Histiocitose das células de Langerhans (HCL) é uma proliferação das células mononucleares dendríticas com infiltração local ou difusa nos órgãos. A maioria dos casos ocorre em crianças. As manifestações podem incluir infiltrações nos pulmões, lesões ósseas, exantema e disfunções hepáticas, hematopoiéticas e endócrinas. O diagnóstico baseia-se na biópsia. Os indicadores de prognóstico desfavorável são idade < 2 anos e doença disseminada, particularmente comprometendo sistema hematopoético, fígado, baço ou sua combinação. Os tratamentos compreendem medidas de apoio e quimioterapia ou tratamento local com cirurgia ou radioterapia, conforme indicado pela extensão da doença.
(Ver também Histiocitose pulmonar de células de Langerhans.)
A histiocitose de células de Langerhans (HCL) é uma doença de células dendríticas (células apresentadoras de antígenos). Pode produzir síndromes clínicas distintas historicamente descritas como granuloma eosinofílico, doença de Hand-Schüller-Christian e doença de Letterer-Siwe. Como essas síndromes podem ter manifestações variadas da mesma doença de base e como a maioria dos pacientes com HCL tem manifestações de mais de uma dessas síndromes, as designações distintas das síndromes (exceto para granuloma eosinofílico) agora têm muito mais significado histórico. A prevalência de HCL estimada varia bastante (p. ex., de cerca de 1:50.000 a 1:200.000). A incidência é 5 a 8 casos por milhão de crianças.
Todos os pacientes com histiocitose de células de Langerhans têm evidências da ativação da via de sinalização RAS-RAF-MEK-ERK (1). Mutações BRAFV600E são identificadas em 50 a 60% dos pacientes com histiocitose de células de Langerhans. Essa mutação é monoalélica e age como um oncogene dominante. Cerca de 10 a 15% dos pacientes têm mutações MAP2K1. Por causa dessas mutações, agora considera-se a histiocitose de células de Langerhans como sendo um tipo de câncer de linhagem mieloide causado por oncogene.
Na HCL, as células dendríticas anormalmente proliferativas infiltram-se em um ou mais órgãos. Osso, pele, dentes, tecido da gengiva, orelhas, órgãos endócrinos, pulmões, fígado, baço, linfonodos e medula óssea podem estar envolvidos. Os órgãos podem ser afetados por infiltração, causando disfunção, ou por compressão das estruturas adjacentes aumentadas. Em torno de metade dos pacientes há envolvimento de múltiplos órgãos.
Referência geral
1. Allen CE, Merad M, McClain KL: Langerhans-cell histiocytosis. N Engl J Med 379(9):856–868, 2018. doi: 10.1056/NEJMra1607548
Sinais e sintomas da histiocitose das células de Langerhans
Os sinais e sintomas da histiocitose de células de Langerhans variam consideravelmente dependendo dos órgãos infiltrados.
Dividem-se os pacientes em 2 grupos de acordo com o comprometimento de órgãos e sistemas:
Um único sistema
Multissistêmico
A doença de um único sistema é o comprometimento uni- ou multifocal de um dos órgãos a seguir: ossos, pele, linfonodo, pulmão, sistema nervoso central ou outros locais raros (p. ex., tireoide ou timo). Um exemplo de doença de um único sistema é o granuloma eosinofílico.
A doença multissistêmica é doença em dois ou mais órgãos ou sistemas. Os órgãos que envolvem risco (órgãos nos quais o envolvimento da doença indica pior prognóstico), que incluem o fígado, baço e órgãos do sistema hematopoiético, podem ou não ser afetados. Um exemplo de doença multissistêmica sem comprometimento dos órgãos de risco é a doença de Hand-Schüller-Christian. Um exemplo de doença multissistêmica com comprometimento de órgãos de risco é a doença de Letterer-Siwe.
Aqui, as síndromes são descritas de acordo com suas designações históricas, mas poucos pacientes apresentam manifestações clássicas e, além de granuloma eosinofílico, essas designações não mais são utilizadas.
Image courtesy of Karen McKoy, MD.
Granuloma eosinofílico (doença de um único sistema)
Lesões de sistema único unifocais ou multifocais (60 a 80% dos casos de histiocitose de células de Langerhans) ocorrem predominantemente em crianças maiores e adultos jovens, geralmente por volta dos 30 anos de idade; a incidência é mais elevada entre 5 e 10 anos de idade. A maioria das lesões envolve frequentemente o osso, com dor e/ou incapacidade para suportar peso e em associação ao edema amolecido (às vezes quente).
Reticulo-histiocitose congênita autolimitada
A reticulo-histiocitose congênita autolimitada (previamente chamada doença de Hashimoto-Pritzker) é uma doença de sistema único com lesões cutâneas isoladas que ocorre em neonatos. Em geral, as lesões desaparecem por conta própria ou respondem ao tratamento tópico. Deve-se avaliar os pacientes para excluir doença sistêmica.
Doença de Hand-Schüller-Christian (doença multissistêmica sem comprometimento de órgãos de risco)
Essa síndrome (15 a 40% dos casos de HCL) ocorre em crianças com idade de 2 a 5 anos, em algumas crianças mais velhas e adultos. Resultados clássicos nessa doença sistêmica incluem envolvimento dos ósseos chatos do crânio, arcos costais, pelve, escápula ou uma combinação. Os ossos longos e as vértebras lombossacrais são envolvidos com menos frequência; punhos, mãos, joelhos, pés e vértebras cervicais são raramente envolvidos. Em casos clássicos, os pacientes apresentam proptose causada por massa tumoral orbital. Perda da visão ou estrabismo provocado pelo envolvimento de nervo óptico ou músculo orbital ocorre raramente. A perda de dentes ocasionada por infiltração apical e gengival é comum em pacientes idosos.
Otite média crônica e otite externa decorrentes do envolvimento do mastoide e porções petrosas do osso temporal, com obstrução temporal do canal auditivo, são comuns. Diabetes insípido, o último componente da tríade clássica com compromento dos ossos longos e proptose, atinge 5% a 50% dos pacientes, com maior percentual nas crianças que têm doença sistêmica e comprometimento da órbita e do crânio. Até 40% das crianças com doença sistêmica têm baixa estatura. Hiperprolactinemia e hipogonadismo podem resultar de infiltração hipotalâmica.
Doença de Letterer-Siwe (doença multissistêmica com comprometimento de órgãos de risco)
Essa síndrome (10% dos casos de HCL), uma doença sistêmica, é a forma mais grave da histiocitose de células de Langerhans. Tipicamente, uma criança com < 2 anos de idade apresenta seborreia descamativa, eczematoide, algumas vezes exantema purpúrico envolvendo couro cabeludo, canais auditivos, abdome e áreas intertriginosas do pescoço e da face. A pele nua pode facilitar invasão microbiana, causando sepsia. Há frequentemente corrimento na orelha, linfadenopatia, hepatosplenomegalia e, em casos graves, disfunção hepática com hipoproteinemia e diminuição da síntese de fatores de coagulação. Anorexia, irritabilidade, má evolução ponderal e sintomas pulmonares (p. ex., tosse, taquipneia, pneumotórax) também podem ocorrer. Anemia significativa e, às vezes, neutropenia ocorrem; trombocitopenia é de grave significado prognóstico. Os pais relatam, com frequência, erupção precoce dos dentes, quando, na verdade, as gengivas estão recuando e expondo dentição imatura. Pode parecer que os pacientes tenham sofrido abuso ou negligência.
Xantogranuloma juvenil
O xantogranuloma juvenil é uma síndrome histiocítica relacionada com células dendríticas que costuma afetar apenas a pele, causando lesões únicas ou múltiplas, que podem se resolver espontaneamente. Pode ocorrer envolvimento sistêmico, que causa lesões em órgãos viscerais, envolvendo o fígado, pulmões e/ou medula óssea. Pode-se utilizar corticoides tópicos ou sirolimo para tratar as lesões cutâneas. . Lesões sistêmicas são tratadas com quimioterapia semelhante àquela utilizada na histiocitose de células de Langerhans. Identificaram-se mutações na via da proteína quinase ativada por mitógenos (MAPK), de modo que pode-se utilizar também a terapia alvo. Em casos raros, o xantogranuloma juvenil está associado à neurofibromatose e/ou leucemia mielomonocítica juvenil.
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Diagnóstico da histiocitose de células de Langerhans
Biópsia
Suspeitar histiocitose de células de Langerhans nos pacientes (particularmente pacientes jovens) com infiltrados pulmonares criptogênicos, lesões ósseas, anomalias oculares ou craniofaciais; e em crianças com < 2 anos de idade e exantema típico ou doença grave em vários órgãos sem outro diagnóstico.
By permission of the publisher. From Swearingen B, Schaefer P, Primavera J, Klibanski A. In Atlas of Clinical Endocrinology: Neuroendocrinology and Pituitary Disease. Edited by S Korenman (series editor) and ME Molitch. Philadelphia, Current Medicine, 2000.
Image courtesy of Carolyn Fein Levy, MD, and Jeffrey M. Lipton, MD, PhD.
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Radiografias são obtidas quase sempre em razão dos sintomas apresentados. As lesões ósseas são, geralmente, marginais e redondas ou ovais, com ponta angulada, dando aparência de profundidade. Algumas lesões, porém, são radiograficamente indiferenciáveis de sarcoma de Ewing, osteosarcoma, outras doenças benignas e malignas ou osteomielite.
O diagnóstico baseia-se na biópsia. As células de Langerhans são normalmente proeminentes, exceto em lesões mais antigas. O patologista experiente identifica essas células no diagnóstico da histiocitose de células de Langerhans de acordo com suas características imunoistoquímicas, como CD1a, CD207 (langerina) e S-100 (embora inespecífico) na superfície da célula. Deve-se testar o tecido tumoral quanto à presença da mutação BRAFV600E e outras mutações na via MAPK. Depois de fazer o diagnóstico, deve-se determinar a extensão da doença por meio de exames de imagem e laboratoriais apropriados.
Os exames laboratoriais utilizados para definir a extensão da doença são:
Hemograma completo com contagem diferencial
Perfil metabólico abrangente
Estudos de coagulação
Urinálise (primeira urina da manhã)
Os exames de imagem são:
Radiografias de corpo inteiro, inclusive de tórax
Ultrassonografia abdominal
RM do cérebro (para avaliar a hipófise)
RM da coluna vertebral
RM ou TC de crânio (para procurar lesões no osso temporal)
RM ou TC da órbita (para procurar lesões nos ossos da face)
TC do tórax (se a radiografia de tórax tiver alterações)
TC ou RM do abdome (se o exame revelar hepatoesplenomegalia ou se os resultados das provas da função hepática revelarem alterações)
PET/TC se disponível (porque pode identificar lesões ósseas não vistas nas radiografias de corpo inteiro)
Prognóstico da histiocitose de células de Langerhans
Em geral, consideram-se de baixo risco os pacientes com doença em um único sistema [unifocal, multifocal e lesões de risco do sistema nervoso central (SNC)] e doença multissistêmica sem comprometimento dos órgãos em risco. Consideram-se de alto risco os pacientes com doença multissistêmica e comprometimento de órgãos de risco.
O prognóstico é bom para os pacientes com histiocitose de células de Langerhans e dois dos seguintes:
Doenças restritas à pele, aos linfonodos ou aos ossos
Idade > 2 anos
Morbidade e mortalidade aumentada nos pacientes com comprometimento multissistêmico, sobretudo naqueles com
Idade < 2 anos
Comprometimento de órgãos de risco (sistema hematopoético, fígado ou baço)
O comprometimento dos ossos zigomático, esfenoidal, orbital, etmoidal ou temporal denota uma categoria de risco de lesão no sistema nervoso central que confere maior risco de doença neurodegenerativa do crânio e na parte anterior da face.
Com o tratamento, sobrevida global para os pacientes com doença multissistêmica é de 100%, mas a sobrevida livre de eventos é de cerca de 70%. A morte é rara entre os pacientes com comprometimento de órgãos sem resposta ao tratamento inicial. A recorrência da doença é comum. Remissão e exacerbação crônicas na evolução podem ocorrer, especialmente em pacientes adultos.
Algumas evidências sugerem que os pacientes com mutações BRAFV600E são mais propensos a recorrências.
Tratamento da histiocitose de células de Langerhans
Cuidados de suporte
Às vezes, terapia de reposição hormonal para hipopituitarismo, mais comumente diabetes insípido
Quimioterapia para comprometimento multissistêmico, multifocal de um único sistema e de certos locais como as lesões no crânio
Algumas vezes, cirurgia, corticoides injetáveis ou, raramente, radioterapia (geralmente no comprometimento ósseo unifocal)
O cuidado de suporte geral é essencial e pode incluir higiene cuidadosa para limitar lesões auditivas, cutâneas e dentárias. Desbridamento ou excisão do tecido gengival gravemente afetado limita o envolvimento oral. Dermatite do tipo seborreia no couro cabeludo pode ser diminuída com o uso de xampu à base de selênio duas vezes por semana. Se o xampu não fizer efeito, corticoides tópicos são utilizados em pequenas quantidades e por pouco tempo em pequenas áreas.
Os pacientes com doença sistêmica são monitorados por deficiências crônicas potenciais, como distúrbios ortopédicos e funcionais, bem como estéticos ou cutâneos e lesões neurológicas, assim como para problemas psicológicos que possam requerer apoio psicossocial.
Muitos pacientes necessitam de reposição hormonal para diabetes insípido ou outras manifestações de hipopituitarismo.
Indicar quimioterapia para os pacientes com comprometimento multissistêmico, multifocal de um único sistema e doença em certos locais, como lesões no crânio (ossos zigomático, orbital, esfenoidal, temporal e etmoidal—1, 2). Os protocolos apoiados pela Histiocyte Society são utilizados; os protocolos de tratamento variam de acordo com a categoria de risco. Repetem-se os exames de imagem em 6 e 12 semanas para avaliar a resposta ao tratamento. Pacientes com boa resposta continuarão com o tratamento (3). Pacientes com resposta ou progressão ruim durante o tratamento devem ser submetidos a tratamento mais intensivo. Protocolos para pacientes com má resposta com metas de terapia de resgate agressiva precoce estão em andamento.
Utilizar cirurgia local, corticoides injetável, curetagem ou, raramente, radioterapia para doença compromentendo apenas um osso. Esses tratamentos devem ser feitos por especialistas experientes no tratamento da histiocitose de células de Langerhans. Lesões de acesso fácil em locais não críticos são submetidas à curetagem cirúrgica. A cirurgia deve ser evitada quando puder resultar em deformidades estéticas e/ou ortopédica ou perda da função.
Historicamente, radioterapia era às vezes administrada a pacientes com risco de deformação do esqueleto, perda da visão secundária a proptose, fraturas patológicas, colapso vertebral ou lesão na medula espinal, ou a pacientes com dor intensa. No entanto, com o uso de quimioterapia e fármacos direcionados, é raramente necessário.
Pacientes com histiocitose de células de Langerhans que evolui apesar da terapia padrão normalmente respondem à quimioterapia mais agressiva. Os pacientes que não respondem à quimioterapia de resgate podem fazer transplante de células-tronco hematopoiéticas de intensidade reduzida, quimioterapia experimental, terapia imunossupressora ou outra terapia imunomoduladora. Pacientes com mutações BRAFV600E nos quais várias linhas de tratamento falham podem ser candidatos aos inibidores do BRAF (p. ex., vemurafenibe, dabrafenibe) isoladamente ou em combinação com o inibidor da MEK (p. ex., trametinibe); para aqueles com outras mutações, pode-se considerar o tratamento com inibidores da RAS-RAF-MEK-ERK (p. ex., trametinibe, cobimetinibe — 4).
Referências sobre tratamento
1. Minkov M, Grois N, McClain K, et al: Langerhans cell histiocytosis: Histocyte Society evaluation and treatment guidelines. April 2009.
2. Haupt R, Minkov M, Astigarraga I, et al: Langerhans cell histiocytosis (LCH): guidelines for diagnosis, clinical work-up, and treatment for patients till the age of 18 years. Pediatr Blood Cancer 60(2):175–184, 2013. doi: 10.1002/pbc.24367
3. Gadner H, Minkov M, Grois N, et al: Therapy prolongation improves outcome in multisystem Langerhans cell histiocytosis. Blood 121(25):5006–5014, 2013. doi: 10.1182/blood-2012-09-455774
4. Suh JK, Kang S, Kim H, et al: Recent advances in the understanding of the molecular pathogenesis and targeted therapy options in Langerhans cell histiocytosis. Blood Res 56(S1):S65–S69, 2021. doi: 10.5045/br.2021.2021013
Pontos-chave
A histiocitose das células de Langerhans envolve uma proliferação das células mononucleares dendríticas que se infiltram em um ou mais órgãos.
As manifestações variam significativamente dependendo do (s) órgão (s) afetado (s).
As lesões ósseas causam dor; lesões na base do crânio podem comprometer a visão, audição e função pituitária (causando particularmente diabetes insípido).
Fígado, baço, linfonodos e medula óssea podem ser comprometidos, piorando o prognóstico.
Utilizar cirurgia, curetagem com ou sem injeções de corticoides para lesões ósseas únicas.
Utilizar quimioterapia para comprometimento multissistêmico, multifocal e local do crânio.
Informações adicionais
Os recursos em inglês a seguir podem ser úteis. Observe que este Manual não é responsável pelo conteúdo desses recursos.
Histiocyte Society: International society for research into treatment of histiocytic diseases
North American Consortium for Histiocytosis: Conducts clinical and translational studies on histiocytosis and supports researchers and clinicians working in the field