Granulomatose com poliangiite (GPA)

(Anteriormente conhecida como granulomatose de Wegener)

PorAlexandra Villa-Forte, MD, MPH, Cleveland Clinic
Revisado/Corrigido: jun. 2022
Visão Educação para o paciente

A granulomatose com poliangiite é caracterizada por inflamação granulomatosa necrosante, vasculite de pequenos e médios vasos e glomerulonefrite necrosante focal, geralmente crescêntica. Tipicamente, o trato respiratório superior e inferior e os rins são afetados, mas qualquer órgão também pode ser. Os sintomas variam dependendo dos órgãos e sistemas envolvidos. Os pacientes devem apresentar sintomas no trato respiratório superior e inferior (p. ex., epistaxe ou secreção nasal recorrente, tosse), seguida de hipertensão e edema ou com sintomas que refletem o envolvimento de múltiplos órgãos. O diagnóstico geralmente requer uma biópsia. O tratamento é com corticoides e um imunossupressor. Geralmente a remissão é possível, embora as recidivas sejam comuns.

(Ver também Visão geral da vasculite.)

Granulomatose com poliangiite (GPA) ocorre em cerca de 1/25.000 pessoas; é mais comum em brancos, mas pode ocorrer em todos os grupos étnicos e em qualquer idade. A idade média da apresentação dos sintomas é de 40 anos.

A causa da granulomatose com poliangiite é desconhecida, embora mecanismos imunológicios possam desempenhar um papel importante. Muitos pacientes com a doença generalizada ativa tem anticorpos citoplasmáticos antineutrófilos (ANCA).

Fisiopatologia da granulomatose com poliangiite

Caracteristicamente, os granulomas se formam com células epitelioides e histiocíticas e frequentemente com células gigantes. Células plasmáticas, linfócitos, neutrófilos e eosinófilos estão presentes. Inflamação afeta os tecidos e vasos; a vasculite pode ser um pequeno ou grande componente da doença. A micronecrose, geralmente com neutrófilos (microabscessos), ocorre no início da doença. A micronecrose progride até se tornar uma macronecrose. Uma área central de necrose (chamada necrose geográfica) é formada por linfócitos, células plasmáticas, macrófagos e células gigantes. Uma zona de proliferação fibroblástica com histiócitos em paliçada pode circundar a área.

Inflamação crônica não específica e necrose do tecido ocorrem no nariz. Os pulmões têm maior probabilidade de apresentar o espectro completo de anormalidades histopatológicas, mas as características diagnósticas não são tipicamente identificadas em pequenas amostras teciduais obtidas por biópsia transbronquial. O achado mais comum no rim é a glomerulonefrite focal crescêntica pauci-imune com necrose e trombose de alças renais ou segmentos maiores do glomérulo. As lesões vasculíticas e granulomas disseminados ocorrem somente ocasionalmente.

Sinais e sintomas da granulomatose com poliangiite

O início de granulomatose com poliangiite pode ser insidioso ou agudo, e o espectro total da doença pode demorar anos para evoluir. Alguns pacientes inicialmente apresentam sintomas no trato respiratório superior e inferior; mais tarde, os rins são afetados. Em outros pacientes, o início das manifestações sistêmicas é relativamente agudo; vários órgãos e sistemas, como o trato respiratório superior, sistema nervoso periférico (causando mononeuropatia múltipla), rins (causando glomerulonefrite) e trato respiratório inferior (causando hemorragia, nódulos pulmonares, cavidades ou uma combinação de sintomas), são afetados simultaneamente.

  • Trato respiratório superior: dor no seios paranasais, secreção purulenta ou serosanguinolenta e epistaxe podem ocorrer. A mucosa parece granular (como pedras de calçamento) e é friável; úlceras, crostas escuras e grossas e perfuração do septo nasal são comuns. A condrite nasal pode ocorrer com edema, dor e colapso da ponte nasal (sela nasal). Os pacientes podem relatar sinusite recorrente que respondeu inadequadamente ao tratamento com antibióticos múltiplos e que necessitou de uma ou mais operações do seio nasal antes do diagnóstico. Infecção secundária (p. ex., pelo Staphylococcus aureus) pode se desenvolver. Estenose subglótica pode se desenvolver causando sintomas como dor na laringe, rouquidão, dispneia, respiração ofegante e ruído respiratório.

  • Ouvidos: otite, perda auditiva neurossensorial, vertigem e condrite podem ocorrer. A orelha média, a orelha interna e o processo mastoide são frequentemente afetados.

  • Olhos: os olhos podem parecer vermelhos e inchados. Inflamação e obstrução do ducto nasolacrimal; conjuntivite, uveíte ou vasculite retiniana também podem ocorrer. Infiltrados inflamatórios no espaço retro-orbital (pseudotumor orbitário) podem causar proptose, compressão do nervo ótico e cegueira. A extensão até os músculos extraoculares leva a diplopia. Se sérios sintomas nos olhos se desenvolverem, a avaliação e tratamento imediatos são necessários para evitar a perda da visão permanente.

  • Trato respiratório inferior: as manifestações respiratórias são comuns. A inflamação dos brônquios maiores e seus ramos pode causar respiração ofegante localizada, pneumonia pós-obstrutiva e atelectasia. Nódulos únicos ou múltiplos, com ou sem cavitação e infiltrados parênquimais, as vezes causam sintomas como dor no peito, falta de ar e tosse produtiva. Dispneia com infiltrados bilaterais, com ou sem hemoptise, pode indicar hemorragia alveolar e deve ser avaliada imediatamente.

  • Coração: a doença coronariana pode ocorrer, mas é raro.

  • Sistema musculoesquelético: os pacientes costumam apresentar mialgia, artralgia ou artrite inflamatória não erosiva.

  • Pele: pode haver púrpura palpável, nódulos subcutâneos sensíveis, pápulas, livedo reticular ou úlceras.

  • Sistema nervoso: a vasculite pode causar neuropatia periférica isquêmica, lesões cerebrais ou extensão da inflamação no tecido neural de locais contíguos. Lesões que se originam nos seios nasais ou na orelha média podem se entender diretamente até a área retrofaríngea e base do crânio, levando à neuropatia craniana, proptose, diabetes insípida ou meningite.

  • Rins: sinais e sintomas de glomerulonefrite se desenvolvem. Costuma haver alterações do sedimento urinário e a creatinina sérica pode aumentar rapidamente. Pode ocorrer edema e hipertensão. A glomerulonefrite progressiva rápida, que causa risco à vida, pode se desenvolver.

  • Sistema venoso: a trombose venosa profunda pode comprometer os membros inferiores, sobretudo quando a granulomatose com poliangiite estiver em atividade.

  • Outros órgãos: ocasionalmente, uma massa inflamatória ocorre nas mamas, rins, próstatas ou outros órgãos.

Diagnóstico da granulomatose com poliangiite

  • Testes laboratoriais de rotina incluindo análise de urina

  • Testes para anticorpos anticitoplasma de neutrófilos

  • TC torácica e sinonasal

  • Biópsia para diagnostico definitivo

Deve-se suspeitar de granulomatose com poliangiite em pacientes com sinais e sintomas respiratórios crônicos e inexplicáveis (incluindo otite média em adultos), particularmente se houver manifestações sugestivas em outros órgãos ou sistemas, especialmente os rins, que também sugiram o distúrbio. Realizam-se testes laboratoriais de rotina, mas testes ANCA e biópsia seletiva dos tecidos envolvidos produzem os achados mais específicos. A biópsia do tecido nasal raramente leva a um diagnóstico definitivo.

Testes laboratoriais de rotina incluem velocidade de hemossedimentação (velocidade de hemossedimentação), proteína C reativa, hemograma com diferencial, albumina sérica e proteína total, creatinina sérica, análise de urina, proteína na urina de 24 horas e radiografia do tórax. A TC sinonasal pode mostrar espessamento ou opacificação da mucosa sinusal, perfuração do septo nasal e lesão óssea. A TC do tórax sem contraste é quase sempre necessária porque a radiografia simples de tórax pode não revelar nódulos, massas e/ou lesões cavitárias causadas pela granulomatose com poliangiite. Na maioria dos pacientes com a doença ativa, velocidade de hemossedimentação (velocidade de hemossedimentação) e proteína C reativa são elevadas e a albumina sérica e proteína total são reduzidas; anemia, trombocitose e eosinofilia de leve a moderada são detectadas. Contagem do número de eritrócitos dismórficos e cilindros hemáticos, detectados durante análise de urina, indicam envolvimento glomerular. Proteinúria pode ser detectada. Creatinina sérica pode estar aumentada.

O teste sorológico para detectar ANCA (antineutrophil cytoplasmic autoantibodies) é seguido pelo teste de imunofluorescência e ensaio imunoadsorvente ligado à enzima (ELISA) para procurar anticorpos específicos. Muitos pacientes com doença ativa têm ANCA citoplasmática (c-ANCA), com anticorpos contra proteinase-3 (PR3); esses achados, associados a achados clínicos característicos, sugerem GPA.

Alguns pacientes com outros distúrbios (p. ex., endocardite bacteriana, abuso de cocaína, lúpus eritematoso sistêmico, amebíase, tuberculose) são positivos para ANCA. Como é provável que os exames de doenças raras sejam falsamente positivos quando solicitados para a população geral e o valor preditivo positivo de um teste ANCA positivo é de cerca de 50%, a dosagem do ANCA deve ser reservada para os pacientes nos quais a probabilidade do diagnóstico da granulomatose com poliangiite antes do exame ou outra vasculite associada ao ANCA seja pelo menos moderadamente elevada (p. ex., pacientes com hemorragia alveolar, glomerulonefrite ou mononeuropatia múltipla, além de outras características de poliangiite microscópica ou granulomatose com poliangiite).

Um ANCA positivo não descarta infecção microbacteriana e fúngica; assim, os pacientes com resultados positivos do ANCA e lesões pulmonares cavitárias ainda precisam realizar broncoscopia e culturas adequadas e outros exames para tuberculose e infecção fúngica. Teste (título) para ANCA não deve ser utilizado para orientar o tratamento subsequente. Durante a aparente remissão o ANCA pode aumentar ou os resultados do teste podem mudar de negativo para positivo. Em alguns desses pacientes os sintomas não recidivam; em outros os sintomas recidivam ou pioram logo após o teste ser feito ou durante as próximas semanas, meses ou anos.

Se possível, fazer biópsia para confirmar o diagnóstico da granulomatose com poliangiite. Locais clinicamente anormais devem ser biopsiados primeiro. Biópsia do tecido pulmonar comprometido tem maior probabilidade de revelar achados típicos; a toracotomia de campo aberto oferece o melhor acesso. É feita cultura das biópsias do pulmão ou tecidos nasais para excluir infecção. Biópsia renal mostrando glomerulonefrite pauci-imune focal crescente ou não crescente corrobora fortemente o diagnóstico. Os resultados da biópsia dos vários tecidos também podem proporcionar informação histológica que pode ajudar a guiar o tratamento (p. ex., fibrose renal).

O diagnóstico diferencial é feito com outras vasculites que comprometem pequenos e médios vasos. As infecções, especialmente aquelas resultantes de fungo de crescimento lento ou organismos álcool-ácido resistentes, devem ser excluídas por coloração e cultura dos tecidos amostrados.

Prognóstico da granulomatose com poliangeíte (GPA)

O prognóstico depende da gravidade e da extensão da doença, como também da rapidez do início do tratamento.

O uso de imunossupressores para doença grave tem melhorado dramaticamente o prognóstico. Com o tratamento, a remissão completa é possível em cerca de 80% dos casos, mas aproximadamente metade recidiva; a recidiva pode ocorrer durante a terapia de manutenção para remissão ou depois da suspensão do tratamento (algumas vezes muitos anos mais tarde). Retomar ou aumentar o tratamento geralmente pode controlar a doença. No entanto, 90% dos pacientes apresentam morbilidade importante decorrente da doença e/ou do tratamento.

Tratamento da granulomatose com poliangiite

  • Para induzir remissão na granulomatose com poliangiite potencialmente fatal ou com risco de órgão-alvo, fazer altas doses de corticoides com ciclofosfamida ou rituximabe

  • Para induzir remissão na granulomatose com poliangiite menos grave, corticoides e metotrexato ou rituximabe

  • Para manter a remissão, rituximabe isolado ou outro fármaco como metotrexato, azatioprina ou micofenolato de mofetila (rituximabe junto com algum desses fármacos, algumas vezes com baixa dose de corticoide, se os pacientes tiverem várias recidivas ou a granulomatose com poliangiite for refratária)

  • Transplante de rim, se necessário

O tratamento da granulomatose com poliangiite depende da gravidade da doença. Uma abordagem multidisciplinar é necessária para doença multiorgânica, frequentemente incluindo um reumatologista, otorrinolaringologista, pneumologista e, às vezes, nefrologista.

Os pacientes que têm manifestações graves com risco à vida ou aos órgãos (p. ex., hemorragia alveolar, glomerulonefrite rapidamente progressiva, mononeuropatia múltipla aguda com envolvimento motor) requerem internação imediata para que o tratamento induza a remissão. Esses pacientes requerem alta dose de corticoides e ciclofosfamida ou rituximabe (ver Indução da remissão). A eficácia do rituximabe e da ciclofosfamida parece ser semelhante para induzir e manter a remissão (1). Não foi demonstrado que a troca plasmática diminui a incidência da mortalidade ou doença renal em estágio terminal (2).

Rituximabe parece ser especialmente útil para reduzir o risco de recorrência. Em um estudo feito com pacientes com granulomatose com poliangiite e outras vasculites associadas ao ANCA, só ocorreram recidivas importantes em 5% dos pacientes tratados com rituximabe, porém, em 29% dos pacientes tratados com azatioprina (3). Não está inteiramente esclarecido se o rituximabe deve ser administrado isoladamente ou em combinação com outro fármaco e qual é a posologia do rituximabe. Mas em um estudo retrospectivo, as taxas de recidiva foram mais baixas quando o rituximabe foi associado ao metotrexato, à azatioprina ou ao micofenolato de mofetila do que quando o rituximabe foi utilizado isoladamente. A dose ideal de rituximabe para o tratamento de manutenção não foi estabelecida. A administração de um corticoide em dose baixa costuma ser feita para ajudar a manter a remissão.

Para doença menos grave, corticoides e metotrexato são utilizados para induzir a remissão. O rituximabe pode ser utilizado em vez do metotrexato. Nas manifestações do trato respiratório superior, o rituximabe parece manter a remissão melhor do que a ciclofosfamida, o metotrexato ou a azatioprina.

Corticoides são diminuídos para a menor dose possível ou descontinuados.

A irrigação dos seios da face com salina, com ou sem pomada nasal mupirocina 2%, ajuda a minimizar crostas e infecções estafilocócicas secundárias.

O tratamento da estenose subglótica é difícil. Os imunossupressores sistêmicos podem não ser efetivos. A injeção intralesional de corticoides de ação prolongada, com dilatação progressiva branda, acentuadamente melhora resultados e limita a necessidade de traqueostomia.

Os pacientes devem aprender sobre o distúrbio para que as recidivas sejam detectadas no início.

O transplante renal tem sido bem-sucedido; o risco de recaída após o transplante é reduzido quando comparado com o tratamento de manutenção, a diálise (possivelmente, em parte, devido ao uso de imunossupressores para evitar rejeição).

Referências sobre o tratamento

  1. 1. Stone JH, Merkel PA, Spiera R, et al: Rituximab versus cyclophosphamide for ANCA-associated vasculitis. N Engl J Med 363:221–232, 2010. doi: 10.1056/NEJMoa0909905

  2. 2. Walsh M, Merkel PA, Peh CA, et al: Plasma exchange and glucocorticoids in severe ANCA-associated vasculitis. N Engl J Med 382(7):622-631, 2020. doi:10.1056/NEJMoa1803537

  3. 3. Guillevin L, Pagnoux C, Karras A, et al: Rituximab versus azathioprine for maintenance in ANCA-associated vasculitis. N Engl J Med 371:1771–1780, 2014. doi: 10.1056/NEJMoa1404231

Pontos-chave

  • Na granulomatose com poliangiite, a vasculite compromete pequenos e médios vasos em qualquer órgão, tipicamente o rim (com glomerulonefrite) e as vias respiratórias superiores e inferiores com significativa inflamação granulomatosa necrosante do parênquima, que costuma ser mais exuberante do que a vasculite.

  • As manifestações podem afetar vários sistemas de órgãos e podem incluir sintomas do trato respiratório superior e inferior (p. ex., epistaxe ou secreção nasal recorrente, tosse), seguida de hipertensão e edema (decorrente de envolvimento do rim).

  • Confirmar o diagnóstico com sorologia de ANCA (antineutrophil cytoplasmic autoantibodies) e biópsia.

  • As recidivas são comuns e o tratamento pode contribuir para a morbidade.

  • Induzir a remissão com corticoides associados a um imunossupressor.

  • Manter a remissão com metotrexato, azatioprina ou rituximabe, e reduzir a dose de corticoides.

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