Neutropenia

(Agranulocitose; granulocitopenia)

PorDavid C. Dale, MD, University of Washington
Revisado/Corrigido: abr. 2023
Visão Educação para o paciente

A neutropenia consiste na redução da contagem de neutrófilos no sangue. Se for grave, há aumento no risco e na gravidade de infecções causadas por bactérias e fungos. Os sintomas focais da infecção podem ser silenciosos, mas a febre surge durante as infecções mais sérias. O diagnóstico é feito pela contagem com diferencial de leucócitos, mas a avaliação requer a identificação da causa. Se houver febre, presume-se infecção e tratamento empírico imediato com antibióticos de largo espectro é necessário, sobretudo se a neutropenia for grave. O tratamento com o fator estimulador de colônias de granulócitos é utilizado para estimular a produção de neutrófilos e prevenir infecções bacterianas após quimioterapia para câncer e na neutropenia crônica grave.

Os neutrófilos (granulócitos) são as principais defesas do corpo contra as infecções bacterianas e as infecções fúngicas. Quando a neutropenia se apresenta, a resposta inflamatória a essas infecções é enfraquecida.

O limite inferior normal de referência para os neutrófilos (leucometria total × percentual de neutrófilos e bastões) é de 1500/mcL (1,5 × 109/L) nos brancos e ainda mais baixo nos negros (cerca de 1.200/mcL [1,2 × 109/L). As contagens de neutrófilos não são tão estáveis quanto as contagens de outras células e podem variar consideravelmente em curtos períodos, dependendo de muitos fatores como estado de atividade, ansiedade, infecção e medicamentos prescritos. Portanto, várias dosagens podem ser necessárias para determinar a gravidade da neutropenia.

A gravidade da neutropenia está relacionada com o risco relativo de infecção, sendo classificada como:

  • Leve: 1.000 a 1.500/mcL (1 a 1,5 × 109/L)

  • Moderada: 500 a 1.000/mcL (0,5 a 1 × 109/L)

  • Grave: < 500/mcL (< 0,5 × 109/L)

Quando a contagem de neutrófilos cai para < 500/mcL, a flora microbiana endógena (p. ex., na boca ou nos intestinos) pode causar infecções. Se a contagem cair para < 200/mcL (< 0,2 × 109/L), a resposta inflamatória pode ser atenuada e pode não haver achados inflamatórios habituais de leucocitose ou leucócitos na urina ou no sítio da infecção. A neutropenia aguda grave, em especial se houver outro fator (p. ex., câncer), prejudica significativamente o sistema imunitário e pode propiciar infecções rapidamente fatais. A integridade da pele e das mucosas, o suprimento vascular para o tecido e o estado nutricional do paciente também influenciam o risco de infecções.

As infecções que ocorrem com mais frequência em pacientes com neutropenia profunda são

Os catéteres vasculares e outros locais de injeção conferem risco extra de infecções cutâneas; as causas bacterianas mais comuns são estafilococos coagulase-negativos e Staphylococcus aureus, mas outras infecções Gram-positivas e Gram-negativas também ocorrem. Estomatite, gengivite, inflamação perirretal, colite, paroníquia e otite média frequentemente ocorrem. Pacientes com neutropenia prolongada após transplante de células-tronco hematopoiéticas ou quimioterapia e aqueles que recebem antibióticos de amplo espectro e doses altas de corticoides estão predispostos a infecções fúngicas.

Etiologia da neutropenia

A neutropenia aguda (que ocorre em horas ou dias) pode ser resultante de

  • Uso ou destruição rápida dos neutrófilos

  • Comprometimento da produção de neutrófilos

A neutropenia crônica (que dura meses a anos) normalmente resulta de

  • Diminuição da produção

  • Sequestro esplênico maciço

Também pode-se classificar a neutropenia como

  • Primária decorrente de defeito intrínseco nas células mieloides da medula

  • Secundária decorrente de fatores extrínsecos às células mieloides da medula

Ver também tabela Classificação das neutropenias.

Tabela
Tabela

Neutropenia causada por distúrbios intrínsecos nas células mieloides ou em suas precursoras

A neutropenia causada por defeitos intrínsecos nas células mieloides ou seus precursores é incomum (1, 2). Quando presente, as causas mais comuns são

  • Neutropenia idiopática crônica

  • Neutropenia congênita

A neutropenia crônica idiopática é um tipo de neutropenia crônica em que o restante do sistema imune parece permanecer intacto. Mesmo quando a contagem de neutrófilos é < 200/mcL (< 0,2 × 109/L), infecções graves são infrequentes, provavelmente porque os neutrófilos são produzidos em quantidades adequadas em resposta à infecção. É mais comum em mulheres.

A neutropenia congênita grave (NCG) é um grupo heterogêneo de doenças raras caracterizadas pela interrupção da maturação mieloide no estágio pró-mielocítico na medula óssea, resultando em uma contagem absoluta de neutrófilos < 200 células/mcL (< 0,2 × 109/L) e infecções significativas na pequena infância. A neutropenia congênita grave geralmente é herdada de forma autossômica dominante, mas pode ser recessiva, ligada ao X ou esporádica.

Identificaram-se várias alterações genéticas que causam a neutropenia congênita grave, como as mutações que comprometem a elastase dos neutrófilos (ELANE), CLPB, HAX1, GFI1 e muito raramente o receptor de G-CSF (fator estimulador de colônias de granulócitos) (CSF3R). Quase todos os pacientes com neutropenia congênita grave responderão ao tratamento com G-CSF, mas pode ser necessário transplante de células-tronco hematopoiéticas para pacientes que respondem mal ao G-CSF e para aqueles que desenvolvem mielodisplasia ou leucemia mieloide aguda.

A neutropenia cíclica é uma doença granulocitopoiética congênita rara, geralmente transmitida de maneira autossômica dominante que costuma ser causada por uma mutação no gene da elastase de neutrófilos (ELANE), que resulta em apoptose anômala. É caracterizado por oscilações regulares, periódicas no número de neutrófilos periféricos. O período oscilatório médio é de 21 ± 3 dias. A ciclagem de outras células do sangue também é evidente na maioria dos casos.

A neutropenia étnica benigna ocorre em membros de alguns grupos étnicos (p. ex., algumas pessoas de ascendência africana, do Oriente Médio e semita). Os pacientes normalmente têm contagens mais baixas de neutrófilos, mas não apresentam maior risco de infecção. Em alguns casos, esse achado foi vinculado ao antígeno eritrocitário de Duffy; alguns especialistas acham que a neutropenia nessas populações está relacionada com a proteção contra a malária.

A neutropenia também pode resultar da insuficiência da medula óssea decorrente de síndromes congênitas raras [p. ex., síndrome de hipoplasia cartilaginosa e pilosa, síndrome de Chédiak-Higashi, disceratose congênita, doença do armazenamento de glicogênio tipo IB, síndrome de Shwachman-Diamond e síndrome WHIM (verrugas, hipogamaglobulinemia, infecções, mielocatexia)].

A neutropenia também é uma característica da mielodisplasia que pode ser acompanhada de traços megaloblastoides na medula óssea e anemia aplásica. Pode ocorrer neutropenia na disgamaglobulinemia e na hemoglobinuria paroxística noturna.

Neutropenia secundária

Pode resultar do uso de certos fármacos, infiltração ou substituição da medula óssea, de certas infecções ou de reações imunes.

As causas mais comuns incluem

  • Fármacos

  • Infecções e reações imunitárias

  • Processos de infiltração da medula óssea

A neutropenia fármaco-induzida é uma das causas mais frequentes de neutropenia. Os fármacos podem diminuir a produção de neutrófilos por meio de mecanismos tóxicos, idiossincráticos ou de hipersensibilidade; ou podem aumentar a destruição dos neutrófilos periféricos por meio de mecanismos imunitários. Apenas o mecanismo tóxico causa neutropenia relacionada com a dose.

A neutropenia grave relacionada à dose ocorre de forma previsível após a administração de fármacos citotóxicos para o câncer, fenotiazina ou radioterapia devido à supressão da produção de medula óssea.

As reações idiossincráticas são imprevisíveis e acontecem com grande variedade de fármacos, incluindo preparações ou extratos de remédios alternativos e toxinas.

As reações de hipersensibilidade são raras e, ocasionalmente, envolvem anticonvulsivantes (p. ex., fenitoína, fenobarbital), metimazol ou propiltiouracil. Essas reações podem durar apenas alguns dias ou meses ou anos. Muitas vezes, hepatite, nefrite, pneumonite ou anemia aplásica acompanha neutropenia com hipersensibilidade induzida.

A neutropenia imunomediada induzida por fármacos, considerada como decorrente dos fármacos que agem como um hapteno para estimular a formação do anticorpo, normalmente persiste por cerca de uma semana após suspensão do fármaco. Pode resultar do uso de aminopirina, clozapina, propiltiouracila e outros fármacos antitireoideos, penicilina ou outros antibióticos.

A neutropenia por produção ineficaz da medula óssea pode ocorrer nas anemias megaloblásticas causadas por deficiência de vitamina B12 ou deficiência de ácido fólico. Em geral, anemia macrocítica e, algumas vezes, trombocitopenia leve desenvolvem-se simultaneamente. A ineficácia da produção também pode acompanhar as doenças mielodisplásicas e leucemia mieloide aguda.

O infiltrado na medula óssea por leucemia, mieloma, linfoma ou metástases de tumores sólidos (p. ex., câncer de mama e câncer de próstata) pode prejudicar a produção de neutrófilos. A mielofibrose induzida por tumor pode ainda exacerbar a neutropenia. A mielofibrose também pode ocorre por causa de infecção granulomatosa, doença de Gaucher ou radioterapia.

O hiperesplenismo advindo de qualquer causa pode provocar neutropenia moderada, trombose e anemia.

As infecções podem causar neutropenia prejudicando a produção de neutrófilos ou induzindo a destruição imunitária ou rápido renovação dos neutrófilos. A sepsia é causa particularmente séria. A neutropenia que sucede com doenças virais comuns na infância desenvolve-se durante o primeiro e o 2 dias da doença e pode persistir por 3 a 8 dias. A neutropenia transitória também pode resultar de redistribuição de neutrófilos do pool circulante para o pool marginal induzida por vírus ou endotoxemia. O álcool também pode contribuir para a neutropenia inibindo a resposta quimiotática dos neutrófilos da medula durante algumas infecções (p. ex., pneumonia pneumocócica).

Defeitos imunitários podem causar neutropenia. A neutropenia isoimune neonatal pode ocorrer na incompatibilidade do antígeno neutrofílico materno-fetal associada à transferência transplacentária de anticorpos IgG contra os neutrófilos do recém-nascido [mais comumente os antígenos neutrofílicos humanos (human neutrophil antigen, HNA-1)]. A neutropenia autoimune pode ocorrer em qualquer idade e em muitos casos de neutropenia crônica idiopática. Os testes para anticorpos antineutrófilos (imunofluorescência, aglutinação ou citometria de fluxo) nem sempre estão disponíveis ou são confiáveis.

As neutropenias autoimunes podem ser agudas, crônicas ou episódicas. Podem envolver anticorpos direcionados contra os neutrófilos circulantes ou contra as células precursoras dos neutrófilos. Também podem envolver citocinas (p. ex., interferon gama, fator de necrose tumoral) que podem causar apoptose de neutrófilos. A maioria dos pacientes com neutropenia autoimune tem doença autoimune subjacente ou doença linfoproliferativa [p. ex., linfócitos granulares grandes (síndrome LGL, uma doença clonal dos linfócitos granulares grandes), lúpus eritematoso sistêmico, síndrome de Felty]. A neutropenia secundária crônica acompanha, com frequência, a infecção pelo vírus da imunodeficiência humana (HIV human immunodeficiency virus) pela produção insuficiente de neutrófilos e destruição acelerada dos neutrófilos pelos anticorpos.

Referências sobre etiologia

  1. 1. Dale DC: How I diagnose and treat neutropenia. Curr Opin Hematol 23(1):1-4, 2016. doi: 10.1097/MOH.0000000000000208

  2. 2. Skokowa J, Dale DC, Touw IP, et al: Severe congenital neutropenias. Nat Rev Dis Primers 3:17032, 2017. doi: 10.1038/nrdp.2017.32

Sinais e sintomas da neutropenia

A neutropenia é assintomática até que a infecção se desenvolva. A febre é, com frequência, a única indicação de infecção. Se a neutropenia é grave, os sinais típicos de inflamação focal (eritema, edema, dor, infiltrados) podem ser silenciosos ou estar ausentes. Os sintomas focais (p. ex., úlceras orais) podem se desenvolver, mas geralmente são sutis. Os pacientes com neutropenia farmacológica por hipersensibilidade podem ter febre, exantema e linfadenopatia decorrentes da reação de hipersensibilidade.

Algumas pessoas com neutropenia idiopática crônica e contagens de neutrófilos < 200/mcL (< 0,2 × 109/L) não passam por infecções sérias. Os pacientes com neutropenia cíclica ou neutropenia congênita grave tendem a ter úlceras orais, estomatite ou faringite e aumento dos linfonodos durante os episódios de neutropenia grave. Pneumonias e sepse podem ocorrer com frequência.

Diagnóstico da neutropenia

  • Suspeita clínica (infecções repetidas ou incomuns)

  • Confirmação por hemograma completo com diferencial

  • Avaliação de infecção por meio de exames de cultura e exames de imagem

  • Identificação do mecanismo e causa da neutropenia

Suspeita-se da neutropenia em pacientes com infecções frequentes, graves ou incomuns ou em pacientes sob risco (p. ex., aqueles que recebem citotóxicos ou terapia por irradiação). A confirmação é por hemograma com diferencial.

Avaliação de infecção

É prioridade determinar se há infecção. Como a infecção pode ser sutil, o exame físico avalia sistematicamente os locais primários mais comuns de infecção:

  • Superfícies mucosas, como trato alimentar (gengiva, faringe, ânus)

  • Seios

  • Pulmões

  • Abdome

  • Trato urinário

  • Pele e unhas

  • Locais de punção

  • Cateteres vasculares

Se a neutropenia for aguda ou grave, deve-se fazer rapidamente a avaliação laboratorial.

Os exames de cultura são a base da avaliação. Pelo menos 2 conjuntos de amostras para hemoculturas bacterianas e fúngicas são obtidos de todos os pacientes febris. Se houver um catéter intravenoso de demora, as amostras são obtidas do catéter e de veias periféricas separadas. Também realiza-se cultura do material de drenagem persistente ou crônica à procura de fungos e micobactérias atípicas. Nos casos de úlceras mucosas, fazer swab e cultura para o vírus do herpes e Candida. As lesões cutâneas são aspiradas ou biopsia é feita para citologia e cultura. Análise da urina, culturas da urina e radiografia do tórax são feitas em todos os pacientes. Se há diarreia, deve-se avaliar as fezes à procura de patógenos bacterianos enterais e toxinas Clostridioides (anteriormente Clostridium) difficile. Fazer cultura de escarro para avaliar as infecções pulmonares.

Os exames de imagem são úteis. A radiografia torácica é realizada em todos os pacientes. Uma TC de tórax também pode ser necessária em pacientes com neutropenia. TC dos seios paranasais pode ser útil, se houver sinais ou sintomas de sinusite (p. ex., cefaleia posicional, dor de dente da arcada superior ou maxilar, edema facial ou secreção nasal). TC do abdome é geralmente feita se sintomas (p. ex., dor) ou história (p. ex., cirurgia recente) sugerem infecção intra-abdominal.

Identificação da causa

Em seguida, o mecanismo e a causa da neutropenia são determinados. A história aborda a história familiar, presença de outras doenças, todos os medicamentos ou outras preparações sendo tomadas, animais de estimação e possível exposição a toxinas ou ingestão.

O exame físico determina se há esplenomegalia, linfadenopatia, lesões cutâneas (p. ex., áreas de eritema, máculas, pápulas, pústulas) e sinais de outras doenças subjacentes (p. ex., artrite).

Se nenhuma causa evidente for identificada (p. ex., quimioterapia), o teste mais importante é

  • Exame da medula óssea

O exame da medula óssea determina se a neutropenia decorre da diminuição da produção medular ou é secundária ao aumento da destruição celular (determinada pela produção normal ou aumentada das células mieloides). O exame da medula óssea também pode indicar a causa específica da neutropenia (p. ex., anemia aplásica, mielofibrose, doenças mielodisplásicas, leucemia aguda, câncer metastático, necrose medular).

Testes adicionais, como citometria de fluxo e rearranjo do gene do receptor de células T na síndrome LGL, podem ser necessários para determinar a causa da neutropenia, dependendo da suspeita diagnóstica. Nos pacientes com risco de deficiência nutricional, determinar os níveis de cobre, folato e vitamina B12. Faz-se um teste para a presença de anticorpos antineutrófilos se houver suspeita de neutropenia imunitária.

A diferenciação entre neutropenia ocasionada por certos antibióticos e infecção pode, algumas vezes, ser difícil. A contagem de leucócitos, anterior ao início do tratamento com antibiótico, normalmente reflete a mudança da contagem sanguínea com a infecção.

Realizam-se em pacientes com neutropenia crônica desde a infância, história de febres recorrentes e gengivite crônica são contagens de leucócitos com diferenciais 3 vezes/semana durante 6 semanas, de modo que a periodicidade sugestiva de neutropenia cíclica possa ser avaliada. As contagens de plaquetas e reticulócitos podem ser obtidas simultaneamente. Nos pacientes com neutropenia, eosinófilos, reticulócitos e plaquetas, o ciclo é sincrônico em relação aos neutrófilos, enquanto o ciclo de monócitos e linfócitos pode ser fora de fase.

Testes de genética molecular para ELANE e outros genes são apropriados ao considerar causas congênitas.

Tratamento da neutropenia

  • Tratamento de condições associadas (p. ex., infecções, estomatite)

  • Profilaxia com antibióticos, se necessário

  • Fatores do crescimento mieloide

  • Suspensão do agente idiológico suspeitado (p. ex., fármaco)

  • Algumas vezes, corticoides

Neutropenia aguda

As infecções suspeitadas são sempre tratadas imediatamente. Se houver febre ou hipotensão, assume-se que a infecção é séria e doses altas, empíricas, de antibióticos intravenosos de largo espectro são administradas. A seleção do regime de fármacos baseia-se nos microrganismos de infecção mais prováveis na suscetibilidade antimicrobiana dos patógenos na instituição específica e no potencial de toxicidade do regime de fármacos. Como há risco de crescimento de microrganismos resistentes, a vancomicina só é utilizada se houver suspeita de microrganismos Gram-positivos resistentes a outros agentes.

Quase sempre os catéteres vasculares de demora podem permanecer em uso, mesmo se houver bacteremia suspeita ou comprovada, mas deve-se considerar a remoção em caso de infecções por S. aureus, Bacillus, Corynebacterium ou Candida, ou outro fungo, ou se as hemoculturas forem persistentemente positivas apesar do uso de antibióticos apropriados. As infecções causadas por estafilococo coagulase-negativo geralmente se resolvem apenas com terapia antimicrobiana.

As sondas de Foley também podem predispor os pacientes neutropêncios à infecção e sua troca ou remoção deve ser considerada em caso de infecção urinária persistente.

Se as culturas forem positivas, a terapia com antibióticos é ajustada aos resultados dos testes de sensibilidade. Se o paciente diminuir a febre em 72 horas, os antibióticos são continuados por, pelo menos, 7 dias até o paciente não apresentar mais sintomas ou sinais de infecção. Quando a neutropenia é transitória (como a que ocorre depois de quimioterapia mielossupressora), a antibioticoterapia costuma ser mantida até que a contagem de neutrófilos seja > 500/mcL (> 0,5 × 109/L); entretanto, se a cultura permanecer negativa, pode-se considerar a suspensão da cobertura antimicrobiana para alguns pacientes com neutropenia persistente, sobretudo aqueles cujos sinais e sintomas de inflamação se resolveram, caso as culturas permaneçam negativas.

Febre que persiste > 72 horas apesar da terapia com antibióticos sugere

  • Causa não bacteriana

  • Infecção por organismos resistentes

  • Superinfecção por uma 2ª espécie bacteriana

  • Níveis séricos ou teciduais inadequados de antibióticos

  • Infecção localizada, como um abscesso

Os pacientes neutropênicos com febre persistente são reavaliados a cada 2 a 4 dias com exame físico, culturas e radiografias do tórax. Se o paciente estiver bem, exceto pela presença de febre, pode-se continuar o esquema antibiótico inicial, e deve-se considerar febre induzida por fármacos. Se o paciente estiver piorando, é considerada a alteração no regime antimicrobiano (1).

As infecções fúngicas são as causas mais prováveis de febre e piora persistentes. A terapia antifúngica é acrescentada empiricamente se febre inexplicada persistir após 3 a 4 dias da terapia com antibiótico de espectro amplo. A escolha do antifúngico específico (p. ex., fluconazol, caspofungina, voriconazol ou posaconazol) depende do tipo de risco (p. ex., duração e gravidade da neutropenia, história de infecção fúngica, febre persistente apesar do uso de antifúngico de espectro mais estreito) e deve ser orientada por um infectologista.

Se a febre persistir depois de 3 semanas de terapia empírica (incluindo 2 semanas de terapia antifúngica) e a neutropenia tiver desaparecido, então pode ser considerado suspender todos os antimicrobianos e a causa da febre reavaliada.

Para pacientes afebris com neutropenia, pode-se considerar antibioticoprofilaxia, embora as alterações no microbioma bacteriano possam desacelerar a recuperação da medula óssea. O tratamento com fluoroquinolonas (levofloxacino ou ciprofloxacino) é utilizada por alguns centros para os pacientes que recebem esquemas quimioterápicos que normalmente resultam em contagem de neutrófilos ≤ 100/mcL (≤ 0,1 × 109/L) por > 7 dias. A profilaxia costuma ser iniciada pelo oncologista responsável pelo tratamento. Os antibióticos são mantidos até a contagem de neutrófilos aumentar para > 1.500 células/mcL (> 1,5 × 109/L). Além disso, a terapia antifúngica pode ser administrada para pacientes afebris com neutropenia que têm maior risco de infecção fúngica (p. ex., após transplante de células-tronco hematopoiéticas ou quimioterapia intensiva para leucemia mieloide aguda) ou que têm doença mielodisplásica ou história de infecções fúngicas prévias. A escolha do antifúngico deve ser orientada por um infectologista. Não se recomenda a profilaxia antibiótica e antifúngica como rotina para pacientes com neutropenia afebril sem fatores de risco, e que espera-se com base no esquema quimioterápico que fiquem neutropênicos durante < 7 dias.

Fatores de crescimento mieloide [isto é, fator estimulador de colônias de granulócitos (G-CSF)] são amplamente utilizados para aumentar a contagem de neutrófilos e evitar infecções em pacientes após transplante de células-tronco hematopoiéticas ou quimioterapia intensiva para câncer. Se o risco de neutropenia febril for 30% (como na contagem < 500 mcL [< 0,5 × 109/L], presença de infecção em um ciclo prévio de quimioterapia, comorbidade associada, ou > 75 anos de idade), os fatores de crescimento são indicados (2). Em geral, a maioria dos benefícios clínicos ocorre quando o fator de crescimento é administrado no início, cerca de 24 horas após a quimioterapia. Os pacientes com neutropenia ocasionada por reação idiossincrática ao fármaco podem também se beneficiar dos G-CSF, especialmente se a recuperação tardia for antecipada. A dose habitual do G-CSF (filgrastim) é 5 mcg/kg por via subcutânea uma vez ao dia, e a dose do G-CSF peguilado (pegfilgrastim) é 6 mg por via subcutânea 1 vez por ciclo de quimioterapia.

Glicocorticoides, esteroides anabolizantes e vitaminas não estimulam a produção de neutrófilos e geralmente não são úteis para pacientes com neutropenia. Se houver suspeita de que a neutropenia aguda é causada por um fármaco ou uma toxina, todos os potenciais agentes etiológicos são interrompidos. Se a neutropenia se desenvolver durante o tratamento com um antibiótico conhecido por induzir baixas contagens (p. ex., cloranfenicol), mudar para antibiótico alternativo é recomendado.

Gargarejos com água oxigenada ou soro fisiológico a cada poucas horas, enxaguantes orais líquidos (contendo lidocaína viscosa, difenidramina e antiácido líquido), anestésicos em pastilhas (benzocaína 15 mg a cada 3 ou 4 horas) ou enxaguantes bucais de clorexidina (solução a 1%) 2 ou 3 vezes ao dia podem aliviar o desconforto da estomatite com úlceras orofaríngeas.

Candidíase oral ou esofagiana é tratada com enxaguante oral de nistatina (400.000 a 600.000 U 4 vezes ao dia, engolido se houver esofagite), pastilha de clotrimazol (10 mg, lentamente dissolvida na boca, 5 vezes ao dia) ou com fármacos antifúngicos sistêmicos (p. ex., fluconazol).

Dieta semissólida ou líquida pode ser necessária durante a estomatite aguda ou a esofagite, e analgésicos tópicos (p. ex., lidocaína viscosa) podem ser necessários para minimizar o desconforto.

Neutropenia crônica

A produção e liberação de neutrófilos na neutropenia congênita, neutropenia cíclica e neutropenia idiopática costuma aumentar com a administração de 1 a 10 mcg/kg por via subcutânea de G-CSF uma vez ao dia, começando com uma dose baixa e aumentando para manter um nível de cerca de 1.000/mcL (1 × 109/L) (3). A eficácia é mantida com G-CSF diariamente ou intermitentemente, por meses ou anos.

Também se utiliza G-CSF de longo prazo em outros pacientes com neutropenia crônica, incluindo aqueles com mielodisplasia, infecção por HIV e doenças autoimunes. Os benefícios clínicos do tratamento com G-CSF são menos claros, especialmente para pacientes que não têm neutropenia grave. Em pacientes com doenças autoimunes, como alguns pacientes com a síndrome LGL, ou aqueles submetidos a transplante de órgão, a ciclosporina também pode ser benéfica.

A esplenectomia tem sido utilizada para aumentar os níveis de neutrófilos de alguns pacientes com esplenomegalia e sequestro esplênico de neutrófilos (p. ex., síndrome de Felty); mas, como os fatores de crescimento e outros tratamentos mais recentes costumam ser eficazes, deve-se evitar a esplenectomia na maioria dos pacientes. Convém considerar a esplenectomia para os pacientes com esplenomegalia dolorosa ou neutropenia grave (isto é, < 500/mcL [< 0,5 × 109/L]) e problemas graves com infecções e pacientes para os quais outros tratamentos falharam. Os pacientes devem ser vacinados contra as infecções provocadas por Streptococcus pneumoniae, Neisseria meningitidis e Haemophilus influenzae antes da esplenectomia, pois a ausência do baço predispõe os pacientes à infecção por microrganismos encapsulados.

Referências sobre o tratamento

  1. 1. Pizzo PA: Management of patients with fever and neutropenia through the arc of time: A narrative review. Ann Intern Med 170(6):389-397, 2019. doi: 10.7326/M18-3192

  2. 2. Becker PS, Griffiths EA, Alwan LM, et al: NCCN guidelines insights: Hematopoietic growth factors, version 1.2020. J Natl Compr Canc Netw 18(1):12-22, 2020. doi: 10.6004/jnccn.2020.0002

  3. 3. Dale DC, Bolyard AA, Shannon JA, et al: Outcomes for patients with severe chronic neutropenia treated with granulocyte colony-stimulating factor. Blood Adv 6(13):3861-3869, 2022. doi: 10.1182/bloodadvances.2021005684

Pontos-chave

  • A neutropenia predispõe a infecções bacterianas e fúngicas.

  • O risco de infecção é proporcional à gravidade da neutropenia; pacientes com contagens de neutrófilos < 500/mcL (< 0,5 × 109/L) têm maior risco.

  • Como a resposta inflamatória é limitada, os achados clínicos podem estar ausentes, embora geralmente haja febre.

  • Os pacientes neutropênicos febris são tratados empiricamente com antibióticos de amplo espectro enquanto aguardam a identificação definitiva do agente etiológico.

  • Pode-se indicar profilaxia antibiótica para pacientes de alto risco como uma estratégia de curto prazo.

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