A doença de Wilson resulta em acúmulo de cobre no fígado e em outros órgãos. Sintomas neurológicos e hepáticos se desenvolvem. O diagnóstico baseia-se em baixos níveis de ceruloplasmina, alta excreção urinária de cobre e, às vezes, biópsia hepática. O tratamento consiste em dieta pobre em cobre e fármacos como penicilamina ou trientina.
(Ver também Visão geral das deficiências e toxicidades dos minerais.)
A doença de Wilson é um distúrbio do metabolismo de cobre que afeta homens e mulheres; cerca de 1 pessoa em 30.000 tem essa doença. Os afetados são homozigotos para o gene recessivo mutante, localizado no cromossomo 13. Os portadores heterozigotos, que constituem cerca de 1,1% da população, são assintomáticos.
Fisiopatologia da doença de Wilson
O defeito genético na doença de Wilson prejudica o transporte de cobre. O transporte de cobre prejudicado diminui a secreção de cobre na bile, gerando sobrecarga de cobre e acúmulo no fígado, iniciado ao nascimento. O transporte prejudicado também interfere na incorporação do cobre na ceruloplasmina, diminuindo assim seus níveis.
A fibrose hepática se desenvolve, produzindo finalmente a cirrose. O cobre se difunde do fígado para o sangue e então para os outros tecidos. Na maioria das vezes, é destrutivo para o cérebro, mas também afeta rins e órgãos reprodutivos e causa anemia hemolítica. Parte do cobre é depositada em torno da borda da córnea e da borda da íris, causando os anéis de Kayser-Fleischer. Os anéis parecem circundar a íris.
Sinais e sintomas da doença de Wilson
Os sintomas da doença de Wilson geralmente se desenvolvem dos 5 aos 35 anos, mas podem se desenvolver dos 2 aos 72 anos.
Em quase metade dos pacientes, em particular adolescentes, o primeiro sintoma é
Hepatite — aguda, crônica ativa ou fulminante
A hepatite pode, porém, desenvolver-se em qualquer momento.
Em cerca de 40% dos pacientes, principalmente adultos jovens, os primeiros sintomas refletem
Doença do sistema nervoso central
Deficits motores são comuns, incluindo qualquer combinação de tremores, distonia, disartria, disfagia, coreia, tontura e falta de coordenação. Às vezes, os sintomas do sistema nervoso central são anormalidades cognitivas ou psiquiátricas.
© Springer Science+Business Media
Em 5 a 10% dos pacientes, o primeiro sintoma é incidentalmente notado como anéis ou crescentes dourados ou dourado-esverdeados de Kayser-Fleischer (decorrentes de depósitos de cobre na córnea), hematúria, amenorreia ou abortos repetidos.
Diagnóstico da doença de Wilson
Exame com a lâmpada de fenda para anéis de Kayser-Fleischer
Ceruloplasmina sérica, algumas vezes cobre sérico, e excreção urinária de cobre em 24 horas
Confirmação de teste de provocação de penicilamina ou biópsia hepática
Suspeita-se da doença de Wilson em pessoas < 40 anos com qualquer um dos seguintes:
Inexplicável distúrbio hepático, neurológico ou psiquiátrico
Inexplicável e persistente elevação das aminotransferases hepáticas
Irmão, pai ou primo com doença de Wilson
Hepatite fulminante
Se houver suspeita de doença de Wilson, é feito um exame com a lâmpada de fenda para ver os anéis de Kayser-Fleischer e são dosados os níveis séricos de ceruloplasmina e a excreção urinária de cobre em 24 horas. Níveis séricos de cobre podem ser dosados, mas os níveis de ceruloplasmina costumam ser suficientes. Os níveis de aminotransferases são frequentemente medidos; níveis altos são compatíveis com o diagnóstico.
Anéis de Kayser-Fleischer
Esse anéis associados a anormalidades neurológicas motoras típicas ou diminuição de ceruloplasmina são praticamente patognomônicos para a doença de Wilson. Raramente ocorrem em outros distúrbios hepáticos (p. ex., atresia biliar, cirrose biliar primária), mas os níveis de ceruloplasmina não devem ser afetados.
Ceruloplasmina
O nível sérico de ceruloplasmina (normalmente 20 a 35 mg/dL [200 a 350 mg/L]) costuma ser baixo na doença de Wilson, mas pode ser normal. Pode também ser baixo em portadores heterozigotos e aqueles com distúrbios hepáticos (p. ex., hepatite viral, doença hepática induzida por drogas ou álcool). Baixo nível de ceruloplasmina em pacientes com anel de Kayser-Fleischer é diagnóstico. Além disso, nível de < 5 mg/dL (< 50 mg/L) é altamente sugestivo, independentemente dos achados clínicos.
Cobre sérico
Algumas vezes os níveis séricos de cobre são dosados; entretanto, podem estar baixos, normais ou altos.
Excreção de cobre urinária
Na doença de Wilson, a excreção urinária de 24 horas de cobre (normalmente ≤ 30 mcg/dia) costuma ser > 100 mcg/dia. Se a ceruloplasmina for baixa e a excreção urinária de cobre for alta, o diagnóstico está claro. Se os níveis estiverem equivocados, medir a excreção urinária de cobre após a aplicação de penicilamina (teste de provocação de penicilamina) pode confirmar o diagnóstico; este teste não costuma ser feito em adultos porque os valores de corte não são bem estabelecidos.
Biópsia hepática
Em casos não esclarecidos (p. ex., aminotransferases altas, ausência de anéis de Kayser-Fleischer, valores não determinados de ceruloplasmina e cobre urinário), o diagnóstico pode ser feito por biópsia hepática para medir a concentração de cobre hepático. No entanto, resultados falso-negativos podem ocorrer em razão de erro na amostra (decorrente das grandes variações nas concentrações de cobre no fígado) ou de hepatite fulminante (causando necrose que libera grandes quantidades de cobre).
Rastreamento da doença de Wilson
Como o tratamento precoce é mais eficaz, indica-se rastreamento para qualquer pessoa que tem irmãos, primos ou pais com doença de Wilson. O rastreamento consiste em exame com a lâmpada de fenda e medida dos níveis de aminotransferase, cobre e ceruloplasmina séricos e excreção de 24 horas de cobre. Se qualquer dos resultados estiver anormal, realiza-se biópsia hepática para mensurar a concentração de cobre hepático.
Lactentes não devem ser examinados até completarem 1 ano de idade porque os níveis de ceruloplasmina são baixos durante os primeiros meses de vida. Crianças < 6 anos com resultados normais devem ser reavaliadas 5 a 10 anos mais tarde.
Triagem genética está sob investigação.
Tratamento da doença de Wilson
Penicilamina ou trientina
Dieta pobre em cobre
Para manutenção, terapia por toda a vida com baixa dose de penicilamina ou trientina, ou zinco oral
Tratamento contínuo, por toda a vida, da doença de Wilson é imperativo, independentemente da presença ou não de sintomas. Uma dieta pobre em cobre (p. ex., evitar bife de fígado, caju, feijão fradinho, suco de verduras, mariscos, cogumelos e cacau) e uso de penicilamina e trientina e às vezes zinco oral podem evitar o acúmulo de cobre. O teor de cobre na água potável deve ser verificado, e as pessoas devem ser aconselhadas a não tomar nenhum suplemento vitamínico ou mineral que contém cobre.
A penicilamina é a opção de fármaco quelante mais comum, mas tem sido considerada tóxica (p. ex., febre, exantema, neutropenia, trombocitopenia, proteinúria). Pode ocorrer reatividade cruzada em pessoas com alergia a penicilina. Aplicam-se 25 mg de piridoxina, por via oral uma vez ao dia, com a penicilamina. Às vezes, o uso de penicilamina pode causar agravamento dos sintomas neurológicos.
Adultos recebem 750 a 1.500 mg de penicilamina em quatro doses divididas. Uma dose que produz excreção urinária de cobre de 24 horas > 2 mg/dia deve ser administrada por 3 meses. Posteriormente, ajustes da dose podem ser feitos com base na excreção urinária de cobre e nos níveis séricos livres de cobre. Uma dose de manutenção apropriada deve levar a níveis séricos de cobre livre < 10 mcg/dL. A penicilamina deve ser administrada 1 hora antes ou 2 horas após as refeições porque os alimentos inibem sua absorção.
Para crianças, a dose de manutenção habitual é 20 mg/kg/dia, arredondada para os 250 mg mais próximos e administrada em duas ou três doses divididas; a dose máxima é 1.000 mg/dia; os ajustes da dose baseiam-se na excreção urinária de cobre em 24 horas e nos níveis séricos de cobre livre semelhantes aos recomendados para adultos.
O cloridrato de trientina, também é um quelante, sendo um tratamento alternativo à penicilamina. Utilizam-se as doses de 375 a 750 mg por via oral duas vezes ao dia ou 250 a 500 mg por via oral 3 vezes ao dia (750 a 1.500 mg/dia).
Doses de 50 mg de acetato de zinco por via oral 3 vezes ao dia podem reduzir a absorção intestinal de cobre, prevenindo assim o reacúmulo de cobre em pacientes que não toleram penicilamina ou trientina, ou que apresentam sintomas neurológicos não responsivos a outros fármacos. (ATENÇÃO: penicilamina e trientina não devem ser administradas no mesmo momento em que o zinco é administrado porque esses fármacos podem ligar-se ao zinco, formando um composto sem efeito terapêutico.)
A má adesão ao tratamento medicamentoso, a longo prazo, é comum. Depois de 1 a 5 anos de terapia, doses de manutenção mais baixas podem ser consideradas. Aconselha-se o acompanhamento regular com especialista em doença hepática.
O transplante de fígado pode salvar a vida dos pacientes com doença de Wilson que apresentam insuficiência hepática fulminante ou grave não responsiva ao tratamento medicamentoso.
Prognóstico para doença de Wilson
O prognóstico para pacientes com doença de Wilson costuma ser bom, a menos que a doença esteja avançada antes do início do tratamento.
Doença de Wilson não tratada é fatal, normalmente por volta dos 30 anos.
Pontos-chave
A doença de Wilson é uma doença autossômica recessiva rara em que o cobre se acumula em vários órgãos.
A doença manifesta-se durante a infância ou na idade adulta, normalmente dos 5 aos 35 anos.
Deve-se suspeitar da doença em pessoas com história familiar da doença ou anomalias hepáticas, neurológicas ou psiquiátricas inexplicáveis (incluindo níveis de aminotransferases elevados).
Confirmar o diagnóstico primeiramente com um exame com a lâmpada de fenda (para anéis de Kayser-Fleischer) e medir a ceruloplasmina sérica (que é baixa) e excreção urinária de cobre (que é alta) de 24 horas.
Aconselhar os pacientes a seguir uma dieta baixa em cobre, e tratá-los com penicilamina, trientina, ou, se esses fármacos são intoleráveis ou ineficazes, zinco oral.