A taquicardia ventricular polimórfica catecolaminérgica é uma doença genética que afeta a regulação do cálcio intracelular no tecido cardíaco. Os pacientes têm predisposição a taquiarritmias ventriculares (menos comumente, taquiarritmias atriais) e morte cardíaca súbita, particularmente durante o aumento da atividade adrenérgica (p. ex., por exercícios). O diagnóstico é feito por teste de esforço. O tratamento consiste em restrição a esforços, bloqueio beta e, às vezes, cardioversor desfibrilador implantável (CDI).
(Ver também Visão geral das arritmias e Visão geral das canalopatias.)
A taquicardia ventricular polimórfica catecolaminérgica (TVPC) resulta de mutações que afetam as proteínas relacionadas com a regulação do cálcio intracelular (particularmente a liberação de cálcio diastólico pelo receptor de rianodina do retículo sarcoplasmático) no coração. As anormalidades intensificam a liberação de cálcio do retículo sarcoplasmático em resposta à estimulação adrenérgica. A sobrecarga de cálcio nos miócitos resultante causa pós-despolarizações tardias e propensão a taquiarritmias atriais e/ou ventriculares. Pode ocorrer morte cardíaca súbita.
As taquiarritmias costumam ser precipitadas pela estimulação adrenérgica do estresse físico ou emocional. A taquiarritmia ventricular mais característica é a taquicardia ventricular bidirecional que aparece no ECG como 2 complexos QRS de polaridade oposta em um padrão alternado. Entretanto, qualquer taquicardia ventricular (TV) polimórfica ou fibrilação ventricular (FV) pode ocorrer.
A incidência de TVPC é desconhecida, mas foi estimada em cerca de 1 em 20.000 (1) e é igualmente comum em homens e mulheres. Em geral, é herdada como uma mutação autossômica dominante do gene que codifica o receptor de rianodina cardíaco, mas pode ser herdada como uma mutação autossômica recessiva da calsequestrina (CASQ2) cardíaca.
Referência geral
1. Wilde AAM, Semsarian C, Márquez MF, et al: European Heart Rhythm Association (EHRA)/Heart Rhythm Society (HRS)/Asia Pacific Heart Rhythm Society (APHRS)/Latin American Heart Rhythm Society (LAHRS) Expert Consensus Statement on the state of genetic testing for cardiac diseases. J Arrhythm 38(4):491–553, 2022. doi: 10.1002/joa3.12717
Sinais e sintomas da taquicardia ventricular polimórfica catecolaminérgica
Alguns pacientes são assintomáticos e identificados somente na triagem familiar. Quando os sintomas ocorrem, eles costumam se desenvolver em uma idade jovem (isto é, infância ou adolescência). As taquiarritmias podem causar palpitações, síncope ou parada cardíaca. Os eventos são tipicamente desencadeados por estresse emocional ou físico.
Diagnóstico da taquicardia ventricular polimórfica catecolaminérgica
Teste de esforço
Exame genético
Triagem dos familiares de primeiro grau
Deve-se considerar o diagnóstico em pacientes com parada cardíaca ou síncope inexplicável ou história familiar destas na ausência de cardiopatias estruturais.
O ECG em repouso é normal. Confirma-se o diagnóstico por TV polimórfica induzida por teste de esforço (especialmente TV bidirecional) que também reproduz os sintomas do paciente. Deve-se então fazer testes genéticos; estes têm um rendimento de aproximadamente 60% (1).
Familiares de primeiro grau dos pacientes têm risco significativo de ter a doença. Eles devem passar por avaliação clínica (isto é, para detectar sintomas sugestivos de arritmia) e teste de esforço, realizados a cada 1 a 3 anos. Se o paciente inicial tem uma mutação causadora identificada, os familiares sem a mutação índice são então dispensados da necessidade de investigações de acompanhamento.
Referência sobre diagnóstico
1. Wilde AAM, Semsarian C, Márquez MF, et al: European Heart Rhythm Association (EHRA)/Heart Rhythm Society (HRS)/Asia Pacific Heart Rhythm Society (APHRS)/Latin American Heart Rhythm Society (LAHRS) Expert Consensus Statement on the state of genetic testing for cardiac diseases. J Arrhythm 38(4):491–553, 2022. doi: 10.1002/joa3.12717
Tratamento da taquicardia ventricular polimórfica catecolaminérgica
Restrição a exercícios
Bloqueio beta
Flecainida
Às vezes, cardioversor desfibrilador implantável (CDI)
Denervação simpática cardíaca esquerda
Aconselham-se todos os pacientes a evitar exercícios extenuantes (p. ex., esportes competitivos). Especialmente, devem-se orientar aqueles que não aceitam restrições aos exercícios quanto à necessidade de precauções apropriadas (p. ex., disponibilidade de um desfibrilador externo automático durante treinamentos e competições).
Para pacientes que tiveram sintomas (p. ex., síncope, parada cardíaca) ou que demonstraram FV ou TV sustentada, o tratamento primário consiste em altas doses de betabloqueadores de ação prolongada, preferencialmente um sem atividade simpaticomimética intrínseca (p. ex., nadolol, propranolol de liberação lenta). Se o bloqueio beta for ineficaz, a flecainida pode ser útil pelos seus efeitos de bloqueio tanto do canal de sódio quanto do receptor de rianodina.
Utilizam-se cardioversores-desfibriladores implantáveis (CDIs) em pacientes com taquicardia ventricular polimórfica catecolaminérgica que sobreviveram à parada cardíaca ou que têm TV apesar de tratamento com fármacos antiarrítmicos.
Tratam-se os casos refratários com denervação simpática cardíaca esquerda e/ou ablação guiada pelo substrato arritmogênico.
O acompanhamento costuma envolver testes de esforço repetidos, mas seu valor preditivo é apenas moderado.
Pacientes assintomáticos (incluindo parentes identificados por teste genético) também devem moderar suas atividades físicas e receber tratamento com betabloqueadores.