corante álcool-ácido resistente ou corante Gram)

  • Espículas medulares ou glóbulos de gordura (causados por fratura)

  • Fragmentos amiloides (identificáveis com corante vermelho do Congo)

  • Glóbulos vermelhos falciformes (causados por hemoglobinopatia falciforme)

Referência sobre exames

  1. 1. Brannan SR, Jerrard DA: Synovial fluid analysis. J Emerg Med 30(3):331-339, 2006. doi:10.1016/j.jemermed.2005.05.029

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