Bloqueio atrioventricular

(Bloco AV)

PorL. Brent Mitchell, MD, Libin Cardiovascular Institute of Alberta, University of Calgary
Revisado/Corrigido: set. 2024
Visão Educação para o paciente

Bloqueio atrioventricular é a interrupção parcial ou completa da transmissão do impulso dos átrios aos ventrículos. As causas mais comuns são fibrose e esclerose idiopáticas do sistema de condução. O diagnóstico é realizado por ECG; os sintomas e o tratamento dependem do grau do bloqueio, mas o tratamento, quando necessário, geralmente envolve estimulação artificial.

(Ver também Visão geral das arritmias.)

As causas mais comuns do bloqueio AV são (1)

  • Fibrose idiopática e esclerose do sistema de condução (cerca de 40% dos pacientes)

  • Doença cardíaca isquêmica (20%)

Os demais casos de bloqueio AV são provocados por

  • Medicamentos (p. ex., betabloqueadores, bloqueadores dos canais de cálcio, digoxina, amiodarona)

  • Tônus vagal aumentado

  • Sarcoidose cardíaca

  • Valvulopatia

  • Doenças cardíacas congênitas, genéticas ou outras

Até um terço dos pacientes entre 18 e 60 anos com bloqueio AV de segundo ou terceiro grau Mobitz II de início recente sem doença cardíaca estrutural evidente é diagnosticado com sarcoidose cardíaca após investigações direcionadas (2).

Causas transitórias ou reversíveis do bloqueio AV podem incluir cardite de Lyme e bloqueios cardíacos mediados neurologicamente (vagal).

O bloqueio atrioventricular pode ser parcial ou completo. Bloqueios de primeiro e segundo grau são parciais. Bloqueios de terceiro grau são completos.

BAV de primeiro grau

Todas as ondas P normais são seguidas por um complexo QRS, mas o intervalo PR é mais longo que o normal (> 0,20 segundo — ver figura Bloqueio atrioventricular).

Bloqueio atrioventricular de primeiro grau

Para bloqueio de primeiro grau, a condução é desacelerada, sem falha de batimento. Todas as ondas P normais são seguidas de complexos QRS, mas o intervalo P-R é mais longo do que o normal (> 0,2 segundos).

O BAV de primeiro grau pode ser fisiológico em pacientes mais jovens com tônus vagal exacerbado e em atletas bem treinados. O bloqueio AV de primeiro grau é raramente sintomático e, em geral, nenhum tratamento é necessário. Quando o intervalo PR é muito longo (> 0,3 segundo), pode ocorrer intolerância ao exercício devido à dispneia ou fadiga devido à perda da sincronia AV.

Pode-se indicar investigação adicional quando o BAV de primeiro grau acompanha outra cardiopatia ou parece ser causado por medicamentos.

BAV de segundo grau

Algumas ondas P normais são sucedidas por complexos QRS, mas outras não. Há dois tipos:

  • Mobitz tipo I

  • Mobitz tipo II

No bloqueio AV de segundo grau de Mobitz tipo I clássico, o intervalo P-R prolonga-se progressivamente a cada batimento até que o impulso atrial não é conduzido e o complexo QRS não ocorre (fenômeno de Wenckebach); a condução nodal AV é retomada no próximo batimento e esse batimento tem o intervalo PR mais curto; a sequência se repete (ver figura Bloqueio AV de segundo grau de Mobitz tipo I clássico). Comumente, o prolongamento do intervalo PR durante a sequência é mais variável, mas então sempre se encurta com o primeiro batimento conduzido após a pausa (3).

Bloqueio atrioventricular de segundo grau Mobitz tipo I clássico

O intervalo P-R aumenta progressivamente a cada batimento até que o batimento atrial não seja conduzido e não haja complexo QRS (fenômeno de Wenckebach); a condução nodal atrioventricular é retomada no próximo batimento, que tem o intervalo P-R mais curto, e a sequência se repete.

O BAV de segundo grau Mobitz tipo I pode ser fisiológico em pacientes mais jovens e atléticos. Se o complexo QRS é estreito, o bloqueio AV de segundo grau Mobitz tipo I está quase sempre no nó AV; se o complexo QRS é largo (> 0,12 segundo), o bloqueio AV de segundo grau Mobitz I tem maior probabilidade de ocorrer no sistema His-Purkinje (60 a 70%) do que no nó AV (30 a 40%) (2). O bloqueio nodal AV geralmente progride lentamente e, se o bloqueio se torna completo, normalmente se desenvolve um ritmo de escape juncional confiável, com uma frequência razoável (35 a 55 batimentos/minuto). Dessa forma, o tratamento é frequentemente desnecessário, a menos que o bloqueio provoque bradicardia sintomática e as causas reversíveis e transitórias tenham sido excluídas. O tratamento é o implante de marca-passo, o que também pode beneficiar pacientes assintomáticos com bloqueio AV de segundo grau Mobitz tipo I em pontos infranodais, detectados por estudos eletrofisiológicos efetuados por outras razões.

No BAV de segundo grau, Mobitz tipo II, o intervalo P-R permanece constante. Os batimentos deixam de ser conduzidos de forma intermitente e os complexos QRS não ocorrem, geralmente em um ciclo repetitivo a cada 3ª (bloqueio 3:1) ou 4ª (bloqueio 4:1) onda P (ver figura Bloqueio AV de 2º grau, Mobitz tipo II). O intervalo RR abrangendo o bloqueio é igual ao dobro dos outros intervalos RR.

Bloqueio atrioventricular de segundo grau Mobitz tipo II

O intervalo P-R permanece constante. Os batimentos são intermitentemente não conduzidos e há falha de complexos QRS, geralmente em um ciclo repetido a cada 3 (bloqueio 3:1) ou 4 (bloqueio 4:1) ondas P.

O BAV de segundo grau, Mobitz tipo II, sempre é patológico; o bloqueio ocorre no feixe de His em 25% dos pacientes e nos ramos nos demais (4). Os pacientes podem ser assintomáticos ou desenvolver atordoamento, pré- síncope e síncope, dependendo da razão dos batimentos conduzidos e bloqueados. A progressão do bloqueio AV de segundo grau Mobitz tipo II para bloqueio cardíaco completo é típica e pode ser súbita, e o ritmo de escape ventricular é mais lento (20 a 40 batimentos/minuto) do que um ritmo de escape juncional (35 a 50 batimentos/minuto) e pode não ser confiável, dando lugar à assistolia; portanto, na ausência de uma causa transitória ou reversível, um marca-passo é indicado (3).

No bloqueio AV de segundo grau mais grave, toda segunda onda P (ou mais) é bloqueada (ver figura Bloqueio AV de segundo grau – avançado).

BAV de segundo grau (avançado)

Toda segunda onda P é bloqueada neste exemplo de bloqueio AV de segundo grau avançado.

Em pacientes com bloqueio AV de segundo grau avançado, é difícil distinguir bloqueio AV Mobitz tipo I de bloqueio AV Mobitz tipo II porque 2 ondas P nunca são conduzidas em sequência. Também é difícil prever o risco de bloqueio AV total, e o implante de um marca-passo costuma ser indicado (5).

Os pacientes com qualquer forma de BAV de segundo grau e cardiopatia estrutural devem ser considerados candidatos a marca-passo permanente, a menos que exista causa reversível ou transitória.

Bloqueio atrioventricular de terceiro grau

No bloqueio AV de terceiro grau, nenhuma onda P conduz para formar complexos QRS. Por definição, a frequência da onda P é maior do que a frequência QRS. Assim, o bloqueio cardíaco é total no bloqueio AV de terceiro grau (ver figura Bloqueio AV de terceiro grau).

Bloqueio atrioventricular de terceiro grau

Não há nenhuma relação entre ondas P e os complexos QRS (dissociação AV) no bloqueio AV de terceiro grau. A frequência da onda P é maior do que a frequência QRS. O ritmo subjacente aqui é um ritmo de escape juncional com complexos QRS estreitos e uma frequência de aproximadamente 65 batimentos/minuto.

Não existe nenhuma comunicação elétrica entre átrios e ventrículos e assim não há qualquer relação entre ondas P e complexos QRS (dissociação AV). A função cardíaca é mantida por escape juncional ou marca-passo ventricular. Os ritmos de escape que se originam acima da bifurcação do feixe de His registram complexos QRS estreitos, frequência cardíaca relativamente rápidas (35-50 bpm) e seguras e sintomas leves (p. ex., fadiga, sensação de atordoamento postural e intolerância ao esforço). Ritmos de escape originados abaixo da bifurcação produzem complexos QRS mais largos, frequências cardíacas mais lentas (20 a 40 batimentos por minuto) e pouco confiáveis, além de sintomas mais graves (como pré-síncope, síncope, insuficiência cardíaca). Os sinais são aqueles da dissociação AV, como ondas a em canhão, flutuações da pressão arterial e variações de intensidade da B1. O risco de síncope relacionada à assistolia e morte súbita será maior, se o ritmo de escape for lento.

A maioria dos pacientes necessita de implante de marca-passo. Se o bloqueio for provocado por medicamentos antiarrítmicos, a interrupção do medicamento pode ser efetiva, embora possa ser necessário marca-passo temporário. Entretanto, mesmo se o bloqueio reverter após a interrupção de um medicamento dromotrópico negativo, o bloqueio pode recorrer mais tarde na ausência do medicamento. Portanto, a vigilância contínua é necessária. O bloqueio AV causado por infarto agudo do miocárdio inferior geralmente reflete disfunção nodal atrioventricular decorrente do aumento do tônus parassimpático e/ou liberação de adenosina local. Pode responder à atropina ou aminofilina e, na maioria dos casos, desaparece espontaneamente ao longo de vários dias.

O bloqueio causado por infarto do miocárdio anterior geralmente reflete necrose miocárdica extensa comprometendo o sistema His-Purkinje e requer implante imediato de marca-passo transvenoso, com período de estimulação artificial externa, se necessário (5). Pode haver resolução espontânea, mas é indicada avaliação da condução nodal AV e infranodal (p. ex., estudo eletrofisiológico, teste de esforço e ECG de 24 horas).

A maioria dos pacientes com bloqueio AV de terceiro grau congênito isolado tem ritmo de escape juncional, mantendo uma frequência razoável, mas requer marca-passo permanente antes de alcançar a meia-idade. De maneira menos comum, os portadores de BAV congênito têm ritmo de escape lento e exigem marca-passo permanente em idade mais jovem, talvez até durante a infância.

Referências

  1. 1.Wogan JM, Lowenstein SR, Gordon GS: Second-degree atrioventricular block: Mobitz type II. J Emerg Med 11(1):47–54, 1993. doi:10.1016/0736-4679(93)90009-v

  2. 2. Nery PB, Beanlands RS, Nair GM, et al: Atrioventricular block as the initial manifestation of cardiac sarcoidosis in middle-aged adults. J Cardiovasc Electrophysiol 25(8):875–881, 2014. doi: 10.1111/jce.12401

  3. 3. Barold SS: Type I Wenckebach second-degree AV block: A matter of definition. Clin Cardiol 41(3):282–84, 2018. doi: 10.1002/clc.22874

  4. 4. Waller BF, Gering LE, Branyas NA, Slack JD: Anatomy, histology, and pathology of the cardiac conduction system--Part V. Clin Cardiol 16(7):565–569, 1993. doi:10.1002/clc.4960160710

  5. 5. Kusumoto FM, Schoenfeld MH, Barrett C, et al: 2018 ACC/AHA/HRS guideline on the evaluation and management of patients with bradycardia and cardiac conduction delay: A Report of the American College of Cardiology/American Heart Association Task Force on Clinical Practice Guidelines and the Heart Rhythm Society. Heart Rhythm 16(9):e128–e226, 2019. doi: 10.1016/j.hrthm.2018.10.037 

Pontos-chave

  • Existem 3 graus de bloqueio atrioventricular: primeiro, segundo e terceiro grau.

  • Bloqueios de primeiro e segundo graus são parciais e bloqueios de terceiro grau são completos.

  • O bloqueio AV de primeiro grau raramente é sintomático e nenhum tratamento é necessário.

  • O bloqueio AV de segundo grau Mobitz tipo I pode ser fisiológico e, se a frequência cardíaca diminuir, normalmente se desenvolve um ritmo de escape juncional confiável; portanto, é desnecessário tratamento, a menos que ocorra bradicardia sintomática.

  • O bloqueio AV de segundo grau Mobitz tipo II e o bloqueio AV de terceiro grau são sempre patológicos e geralmente é necessário marca-passo, a menos que a causa seja transitória ou reversível.

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