Doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC)

(Bronquite obstrutiva crônica; enfisema)

PorRobert A. Wise, MD, Johns Hopkins Asthma and Allergy Center
Revisado/Corrigido: mai. 2024
Visão Educação para o paciente

A doença pulmonar obstrutiva crônica é a limitação do fluxo de ar provocada por resposta inflamatória a toxinas inalatórias, frequentemente fumaça de cigarro. Deficiência de alfa-1 antitripsina e uma variedade de exposições ocupacionais constituem causas menos comuns em indivíduos que não são tabagistas. Os sintomas compreendem tosse produtiva e dispneia, que se desenvolvem durante anos, e os sinais comuns envolvem a diminuição dos sons respiratórios e a ausculta de sibilos. Os casos graves podem ser complicados por perda ponderal, pneumotórax, episódios frequentes de descompensação aguda, insuficiência cardíaca direita e/ou insuficiência respiratória aguda ou crônica. O diagnóstico baseia-se na história, no exame físico, na radiografia do tórax e nos testes de função pulmonar. O tratamento é com broncodilatadores, corticoides e, se necessário, oxigênio e antibióticos. Utilizam-se procedimentos de redução do volume pulmonar ou transplante de pulmão na doença avançada. A sobrevida na DPOC está relacionada com a gravidade da limitação do fluxo aéreo, a frequência das exacerbações e a presença de comorbidades.

A DPOC envolve

  • Bronquite obstrutiva crônica (determinada clinicamente)

  • Enfisema pulmonar (determinado patológica ou radiologicamente)

Muitos pacientes têm características de ambos.

A bronquite obstrutiva crônica é a bronquite crônica com obstrução das vias respiratórias. A bronquite crônica é definida como tosse produtiva na maioria dos dias da semana, com duração total de pelo menos 3 meses em 2 anos consecutivos. A bronquite crônica torna-se bronquite obstrutiva crônica se houver o desenvolvimento de evidências espirométricas de obstrução das vias respiratórias. A bronquite asmática crônica é uma condição sobreposta semelhante, caracterizada por tosse produtiva crônica, sibilos e obstrução parcialmente reversível das vias respiratórias em tabagistas com história de asma. Quando asma e DPOC coexistem no mesmo paciente, o tratamento farmacológico deve seguir as diretrizes para a asma (1).

O enfisema pulmonar é a destruição do parênquima pulmonar, acarretando a perda da retração elástica dos septos alveolares e da tração radial das vias respiratórias, o que aumenta a tendência ao colapso destas. É sucedido por hiperinsuflação pulmonar, limitação do fluxo aéreo e aprisionamento de ar. Os espaços aéreos dilatam-se e com o tempo desenvolvem vesículas ou bolhas. Considera-se a obliteração das pequenas vias respiratórias a lesão mais precoce que precede o desenvolvimento do enfisema.

Referência geral

  1. 1. Global Initiative for Chronic Obstructive Lung Disease (GOLD): Diagnosis and assessment. Global Strategy for the Prevention, Diagnosis, and Management of COPD: 2024 report.

Epidemiologia da DPOC

Estima-se que cerca de 24 milhões de pessoas nos Estados Unidos têm limitação do fluxo de ar, das quais cerca de 16 milhões têm diagnóstico de DPOC. A DPOC é a principal causa de morte, resultando em mais de 140.000 mortes a cada ano nos Estados Unidos (2). As taxas de prevalência, incidência e mortalidade aumentam com a idade. A prevalência é mais elevada em mulheres, mas a mortalidade total é semelhante em ambos os sexos. A DPOC parece ter um padrão famíliar, independentemente da deficiência de alfa-1 antitripsina (deficiência do inibidor de alfa-1-antiprotease).

A DPOC está mais frequente todo o mundo por causa do aumento do tabagismo e da redução na taxa de mortalidade por doenças infecciosas. Em algumas regiões, o uso disseminado de combustíveis de biomassa, como madeira, gramíneas ou outros materiais orgânicos, também contribui para a prevalência da DPOC. As taxas de mortalidade por DPOC podem ser mais altas em países com más condições clínicas do que em países com maior acesso a cuidados de saúde. A DPOC foi responsável por 3,23 milhões de mortes em todo o mundo em 2019 e é a terceira principal causa de morte.

A pandemia de covid-19 representou um risco particular para pacientes com DPOC. A taxa de mortalidade para pacientes com DPOC e covid-19 foi de 15% versus 4% naqueles sem DPOC (.).

Referências sobre epidemiologia

  1. 1. Centers for Disease Control and Prevention: Chronic Obstructive Pulmonary Disease (COPD). Atualizado em 30 de junho de 2023.

  2. 2. Centers for Disease Control and Prevention: National Center for Health Statistics: Leading Causes of Death. Atualizado em 22 de janeiro de 2022.

  3. 3. Meza D, Khuder B, Bailey JI, et al: Mortality from COVID-19 in patients with COPD: A US study in the N3C Data Enclave. Int J Chron Obstruct Pulmon Dis 16:2323–2326, 2021. doi: 10.2147/COPD.S318000

Etiologia da DPOC

Existem 2 principais causas de DPOC:

  • Tabagismo (e, menos frequentemente, outras exposições inalatórios)

  • Fatores genéticos

Tabagismo e outras exposições por inalação

De todas as exposições por inalação, o tabagismo é o principal fator de risco na maioria dos países, embora apenas cerca de 15% das pessoas que fumam desenvolvam DPOC clinicamente aparente (1). O risco de DPOC aumenta com a duração (anos de tabagismo) e a dose cumulativa (anos-maço) (2). Tabagistas com reatividade preexistente das vias respiratórias (definida pelo aumento da sensibilidade à inalação de metacolina), mesmo na ausência de asma clínica, têm maior risco de desenvolver DPOC do que aqueles que não têm essa reatividade.

A fumaça proveniente da queima de madeira em ambientes internos é um fator causal importante em países onde fogueiras em ambientes internos são comumente utilizadas para cozinhar ou aquecer (3).

Exposição à fumaça passiva de cigarros, poluição do ar, e poeira ocupacional (p. ex., poeira mineral, pó de algodão) ou produtos químicos inaláveis (p. ex., cádmio) contribuem para o risco de DPOC, mas são menos importantes em comparação ao tabagismo. Baixo peso corporal e distúrbios respiratórios na infância também contribuem para o risco de DPOC.

Fatores genéticos

A doença genética causadora mais bem definida é a deficiência de alfa-1 antitripsina, que é uma causa importante de enfisema em não tabagistas e aumenta acentuadamente a suscetibilidade à doença em fumantes.

Descobriu-se que mais de 30 alelos genéticos estão associadas à DPOC ou à deterioração da função pulmonar em populações específicas, mas nenhum mostrou ser tão relevante quanto a alfa-1 antitripsina.

Referências sobre etiologia

  1. 1. Wheaton AG, Liu Y, Croft JB, et al: Chronic Obstructive Pulmonary Disease and Smoking Status - United States, 2017. MMWR Morb Mortal Wkly Rep 68(24):533–538, 2019. doi:10.15585/mmwr.mm6824a1

  2. 2. Bhatt SP, Kim YI, Harrington KF, et al. Smoking duration alone provides stronger risk estimates of chronic obstructive pulmonary disease than pack-years. Thorax 2018;73(5):414-421. doi:10.1136/thoraxjnl-2017-210722

  3. 3. Ortiz-Quintero B, Martínez-Espinosa I, Pérez-Padilla R: Mechanisms of Lung Damage and Development of COPD Due to Household Biomass-Smoke Exposure: Inflammation, Oxidative Stress, MicroRNAs, and Gene Polymorphisms. Cells 12(1):67, 2022. doi:10.3390/cells12010067

Fisiopatologia da DPOC

Vários fatores causam a limitação do fluxo aéreo e outras complicações da DPOC.

Inflamação

Em indivíduos geneticamente suscetíveis, as exposições inalatórias deflagram uma resposta inflamatória nas vias respiratórias e nos alvéolos, que desencadeia a doença. Admite-se que o processo seja mediado pelo aumento da atividade da protease e pela diminuição da atividade antiprotease. As proteases pulmonares, como a elastase neutrofílica, as metaloproteinases da matriz e as catepsinas, provocam a lise da elastina e do tecido conjuntivo no processo normal de reparação tecidual. A atividade dessas proteases costuma ser balanceada por antiproteases, como alfa-1 antitripsina, inibidor da leucoproteinase secretória derivada do epitélio, elafina e inibidor tecidual da metaloproteinase da matriz. Em pacientes com DPOC, a ativação de neutrófilos e de outras células inflamatórias libera proteases como parte do processo inflamatório; a atividade da protease supera a atividade da antiprotease, resultando em destruição tecidual e hipersecreção de muco.

A ativação de neutrófilos e macrófagos também provoca acúmulo de radicais livres, ânions superóxidos e peróxido de hidrogênio, que inibem as antiproteases e causam broncoconstrição, edema de mucosa e hipersecreção. A lesão oxidante induzida pelo neutrófilo, a liberação de neuropeptídeos pró-fibróticos (p. ex., bombesina) e a redução dos níveis de fator de crescimento endotelial vascular (VEGF) podem contribuir para a destruição do parênquima pulmonar apoptótico.

A inflamação na doença pulmonar obstrutiva crônica aumenta à medida que a gravidade da doença aumenta e, na doença grave (avançada), a inflamação não desaparece completamente com a cessação do tabagismo. Essa inflamação crônica parece não responder aos corticoides, especialmente em pacientes que continuam a fumar cigarros (1).

O estresse mecânico nos alvéolos decorrentes da hiperinsuflação pode torná-los suscetíveis a proteases, levando à destruição do septo alveolar e enfisema progressivo. Isso é particularmente notável nos lobos superiores do pulmão (2).

Infecção

A infecção respiratória (à qual pacientes com DPOC são propensos) pode amplificar a progressão da destruição do pulmão.

As bactérias, especialmente Haemophilus influenzae, colonizam as vias respiratórias inferiores em cerca de 30% dos pacientes com doença pulmonar obstrutiva crônica (3). Em pacientes com comprometimento mais grave (p. ex., naqueles com hospitalizações prévias), a colonização por Pseudomonas aeruginosa e outras bactérias gram-negativas é comum. O tabagismo e a obstrução das vias respiratórias acarretam o comprometimento da depuração do muco das vias respiratórias, o que predispõe à infecção. Os surtos repetidos de infecção conduzem ao aumento da magnitude do processo inflamatório, que acelera a progressão da doença. Entretanto, não existem evidências de que o uso a longo prazo de antibióticos diminua a progressão da DPOC.

Limitação do fluxo de ar

A característica fisiopatológica primordial da DPOC é a limitação do fluxo aéreo provocada por estreitamento e/ou obstrução das vias respiratórias, perda de retração elástica, ou ambas.

Estreitamento e obstrução das vias respiratórias são causados por inflamação mediada pela hipersecreção de muco, tamponamento de muco, espasmo brônquico, fibrose peribrônquica e remodelação das pequenas vias respiratórias ou uma combinação desses mecanismos. Os septos alveolares são destruídos, reduzindo as inserções do parênquima nas vias respiratórias, facilitando assim o fechamento delas durante a expiração.

Os espaços alveolares dilatados às vezes se fundem em bolhas, definidas como espaços aéreos 1 cm de diâmetro. As bolhas podem estar totalmente vazias ou ter filamentos de tecido pulmonar que as atravessam em áreas de enfisema localmente grave e, ocasionalmente, ocupam todo o hemitórax. Essas mudanças provocam a perda do recolhimento elástico e a hiperinflação pulmonar.

A maior resistência das vias respiratórias aumenta o trabalho de respiração. Hiperinsuflação pulmonar, embora diminua a resistência das vias respiratórias, também aumenta o esforço respiratório. O aumento do trabalho respiratório pode levar à hipoventilação alveolar com hipóxia e hipercapnia, embora hipóxia e hipercarbia também possam ser causadas pelo desequilíbrio entre ventilação e perfusão (V/Q).

Complicações

Além da limitação do fluxo aéreo e da insuficiência respiratória, as complicações às vezes incluem

  • Hipertensão pulmonar

  • Infecção respiratória

  • Perda ponderal e outras comorbidades

Hipoxia alveolar crônica aumenta o tônus vascular pulmonar que, se difuso, causa hipertensão pulmonar e cor pulmonale. O aumento na pressão vascular pulmonar pode ocorrer por causa da destruição do leito capilar pulmonar em decorrência da destruição dos septos alveolares.

Infecções respiratórias virais ou bacterianas são comuns entre os pacientes com DPOC e causam uma grande porcentagem das agudizações. Atualmente, acredita-se que as infecções bacterianas agudas são decorrentes da aquisição de novas cepas de bactérias, em vez de provenientes do crescimento de bactérias colonizadoras crônicas.

Pode haver perda ponderal, talvez em resposta à insuficiente ingestão calórica e aumento dos níveis circulantes do fator de necrose tumoral (TNF)-alfa. Essa perda ponderal pode decorrer de um descompasso entre o gasto calórico e a ingestão nutricional porque o gasto calórico pode ser alto na presença de citocinas inflamatórias aumentadas e hipoxemia.

Outras doenças coexistentes ou complicantes que afetam de maneira negativa a qualidade de vida e/ou a sobrevida são osteoporose, depressão, ansiedade, doença coronariana, arritmias, câncer de pulmão e outros cânceres, atrofia muscular e refluxo gastresofágico. Não se sabe se esses transtornos são consequências da DPOC, do tabagismo, ou da inflamação sistêmica associada.

Referências sobre fisiopatologia

  1. 1. Adcock IM, Bhatt SP, Balkissoon R, Wise RA: The Use of Inhaled Corticosteroids for Patients with COPD Who Continue to Smoke Cigarettes: An Evaluation of Current Practice. Am J Med 135(3):302–312, 2022. doi:10.1016/j.amjmed.2021.09.006

  2. 2. Suki B, Sato S, Parameswaran H, Szabari MV, Takahashi A, Bartolák-Suki E: Emphysema and mechanical stress-induced lung remodeling. Physiology (Bethesda) 28(6):404–413, 2013. doi:10.1152/physiol.00041.2013

  3. 3. Short B, Carson S, Devlin AC, et al: Non-typeable Haemophilus influenzae chronic colonization in chronic obstructive pulmonary disease (COPD). Crit Rev Microbiol 47(2):192–205, 2021. https://doi.org/10.1080/1040841X.2020.1863330

Sinais e sintomas da DPOC

A DPOC leva anos para se desenvolver e progredir.

  • Habitualmente, a tosse produtiva é o sintoma inicial em pacientes tabagistas entre 40 a 60 anos de idade.

  • A dispneia que é progressiva, persistente, relacionada com o esforço ou que piora na vigência de infecção respiratória surge eventualmente no momento em que o paciente está entre os 50 e 70 anos de idade.

Em geral, os sintomas progridem rapidamente em pacientes que continuam a fumar e têm exposição mais elevada ao tabaco durante a vida toda. A cefaleia matinal desenvolve-se na doença mais avançada e sinaliza hipercapnia ou hipoxemia noturnas.

Os sinais de DPOC incluem sibilos, uma fase expiratória prolongada da respiração; hiperinsuflação pulmonar que se manifesta pela atenuação dos sons cardíacos e pulmonares; e aumento do diâmetro anteroposterior do tórax (tórax em barril).

Os sinais da doença avançada envolvem respiração com lábios cerrados, uso de músculos respiratórios acessórios, movimento paradoxal da caixa torácica inferior para dentro durante a inspiração (sinal de Hoover) e cianose. Os sinais de cor pulmonale incluem distensão da veia do pescoço; desdobramento da 2ª bulha cardíaca, com hiperfonese do componente pulmonar; sopro da insuficiência tricúspide; e edema periférico. Os impulsos do ventrículo direito são incomuns na DPOC, em virtude da hiperinsuflação pulmonar.

Pacientes com enfisema avançado perdem peso e desenvolvem perda muscular decorrente da imobilidade; hipóxia; ou da liberação de mediadores inflamatórios sistêmicos, como TNF-alfa.

O pneumotórax espontâneo pode ocorrer (possivelmente relacionado com ruptura das bolhas) e deve-se suspeitar dele em qualquer paciente com DPOC cujo estado pulmonar piora de maneira abrupta.

Os sintomas podem ser classificados de acordo com as atividades que causam dispneia [ver tabela Medição da falta de ar utilizando o Modified British Medical Research Council (mMRC) Questionnaire].

Tabela

Exacerbações agudas

As agudizações ocorrem de forma esporádica durante a evolução da DPOC e são anunciadas pelo aumento da gravidade dos sintomas. A causa específica de qualquer exacerbação é quase sempre impossível de ser determinada, mas as exacerbações são frequentemente atribuídas à infecção da via respiratória superior de etiologia viral, bronquite bacteriana aguda ou exposição a irritantes respiratórios. À medida que a doença pulmonar obstrutiva crônica progride, as agudizações tendem a se tornar mais frequentes, chegando a cerca de 1 a 3 episódios/ano.

Diagnóstico da DPOC

  • Exames de imagem do tórax

  • Testes de função pulmonar

Sugere-se o diagnóstico pela história clínica, exame físico e achados de exames de imagem do tórax e é confirmado por testes de função pulmonar. Sintomas semelhantes podem ser causados por asma, insuficiência cardíaca e bronquiectasia (ver tabela Diagnóstico diferencial da DPOC). DPOC e asma são, às vezes, facilmente confundidas e podem coexistir.

Tabela
Tabela

Os distúrbios sistêmicos que podem ter um componente de limitação do fluxo aéreo sugerem DPOC; incluem infecção por HIV, abuso de drogas ilícitas (particularmente cocaína e anfetaminas), sarcoidose, síndrome de Sjögren, bronquiolite obliterante, linfangioleiomiomatose e granuloma eosinofílico. Pode-se diferenciar a doença pulmonar obstrutiva crônica das doenças pulmonares intersticiais por exames de imagem do tórax, que mostram aumento das marcações intersticiais nas doenças pulmonares intersticiais, e testes de função pulmonar, que revelam um defeito ventilatório restritivo em vez de um defeito obstrutivo. Em alguns pacientes, a doença pulmonar obstrutiva crônica e doenças pulmonares intersticiais coexistem [fibrose pulmonar e enfisema combinados (FPEC)]. Nesse caso, os volumes pulmonares estão relativamente preservados, mas as trocas gasosas estão gravemente comprometidas.

Testes de função pulmonar

Pacientes com suspeita de DPOC devem ser submetidos a testes de função pulmonar para confirmar a limitação do fluxo aéreo e quantificar a sua gravidade e reversibilidade e para distinguir a DPOC de outros distúrbios. (Alguns especialistas recomendam rastreamento com testes de função pulmonar a todos os pacientes com história de tabagismo.) Os testes de função pulmonar também são úteis para o acompanhamento da progressão da doença e o monitoramento da resposta ao tratamento. Os principais testes diagnósticos são

  • VEF1: o volume de ar expirado vigorosamente durante o primeiro segundo depois de fazer uma inspiração completa

  • Capacidade vital forçada (CVF): o volume total de ar expirado com força máxima

  • Curvas de fluxo-volume: registros espirométricos simultâneos do volume e fluxo aéreos durante expiração e inspiração máximas

A redução do VEF1, da CVF e da razão VEF1/CVF é um aspecto característico da obstrução das vias respiratórias. As curvas de fluxo-volume revelam padrão côncavo do traçado expiratório (ver figura Curvas fluxo-volume).

Há 2 vias básicas pelas quais a DPOC pode se desenvolver e se manifestar com sintomas mais tarde na vida:

  • Na primeira via, os pacientes podem ter função pulmonar normal no início da idade adulta, o que é seguido por um declínio mais rápido do VEF1 (≥ 60 mL/ano).

  • Com a segunda via, os pacientes têm função pulmonar prejudicada no início da idade adulta, frequentemente associada à asma ou a outras doenças respiratórias da infância. Nesses pacientes, a doença pulmonar obstrutiva crônica pode apresentar-se com um declínio normal relacionado com a idade no VEF1 (cerca de 30 mL/ano).

Embora esse modelo de 2ª via seja conceitualmente útil, é possível uma ampla variedade de trajetórias individuais (1). Quando o VEF1 cai abaixo de 1 L, os pacientes desenvolvem dispneia durante as atividades cotidianas [embora a dispneia esteja mais relacionada ao grau de hiperinsuflação dinâmica (hiperinsuflação progressiva devido à exalação incompleta) do que ao grau de limitação ao fluxo aéreo]. Quando o VEF1 cai abaixo de cerca de 0,8 L, os pacientes têm risco de hipoxemia, hipercapnia e cor pulmonale.

VEF1 e CVF são facilmente medidos com espirometria no consultório. Os valores normais de referência são determinados por idade, sexo e altura do paciente. Recomenda-se que o fator raça não seja utilizado para calcular os valores de referência previstos (2). Pode-se classificar a gravidade da limitação das vias respiratórias em pacientes com doença pulmonar obstrutiva crônica e VEF1/CVF < 0,70 com base no VEF1 pós-broncodilatador (3):

  • Leve: ≥ 80% do previsto

  • Moderada: 50% a 79% do previsto

  • Grave: 30% a 49% do previsto

  • Muito grave: < 30% do previsto

Testes adicionais da função pulmonar só são necessários em circunstâncias específicas, como antes de procedimentos de redução do volume pulmonar. Outras anormalidades nos testes podem incluir

  • Aumento total da capacidade pulmonar

  • Aumento da capacidade residual funcional

  • Aumento do volume residual

  • Diminuição da capacidade vital

  • Diminuição da capacidade de difusão de monóxido de carbono em respiração única (DLCO)

Achados de aumento da capacidade pulmonar total, capacidade residual funcional e volume residual podem ajudar a diferenciar doença pulmonar obstrutiva crônica de pneumopatia restritiva, em que essas medições estão reduzidas.

A diminuição de DLCO é inespecífica, estando reduzida em outras enfermidades que comprometem o leito vascular pulmonar, como acontece na pneumopatia intersticial, mas pode ajudar a distinguir a DPOC da asma, em que a DLCO está normal ou elevada.

Exames de imagem

Radiografia do tórax pode revelar achados característicos. Nos pacientes com enfisema, as alterações podem incluir hiperinsuflação pulmonar manifestada pela retificação do diafragma (aumento do ângulo formado pelo esterno e diafragma anterior do valor normal de 45° para > 90°, na incidência lateral), rápida atenuação dos vasos hilares e bolhas (isto é, radiolucências > 1 cm circundadas por sombras lineares delgadas e arqueadas). Outros achados típicos incluem aumento do espaço aéreo retroesternal e uma sombra cardíaca estreita. Alterações enfisematosas localizadas predominantemente nas bases pulmonares indicam deficiência de alfa-1 antitripsina. Os pulmões podem ter aspecto normal ou revelar aumento da transparência secundária à perda de parênquima. A radiografia de tórax de pacientes com bronquite obstrutiva crônica pode ser normal ou demonstrar acentuação da trama broncovascular em ambas as bases, decorrente do espessamento da parede brônquica.

A proeminência dos hilos pode sugerir o aumento das artérias pulmonares centrais, observado na vigência de hipertensão pulmonar. A dilatação do ventrículo direito evidenciada no cor pulmonale pode ser mascarada pela hiperinsuflação pulmonar ou se manifestar por meio da invasão do espaço retroesternal pela imagem cardíaca ou por meio do alargamento da imagem cardíaca transversa, em comparação com radiografias de tórax pregressas.

TC do tórax pode revelar anormalidades que não são aparentes na radiografia de tórax, sugestivas de doenças coexistentes ou complicações, como pneumonia, pneumoconiose ou câncer pulmonar. A TC ajuda a avaliar a extensão e a distribuição do enfisema, estimadas por quantificação visual ou por análise da distribuição da densidade pulmonar. Indicações para a realização de TC em pacientes com doença pulmonar obstrutiva crônica são avaliação para cirurgia de redução do volume pulmonar, suspeita de doenças coexistentes ou complicadoras que não são claramente evidentes ou não foram detectadas pela radiografia de tórax, suspeita de câncer de pulmão e rstreamento de câncer de pulmão. O aumento do diâmetro da artéria pulmonar acima do diâmetro da aorta ascendente sugere hipertensão pulmonar (4).

Exames adjuntivos

Devem-se avaliar os níveis de alfa1-antitripsina em pacientes com < 50 anos e doença pulmonar obstrutiva crônica sintomática, bem como em não fumantes de qualquer idade com doença pulmonar obstrutiva crônica para detectar a deficiência de alfa-1 antitripsina. Outras indicações de possível deficiência de alfa-1 antitripsina incluem história familiar de doença pulmonar obstrutiva crônica precoce ou doença hepática inexplicável, distribuição do enfisema no lobo inferior e doença pulmonar obstrutiva crônica associada à vasculite positiva para anticorpo citoplasmático antineutrófilo (ANCA). Se os níveis de alfa-1 antitripsina forem baixos, o diagnóstico deverá ser confirmado por exame genético para estabelecer o fenótipo da alfa-1 antitripsina.

ECG, muitas vezes realizado para excluir causas cardíacas de dispneia, caracteristicamente revela a diminuição difusa da voltagem de QRS, com eixo cardíaco vertical decorrente da hiperinsuflação pulmonar, e o aumento da voltagem da onda P ou o desvio para a direita do vetor da onda P, em razão da sobrecarga atrial direita, em pacientes com enfisema avançado. Os achados de sobrecarga ventricular direita envolvem a onda R ou R’, com amplitude maior ou igual à onda S na derivação V1; a onda R menor que a onda S na derivação V6; o desvio do eixo para a direita > 110° sem bloqueio de ramo direito; ou alguma combinação desses achados. A taquicardia atrial multifocal, arritmia que pode acompanhar a DPOC, manifesta-se por taquiarritmia com ondas P polimórficas e intervalos PR variáveis.

Ocasionalmente, a ecocardiografia é útil para a avaliação da função ventricular direita e da hipertensão pulmonar, embora seja tecnicamente difícil em pacientes com DPOC. Com frequência, está indicada quando há presunção da coexistência de doença ventricular esquerda ou valvopatia.

A hemoglobina e o hematócrito tem baixo valor diagnóstico na avaliação da DPOC, mas pode revelar eritrocitemia (hematócrito > 48%) como um reflexo da hipoxemia crônica. Pacientes com anemia (por outros moti-vos que DPOC) têm dispneia desproporcionalmente grave. A contagem diferencial de leucócitos pode ser útil. Um crescente corpo de evidências indica que a eosinofilia prediz responsividade a corticoides inaláveis.

Os eletrólitos séricos são de pouco valor, mas podem mostrar um nível elevado de bicarbonato se os pacientes tiverem hipercapnia crônica. Gasometria venosa é útil para o diagnóstico da hipercapnia aguda ou crônica.

Avaliação das exacerbações

Os pacientes com agudizações geralmente têm combinações de tosse intensa, escarro, dispneia, aumento do trabalho respiratório, bem como baixa saturação de oxigênio determinada pela oximetria de pulso, sudorese, taquicardia, ansiedade e cianose. Pacientes com exacerbações acompanhadas por retenção de dióxido de carbono podem estar letárgicos ou sonolentos, uma aparência muito diferente.

Todos os pacientes que exigem hospitalização por causa de agudização devem ser testados para quantificar a hipoxemia e a hipercapnia. A hipercapnia pode existir sem a hipoxemia.

Achados da pressão parcial de oxigênio arterial (PaO2) < 50 mmHg, ou pressão parcial de dióxido de carbono no sangue arterial (PaCO2) > 50 mmHg, ou pressão parcial de dióxido de carbono no sangue venoso (PvCO2) > 55 mmHg em pacientes com acidemia respiratória (pH < 7,35) definem insuficiência respiratória aguda. Alguns pacientes manifestam cronicamente esses níveis de PaO2 e PaCO2 na ausência de insuficiência respiratória aguda.

Frequentemente, obtém-se radiografia de tórax para verificar a existência de pneumonia ou pneumotórax. A ultrassonografia no local de atendimento (POCUS) pode ser uma ferramenta auxiliar valiosa para o diagnóstico rápido de pneumonia ou pneumotórax. Em pacientes com início agudo dos sintomas, realiza-se angiografia por TC de tórax para verificar embolia pulmonar. Muito raramente, em pacientes que estão em corticoterapia sistêmica crônica, infiltrados podem representar pneumonia por Aspergillus.

A expectoração amarelada ou esverdeada é um indicador seguro de neutrófilos no escarro, sugerindo colonização bacteriana ou infecção.

A cultura é geralmente feita em pacientes hospitalizados, mas normalmente não é necessária em pacientes ambulatoriais. Em amostras de pacientes ambulatoriais, a coloração com Gram revela neutrófilos misturados com organismos, frequentemente diplococos Gram-positivos (Streptococcus pneumoniae) e/ou bacilos Gram-negativos (H. influenzae). Contudo, cultura e exame microscópico do escarro geralmente não são necessários para pacientes ambulatoriais. Outros microrganismos comensais orofaríngeos, como Moraxella catarrhalis (anteriormente conhecido como Branhamella catarrhalis), ocasionalmente causam exacerbações. Em pacientes hospitalizados, organismos Gram-negativos resistentes (p. ex., Pseudomonas) ou, raramente, Staphylococcus pode ser identificado em amostras de cultura.

Durante a temporada de influenza, um teste rápido para influenza orientará o tratamento com agentes anti-influenza, e um painel viral respiratório para o vírus sincicial respiratório (VSR), rinovírus e metapneumovírus pode permitir a adaptação da terapia antimicrobiana. Testes para covid-19 e a consideração das terapias específicas para covid-19 também é indicada.

Os níveis séricos de proteína C reativa (PCR) são úteis para orientar o uso de antibióticos durante as exacerbações. Em ensaios clínicos, o uso de antibióticos pode ser diminuído em pacientes com CRP baixa sem evidências de danos (5, 6).

Referências sobre diagnóstico

  1. 1. Lange P, Celli B, Agusti A, et al: Lung-function trajectories leading to chronic obstructive pulmonary disease. N Engl J Med 373(2):111–122, 2015.

  2. 2. Bhakta NR, Bime C, Kaminsky DA, et al: Race and ethnicity in pulmonary function test interpretation: An Official American Thoracic Society Statement. Am J Respir Crit Care Med 207(8):978–995, 2023. doi:10.1164/rccm.202302-0310ST

  3. 3. Global Initiative for Chronic Obstructive Lung Disease (GOLD): Diagnosis and assessment. Global Strategy for the Prevention, Diagnosis, and Management of COPD: 2024 report.

  4. 4. Iyer AS, Wells JM, Vishin S, et al: CT scan-measured pulmonary artery to aorta ratio and echocardiography for detecting pulmonary hypertension in severe COPD. Chest 145(4):824–832, 2014.

  5. 5. Butler CC, Gillespie D, White P, et al: C-Reactive protein testing to guide antibiotic prescribing for COPD exacerbations. N Engl J Med 381(2):111–120, 2019. doi: 10.1056/NEJMoa1803185

  6. 6. Prins HJ, Duijkers R, van der Valk P, et al: CRP-guided antibiotic treatment in acute exacerbations of COPD in hospital admissions. Eur Respir J 53(5):1802014, 2019. doi: 10.1183/13993003.02014-2018

Tratamento da DPOC

(Ver também Tratamento da DOPC estável e Tratamento da exarcebação aguda da DOPC.)

  • Cessação do tabagismo

  • Broncodilatadores inalatórios, corticoides, ou ambos

  • Tratamento de suporte (p. ex. suplementação de oxigênio, reabilitação pulmonar)

O tratamento da doença pulmonar obstrutiva crônica engloba o tratamento da doença crônica estável e prevenção e tratamento de exacerbações. Tratamento do cor pulmonale, uma complicação comum da DPOC grave e de longa duração, é discutido em outro capítulo.

Parar de fumar é fundamental no tratamento da DPOC.

O tratamento da DPOC estável visa prevenir as exacerbações e melhorar as funções pulmonar e física. O tratamento alivia os sintomas rapidamente com medicamentos beta-adrenérgicos de ação rápida e diminui as exacerbações com corticoides inalatórios, medicamentos beta-adrenérgicos de ação prolongada, anticolinérgicos de ação prolongada ou uma combinação (ver tabela Farmacoterapia da DPOC).

A reabilitação pulmonar prevê o treinamento com exercícios estruturados e supervisionados, orientação nutricional e instruções sobre como se cuidar.

Indica-se oxigenioterapia para pacientes selecionados.

O tratamento das exacerbações assegura oxigenação adequada e pH sanguíneo próximo do normal, reverte a obstrução das vias respiratórias e trata qualquer causa.

Imunização contra influenza, pneumococo, covid-19, e vírus sincicial respiratório (VSR - em pacientes com 60 anos ou mais) também deve ser recomendada como medida preventiva.

Tratamento no final da vida

Em pacientes com doença muito grave, não se justificam exercícios e se organizam as atividades da vida diária de modo a minimizar o gasto energético. Por exemplo, os pacientes podem configurar a casa de modo a utilizar apenas um andar desta, realizar várias pequenas refeições em vez de grandes refeições menos frequentes e evitar o uso de sapatos que precisem ser amarrados. O tratamento no final da vida deve ser discutido, incluindo a possibilidade de prosseguir com a ventilação mecânica, o uso da sedação paliativa e a nomeação de um representante para a tomada de decisões de saúde em caso de incapacitação do paciente.

Prognóstico da DPOC (DPOC)

A gravidade da obstrução das vias respiratórias prediz a sobrevida dos pacientes com DPOC. Para um VEF1 de 35 a 55% do predito, a mortalidade em 5 anos é de 40% (1). Para VEF1 inferior a 35% do predito, a mortalidade em 5 anos é de 55% (1).

É possível obter uma previsão mais precisa do risco de morte medindo simultaneamente o índice de massa corporal (B), o grau de obstrução das vias respiratórias (O, que é o VEF1), dispneia [D, que é medida utilizando questionário do British Medical Research Council modificado (mMRC)] e a capacidade de exercício (E, que é medida pelo teste de caminhada de 6 minutos); isso forma o índice BODE. Além disso, idade avançada e a presença de cardiopatia, anemia, taquicardia, hipercapnia ou hipoxemia em repouso são preditores de menor sobrevida, enquanto uma resposta significativa a broncodilatadores indica maior sobrevida. Os fatores de risco de a morte, em pacientes com agudização que requer hospitalização, compreendem idade mais avançada, PaCO2mais elevada e utilização de manutenção com corticoides orais.

Pacientes com alto risco de morte iminente são aqueles com perda ponderal progressiva inexplicável ou declínio funcional grave (p. ex. aqueles que experimentam dispneia nas atividades de vida diária — ao vestir-se, tomar banho, ou comer).

A mortalidade na DPOC pode resultar de comorbidades (p. ex., doença cardiovascular, câncer) ou doenças intercorrentes, em vez de progressão da doença subjacente em pacientes que pararam de fumar. Em geral, a morte é causada por insuficiência respiratória aguda, pneumonia, câncer pulmonar, cardiopatia, ou embolia pulmonar.

Referência sobre prognóstico

  1. 1. Almagro P, Martinez-Camblor P, Soriano JB, et al: Finding the best thresholds of FEV1 and dyspnea to predict 5-year survival in COPD patients: the COCOMICS study. PLoS One 9(2):e89866, 2014. doi: 10.1371/journal.pone.0089866

Pontos-chave

  • Tabagismo em pessoas suscetíveis é a principal causa da DPOC (doença pulmonar obstrutiva crônica) nos países desenvolvidos.

  • Diagnosticar a doença pulmonar obstrutiva crônica e diferenciá-la de distúrbios que têm características semelhantes (p. ex., asma brônquica, insuficiência cardíaca), principalmente por informações clínicas de rotina, como sintomas (principalmente período de tempo), idade de início, fatores de risco e resultados de testes de rotina (p. ex., radiografias de tórax, testes de função pulmonar).

  • A redução do VEF1, CVF e a relação VEF1/CVF pós-broncodilatador são achados característicos.

  • Categorizar os pacientes com base nos sintomas e risco de exacerbação em um dos 3 grupos e utilizar essa categoria para orientar o tratamento.

  • Aliviar os sintomas de maneira rápida, principalmente com medicamentos beta-adrenérgicos de ação rápida e diminuir as exacerbações com corticoides inalatórios, medicamentos beta-adrenérgicos de ação prolongada, anticolinérgicos de ação prolongada, ou uma combinação.

  • Incentivar a cessação do tabagismo utilizando múltiplas intervenções.

  • A imunização contra influenza, pneumococo, covid-19 e vírus sincicial respiratório ([VSR] em pacientes com idade 60 anos) também deve ser feita como medida preventiva.

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