A síndrome de Budd-Chiari é a obstrução de efluxo hepático venoso que se origina em qualquer lugar desde os pequenos ramos da veia hepática dentro do fígado até a veia cava inferior e o átrio direito. Suas manifestações variam entre ausência de sintomas e hepatite fulminante. Se houver suspeita, o exame inicial é a ultrassonografia com Doppler. O tratamento é feito com medidas de suporte e medidas para estabelecer e manter a veia pérvia, como trombólise, descompressão com derivações e anticoagulação prolongada.
(Ver também Visão geral dos distúrbios vasculares do fígado.)
Etiologia da síndrome de Budd-Chiari
No mundo ocidental, a causa mais comum é um coágulo que obstrui a junção entre a veia hepática e a veia cava inferior. Coágulos geralmente resultam das seguintes causas:
Condições trombóticas (p. ex., deficiência de proteína C ou S, síndrome antifosfolipídica, deficiência de antitrombina III, mutação do fator V de Leiden, gestação, uso de contraceptivos orais)
Doenças hematológicas (p. ex., doenças mieloproliferativas como policitemia e hemoglobinopatia paroxística noturna)
Doenças reumáticas sistêmicas (p. ex., doença de Behçet)
Trauma
Infecções (p. ex., cisto hidático, amebíase)
Invasão tumoral da veia hepática (p. ex., carcinoma hepatocelular ou carcinoma de células renais)
Síndrome de Budd-Chiari algumas vezes inicia-se durante a gestação e desmascara um distúrbio de hipercoagulabilidade previamente assintomático.
A causa da obstrução é geralmente desconhecida. Na Ásia e na África do Sul, o defeito básico é geralmente uma obstrução membranosa (teias) na veia cava inferior acima do fígado, representando provavelmente a recanalização de um trombo prévio em adultos ou a falha no desenvolvimento (p. ex., estenose venosa) em crianças. Esse tipo de obstrução é chamada de hepatocavopatia obliterativa.
Síndrome de Budd-Chiari geralmente desenvolve-se em semanas ou meses. Quando se desenvolve ao longo de um período de tempo, cirrose e hipertensão portal tendem a se desenvolver (1).
Referência sobre etiologia
1. Northup PG, Garcia-Pagan JC, Garcia-Tsao G, et al: Vascular Liver Disorders, Portal Vein Thrombosis, and Procedural Bleeding in Patients With Liver Disease: 2020 Practice Guidance by the American Association for the Study of Liver Diseases. Hepatology 73(1):366-413, 2021. doi: 10.1002/hep.31646
Sinais e sintomas da síndrome de Budd-Chiari
Manifestações variam de nenhuma (assintomático) até falência hepática fulminante ou cirrose. Sintomas dependem de a obstrução ter ocorrido de forma aguda ou crônica.
Obstrução aguda causa fadiga, dor no hipocôndrio direito, náuseas, vômitos, icterícia, hepatomegalia dolorosa e ascite. Acontece tipicamente em gestantes. Falência hepática fulminante com encefalopatia é rara. Níveis de aminotransferases são bastante elevados.
Obstrução crônica do fluxo de saída (desenvolvendo-se em meses) pode causar alguns ou nenhum sintoma até que ela progride, ou causar fadiga, dor abdominal e hepatomegalia. Edema de membros inferiores e ascite podem ser resultado de obstrução venosa, mesmo na ausência de cirrose. Cirrose pode se desenvolver e também manifestações de hipertensão portal, incluindo sangramento varicoso, ascite maciça, esplenomegalia, síndrome hepatopulmonar ou uma combinação destes. Obstrução completa da veia cava inferior causa edema de parede abdominal e membros inferiores, além da visualização de veias tortuosas superficiais abdominais desde a pelve até a margem costal.
Diagnóstico da síndrome de Budd-Chiari
Avaliação clínica e testes hepáticos
Imagem vascular
Suspeita-se da síndrome de Budd-Chiari em pacientes com hepatomegalia, ascite, falência hepática ou cirrose sem causa aparente (p. ex., abuso de álcool, hepatites) ou quando a causa é inexplicável.
Os testes de função hepática geralmente são anormais; o padrão é variável e inespecífico. A presença de fatores de risco de a trombose aumentam a consideração desse diagnóstico.
Imagens geralmente começam com ultrassonografia abdominal com Doppler, que pode mostrar a direção do fluxo sanguíneo e o local de obstrução. Angiografia por ressonância magnética e tomografia são úteis se a ultrassonografia não for diagnóstica. Angiografia convencional (venografia com medida de pressão e arteriografia) é necessária se intervenções terapêuticas ou cirúrgicas forem planejadas.
Biópsia hepática é realizada ocasionalmente para o diagnóstico de estágios agudos e determina se a cirrose se desenvolveu.
Tratamento da síndrome de Budd-Chiari
Cuidados de suporte
Restauração e manutenção de adequada drenagem venosa
O tratamento varia de acordo com o aparecimento (agudo ou crônico) e gravidade (insuficiência hepática fulminante versus cirrose descompensada ou estável/assintomática). Os pilares do manejo são
Dar terapia de suporte direcionada para as complicações (p. ex., ascite, falência hepática, varizes esofágicas)
Descompressão da congestão hepática (isto é, manutenção do fluxo venoso)
Prevenção da propagação do coágulo
Intervenções agressivas (p. ex., trombólise, implante de stent) são utilizadas quando a doença é aguda (p. ex., até 4 semanas e sem cirrose). Trombólise pode dissolver coágulos agudos, permitindo a recanalização e aliviando assim a congestão hepática. Procedimentos radiológicos, como angioplastia, stents e/ou derivações portossistêmicos, podem desempenhar um papel importante.
Para teias ou estenose de veia hepática, descompressão por angioplastia por balão percutânea com stent transluminal pode manter a drenagem hepática. Quando a dilatação do estreitamento do fluxo hepático é tecnicamente impossível, derivação portossistêmica intra-hepática transjugular (TIPS, na sigla em inglês) e derivações cirúrgicas podem promover descompressão por derivação do fluxo sanguíneo para a circulação sistêmica (1). Derivações portossistêmicas geralmente não são utilizadas se encefalopatia hepática está presente; essas derivações podem piorar a função hepática. Além disso, coágulos se formam nas derivações, especialmente se os pacientes têm doenças hematológicas ou trombóticas.
Anticoagulação por longo período é geralmente necessária para prevenção de recorrência. Transplante de fígado pode preservar a vida de pacientes com doença fulminante ou cirróticos descompensados.
Referência sobre o tratamento
1. Northup PG, Garcia-Pagan JC, Garcia-Tsao G, et al: Vascular Liver Disorders, Portal Vein Thrombosis, and Procedural Bleeding in Patients With Liver Disease: 2020 Practice Guidance by the American Association for the Study of Liver Diseases. Hepatology 73(1):366-413, 2021. doi: 10.1002/hep.31646
Prognóstico da síndrome de Budd-Chiari
Sem tratamento, a maioria dos pacientes com obstrução venosa completa morre de insuficiência hepática em 3 a 5 anos. Em pacientes com obstrução incompleta, o curso varia.
Pontos-chave
A causa mais comum da síndrome de Budd-Chiari (obstrução do fluxo venoso hepático) é um coágulo que bloqueia as veias hepáticas e veia cava inferior.
Considerar o diagnóstico se os pacientes têm resultados típicos (p. ex., hepatomegalia, ascite, insuficiência hepática, cirrose) que são inexplicáveis ou se eles têm resultados dos testes hepáticos anormais e fatores de risco de trombose.
Confirmar o diagnóstico por ultrassonografia com Doppler ou, se os resultados forem inconclusivos, angiografia com RM ou TC ou venografia.
Restabelecer o fluxo venoso (p. ex., por trombólise, angioplastia ou stents) e tratar as complicações.