A deficiência de vitamina K resulta de ingestão extremamente inadequada ou má absorção de gordura. O risco de hemorragia é maior com uso de anticoagulantes cumarínicos. A deficiência, particularmente comum em crianças amamentadas ao peito. Prejudica a coagulação. O diagnóstico baseia-se em achados de estudos rotineiros de coagulação e se confirma pela resposta à vitamina K. O tratamento consiste na administração por via oral de vitamina K ou, quando a má absorção de gordura for a causa ou quando o risco de sangramento é alto, por via parenteral.
A deficiência de vitamina K diminui os níveis de protrombina e outros fatores de coagulação dependentes de vitamina K, causando coagulação defeituosa e, potencialmente, sangramento.
No mundo todo, a deficiência de vitamina K pode causar morbidade e mortalidade infantil.
A deficiência de vitamina K provoca a doença hemorrágica do recém-nascido, que costuma ocorrer 1 a 7 dias depois do parto. Em recém-nascidos afetados, traumas ao nascer podem causar hemorragia intracraniana. A forma tardia da doença pode ocorrer em crianças de 2 a 12 semanas de idade, tipicamente em lactentes que são amamentados e não recebem suplementos de vitamina K. Se a mãe tiver ingerido anticonvulsivantes à base de fenitoína, anticoagulantes cumarínicos ou antibióticos à base de cefalosporina, o risco de doença hemorrágica é alto.
Em adultos saudáveis, a deficiência de vitamina K é incomum porque a vitamina K está largamente distribuída em verduras e as bactérias do intestino normal sintetizam menaquinonas.
(Ver também Visão geral das vitaminas.)
Fisiologia da deficiência de vitamina K
A vitamina K1 (filoquinona) é a vitamina K da dieta. Suas fontes são as verduras (especialmente couve, espinafre e alfaces verdes), soja e óleos vegetais. A gordura da dieta aumenta sua absorção. Fórmulas infantis contêm vitamina K suplementada. Após o período neonatal, as bactérias no trato gastrointestinal sintetizam vitamina K, que é absorvida e utilizada pelo corpo.
A vitamina K2 refere-se ao grupo de componentes (menaquinonas) sintetizados por bactérias no trato intestinal; a quantidade sintetizada não satisfaz a necessidade de vitamina K.
A vitamina K controla a formação dos fatores de coagulação II (protrombina), VII, IX e X no fígado (ver tabela Fontes, funções e efeitos das vitaminas). Outros fatores de coagulação dependentes de vitamina K são proteína C, proteína S e proteína Z; proteínas C e S são anticoagulantes. As vias metabólicas preservam a vitamina K. Depois que a vitamina K participa da formação dos fatores de coagulação, o produto da reação, o epóxido de vitamina K, é convertido por reação enzimática na forma ativa, a hidroquinona vitamina K.
As ações das proteínas dependentes de vitamina K requerem cálcio. As proteínas dependentes de vitamina K, osteocalcina e proteína matriz gama-carboxiglutamil (Gla), têm importante papel nos ossos e em outros tecidos. Formas de vitamina K são terapias comuns para osteoporose no Japão e outros países.
Etiologia da deficiência de vitamina K
Recém-nascidos são propensos à deficiência de vitamina K, pois:
A placenta transmite pouca vitamina K e lipídios.
O fígado neonatal é imaturo na síntese de protrombina.
O leite humano é pobre em vitamina K, contendo em torno de 2,5 mcg/L (o leite de vaca contém 5.000 mcg/L).
O intestino neonatal é estéril durante os primeiros dias de vida.
Em adultos, a deficiência de vitamina K pode resultar de
Má absorção de gordura (p. ex., devido à obstrução biliar, distúrbios de má absorção, fibrose cística, ou ressecção do intestino delgado)
Os anticoagulantes da cumarina interferem na síntese da vitamina K no trato intestinal e inibem a síntese das proteínas de coagulação dependentes da vitamina K (fatores II, VII, IX e X) no fígado.
Certos antibióticos (particularmente algumas cefalosporinas e outros antibióticos de amplo espectro), salicilatos, megadoses de vitamina E e insuficiência hepática aumentam o risco de sangramento em pacientes com deficiência de vitamina K.
É improvável que a ingestão inadequada de vitamina K cause os sintomas.
Sinais e sintomas de deficiência de vitamina K
Sangramento é a manifestação comum. Podem ocorrer equimose e hemorragia da mucosa (em especial epistaxe, hemorragia gastrointestinal, menorragia e hematúria). Pode haver extravasamento de sangue de lugares puncionados ou incisões.
Em lactentes, a doença hemorrágica do recém-nascido e a doença hemorrágica tardia podem causar sangramento intratorácica, gastrointestinal, cutânea ou, nos casos mais graves, intracraniana. Se ocorrer icterícia obstrutiva, o sangramento — se houver — geralmenteinicia-se após o 4º ou 5º dia. Ela pode começar com pequenos vazamentos de uma incisão cirúrgica, das gengivas, do nariz, da mucosa gastrointestinal, ou como um sangramento maciço no trato gastrointestinal.
Diagnóstico da deficiência de vitamina K
Em geral, um tempo da protrombina (TP) prolongado ou uma razão normalizada internacional (RNI) elevada que diminui após a fitonadiona
Deve-se suspeitar de deficiência ou antagonismo de vitamina K (decorrente de anticoagulantes cumarínicos) quando ocorrer sangramento anormal em um paciente em risco. Estudos de coagulação sanguínea podem, preliminarmente, confirmar o diagnóstico. O tempo de protrombina está prolongado e a razão normalizada internacional (RNI) está elevada, mas o tempo da tromboplastina parcial (TTP), o tempo da trombina, a contagem plaquetária, o tempo de sangramento e os níveis de fibrinogênio, produtos da degradação da fibrina e dímero D são normais.
Se a fitonadiona (nome genérico da vitamina K1 na United States Pharmacopeia), na dose de 1 mg em infusão venosa, diminuir significativamente o tempo de protrombina em 2 a 6 horas, é improvável que uma disfunção hepática seja a causa, confirmando-se o diagnóstico de deficiência da vitamina K.
Alguns centros podem detectar a deficiência de vitamina K de modo mais direto medindo o nível sérico da vitamina. O nível sérico da vitamina K1 varia de 0,2 a 1,0 ng/mL em pessoas saudáveis que consomem quantidades adequadas de vitamina K1 (50 a 150 mcg/dia). Conhecer a ingestão de vitamina K pode ajudar a interpretar os níveis séricos; ingestões recentes afetam os níveis no plasma, mas não nos tecidos.
Indicadores mais sensíveis do estado de vitamina K, como PIVKA (proteína induzida na ausência ou no antagonismo da vitamina K) e osteocalcina subcarboxilada, ainda estão em estudo.
Tratamento da deficiência de vitamina K
Fitomenadiona
Sempre que possível, deve-se administrar fitomenadiona por via oral ou por via subcutânea. A dose adulta habitual é 1 a 20 mg. (Raramente, mesmo quando a fitomenadiona é corretamente diluída e administrada lentamente, a substituição IV pode resultar em anafilaxia ou reações anafiláticas.) A razão normalizada internacional (RNI) geralmente diminui em 6 a 12 horas. A dose pode ser repetida em 6 a 8 horas se a razão normalizada internacional (RNI) não diminuir satisfatoriamente.
Fitomenadiona, 1 a 10 mg por via oral é indicada para correção não emergencia da RNI prolongada em pacientes que tomam anticoagulantes. A correção costuma ocorrer em 6 a 8 horas. Quando se deseja apenas a correção parcial da RNI (p. ex., quando a razão normalizada internacional deve permanecer ligeiramente elevada por causa de uma prótese valvar cardíaca), doses baixas (p. ex., 1 a 2,5 mg) de fitomenadiona podem ser administradas.
Em lactentes, pode-se corrigir o sangramento decorrente da deficiência de vitamina K por meio da administração de 1 mg de fitomenadiona, por via subcutânea ou IM em dose única. A dose é repetida se a RNI permanecer elevada. Altas doses podem ser necessárias se a mãe tiver tomado anticoagulantes orais.
Prevenção da deficiência de vitamina K
Recomenda-se a administração 1 mg de fitonadiona a recém-nascidos que pesam > 1500 g ou 0,3 a 0,5 mg/kg para lactentes que pesam ≤ 1500 g no intervalo de 6 horas após o nascimento a fim de reduzir a incidência de hemorragia intracraniana decorrente de trauma de nascimento e a clássica doença hemorrágica do recém-nascido (risco de sangramento maior 1 a 7 dias após o nascimento) (1). A fitomenadiona também é utilizada profilaticamente antes de cirurgias.
Alguns médicos recomendam que gestantes que tomam anticonvulsivantes recebam 10 mg de fitomenadiona por via oral uma vez ao dia por 1 mês antes do parto, ou 20 mg por via oral uma vez ao dia por 2 semanas antes do parto.
Pode-se aumentar o baixo teor de vitamina K1 no leite materno incrementando a ingestão alimentar de filoquinona para 5 mg/dia.
Referência sobre prevenção
1. Hand I, Noble L, Abrams SA: Vitamin K and the newborn infant. Pediatrics 149(3):e2021056036, 2022. doi: 10.1542/peds.2021-056036
Pontos-chave
A deficiência de vitamina K pode causar morbidade e mortalidade infantil no mundo todo.
A deficiência causa sangramento (p. ex., equimoses fáceis, sangramento de mucosa).
Deve-se suspeitar da deficiência em pacientes de risco com sangramento anormal ou excessivo.
Medir TP ou RNI antes e depois de administrar fitomenadiona; uma diminuição no TP prolongado ou a RNI elevada após a fitomenadiona confirma o diagnóstico.
Tratar com fitonadiona por via oral ou por via subcutânea.