Anemias megaloblásticas resultam, na maioria das vezes, de deficiências de vitamina B12 e folato. A hematopoese ineficaz afeta todas as linhagens de células, mas, em particular, os eritrócitos. O diagnóstico geralmente baseia-se em hemograma completo e esfregaço periférico, que normalmente mostram anemia macrocítica com anisocitose e poiquilocitose, grandes eritrócitos ovais (macro-ovalócitos), corpos de Howell-Jolly (fragmentos residuais do núcleo), neutrófilos hipersegmentados e reticulocitopenia. O tratamento é direcionado à doença subjacente.
(Ver também Visão geral da diminuição da eritropoiese.)
Com permissão do editor. From Tefferi A, Li C. In Atlas of Clinical Hematology. Edited by JO Armitage. Philadelphia, Current Medicine, 2004.
Megaloblastos são grandes precursores nucleados de eritrócitos com cromatina não condensada decorrente de síntese prejudicada de DNA. Macrócitos são eritrócitos aumentados (isto é, volume corpuscular médio > 100 fL). Eritrócitos macrocíticos ocorrem em uma variedade de circunstâncias clínicas, muitas sem relação com a maturação megaloblástica.
Macrocitose não megaloblástica
Anemias macrocíticas (isto é, VCM > 100 fL) decorrentes de deficiência de vitamina B12 ou deficiência de folato são megaloblásticas. A macrocitose não megaloblástica ocorre em vários estados clínicos e nem todos têm explicação. A anemia pode ocorrer em pacientes com macrocitose devido a mecanismos independentes da macrocitose.
A macrocitose por excesso de membranas de eritrócitos ocorre em pacientes com doença hepática crônica, nos quais a esterificação do colesterol é defeituosa. A macrocitose com MCV de cerca de 100 a 105 fL pode se dar pelo uso crônico de álcool na ausência da deficiência de ácido fólico. A macrocitose leve pode acontecer em anemia aplásica, em especial se houver recuperação. A macrocitose também é comum em mielodisplasia. Como a moldagem da membrana dos eritrócitos ocorre no baço após a liberação da célula da medula, os eritrócitos podem estar levemente macrocíticos após esplenectomia, embora essas mudanças não sejam associadas à anemia. A reticulocitose (p. ex., na anemia hemolítica) pode causar macrocitose.
Suspeita-se de macrocitose não megaloblástica nos pacientes com anemias macrocíticas, cujosexames excluem deficiência de vitamina B12 o deficiência de folato. Os eritrócitos ovais grandes (macro-ovalócitos) no esfregaço periférico e o aumento da distribuição de eritrócitos, típicos da anemia megaloblástica clássica, podem estar ausentes. Se a macrocitose não megaloblástica for clinicamente inexplicável (p. ex., pela presença de doença hepática crônica ou consumo de álcool) ou se houver suspeita de mielodisplasia, pode-se fazer exame da medula óssea e análise citogenética. Na macrocitose não megaloblástica, a medula não é megaloblástica, mas em mielodisplasia e doença hepática avançada existem precursores de eritrócitos megaloblásticos com cromatina nuclear densa que diferem do padrão usual de partículas fibrilares finas em anemias megaloblásticas.
Etiologia das anemias macrocíticas megaloblásticas
As causas mais comuns dos quadros megaloblásticos são
Deficiência de vitamina B12
A causa mais comum de deficiência de B12 é a anemia perniciosa decorrente do comprometimento da secreção de fator intrínseco (geralmente secundária aos autoanticorpos—ver Gastrite atrófica metaplásica autoimune). A anemia perniciosa pode se desenvolver mesmo na ausência de idade avançada. Outras causas comuns são má absorção decorrente de gastrite, derivação gástrica, doença de Crohn ou teníase. A deficiência alimentar é rara, mas pode ocorrer em pacientes veganos.
A deficiência de folato é extremamente rara em países em que os cereais e grãos são enriquecidos com ácido fólico. Entretanto, a deficiência de folato pode ocorrer em pacientes com dietas restritivas, consumo abusivo crônico de álcool ou anorexia. Doenças de má absorção como doença celíaca, espru tropical e síndrome do intestino curto são outras causas prováveis. Quando a necessidade de folato aumenta, inclusive durante a gestação e em pacientes com hemólise crônica (isto é, hemoglobinopatias), pode ocorrer deficiência de folato.
Outras causas de megaloblastose são os medicamentos que interferem na síntese de DNA (em geral antineoplásicos, como a hidroxiureia, ou imunossupressores) e os distúrbios metabólicos raros (p. ex., acidúria orótica hereditária). Deficiência de cobre pode causar alterações megaloblásticas em alguns casos e pode se manifestar como anemia macrocítica, normocítica ou mesmo microcítica.
Fisiopatologia das anemias macrocíticas megaloblásticas
Com permissão do editor. From Tefferi A, Li C. In Atlas of Clinical Hematology. Edited by JO Armitage. Philadelphia, Current Medicine, 2004.
Os estados megaloblásticos resultam da síntese defeituosa de DNA. A síntese de RNA continua, resultando em uma célula maior com núcleo maior. Todas as linhagens celulares têm dispoese, em que a maturidade citoplasmática é maior do que a maturidade nuclear; isso produz megaloblastos na medula antes que apareçam no sangue periférico. A dispoiese resulta na morte celular no interior da medula, tornando a eritropoiese ineficaz. Como a dispoiese atinge todas as linhagens celulares, ocorre reticulocitopenia e, na fase tardia, leucopenia e trombocitopenia. Macro-ovalócitos entram na circulação. A hipersegmentação dos neutrófilos polimorfonucleares é comum. Corpos de Howell-Jolly (fragmentos residuais do núcleo) geralmente estão presentes. Se há presença simultânea de deficiência de ferro ou utilização prejudicada de ferro, a macrocitose pode não se desenvolver.
Sinais e sintomas de anemias macrocíticas megaloblásticas
A anemia é insidiosa e pode não produzir sintomas até se tornar grave. As manifestações gastrointestinais são comuns, como diarreia, glossite e anorexia. As manifestações neurológicas, como neuropatia periférica e instabilidade da marcha, são exclusivas da deficiência de vitamina B12 e podem ser permanentes se prolongadas. Parestesias podem ser uma manifestação da deficiência de vitamina B12, mesmo antes da (ou na ausência de) anemia.
Diagnóstico das anemias macrocíticas megaloblásticas
Hemograma completo, índices de eritrócitos, contagem de reticulócitos e esfregaço periférico
Níveis de B12 e folato
Suspeita-se de anemia megaloblástica em pacientes anêmicos com índices macrocíticos. Também deve-se considerá-la em pacientes com fatores de risco com parestesias inexplicáveis e/ou uma alta amplitude de distribuição de eritrócitos (RDW, da sigla em inglês RBC distribution width). O diagnóstico normalmente baseia-se no esfregaço sanguíneo periférico. Quando franca, a anemia é macrocítica com MCV > 100 fL na ausência de deficiência de ferro, traços de talassemia ou doença renal. O esfregaço mostra macro-ovalocitose, anisocitose (variação no tamanho dos eritrócitos) e poiquilocitose (variação na forma dos eritrócitos).
A RDW é alta. Corpos de Howell-Jolly são comuns. Há reticulocitopenia. A hipersegmentação dos granulócitos ocorre precocemente; a neutropenia ocorre mais tarde. Em geral, costuma haver trombocitopenia nos casos graves, e as plaquetas podem ter tamanhos e formas bizarros. Embora a deficiência de ferro possa mascarar a macrocitose, corpos de Howell-Jolly e hipersegmentação de granulócitos ainda devem estar presentes.
Dosar os níveis de vitamina B12 e folato. Níveis de B12 < 200 pg/mL (< 147,6 pmol/L), níveis de folato < 2 ng/mL (< 4,53 nmol/L), ou nível de folato eritrocitário < 150 ng/mL (< 340 nmol/L) geralmente diagnosticam a deficiência. Níveis de vitamina B12 entre 200 e 300 pg/mL (147,6 a 221,3 pmol/L) não são diagnósticos.
Quando os níveis de vitamina B12 não são diagnósticos, deve-se verificar tanto os níveis de ácido metilmalônico (MMA) como os de homocisteína (HCY). Os níveis séricos de ácido metilmalônico e homocisteína estão elevados na deficiência de vitamina B12, enquanto apenas a homocisteína está elevada na deficiência de folato. A insuficiência renal eleva o nível de ácido metilmalônico.
Se a deficiência de vitamina B12 for confirmada, deve-se testar a existência de autoanticorpos ao fator intrínseco.
Também deve-se realizar testes para determinar a causa da deficiência de vitamina.
Tratamento das anemias macrocíticas megaloblásticas
Suplementos vitamínicos apropriados
É necessário suplementos da vitamina indicada. Sempre excluir deficiência de vitamina B12 antes de utilizar suplementos de folato. Não fazer isso pode mascarar a deficiência concomitante de B12 melhorando a anemia e levar à progressão das complicações neurológicas.
O tratamento da deficiência de folato, deficiência de vitamina B12 é discutido em outras partes. Pode ser necessário eliminar os medicamentos que provocam estados megaloblásticos ou serem administrados em doses reduzidas.
Também deve-se tratar a etiologia de qualquer deficiência vitamínica.
Pontos-chave
Megaloblastos são grandes precursores nucleados dos eritrócitos com cromatina não condensada.
As causas mais comuns da anemia macrocítica megaloblástica são deficiência ou utilização defeituosa de vitamina B12 ou folato.
Fazer hemograma completo, contagem de eritrócitos, contagem de reticulócitos e esfregaço de sangue periférico.
Dosar os níveis de vitamina B12 e folato e considerar a dosagem de ácido metilmalônico e homocisteína.
Tratar a causa da deficiência de B12 ou de folato.