Um bloqueio do nervo alveolar inferior, o bloqueio de nervo dental mais comumente utilizado, anestesia a hemi-mandíbula ipsilateral (incluindo dentes e ossos), bem como a mucosa lateral (bucal) sobre os incisivos, canino e primeiro pré-molar inferiores e, cutaneamente, o lábio inferior e queixo ipsilateral.
Em geral, o nervo lingual adjacente é bloqueado incidentalmente, anestesiando o assoalho ipsilateral da boca, a gengiva medial (lingual) e os dois terços anteriores da língua.
Frequentemente, realiza-se bloqueio bucal (do nervo bucal longo) como parte do procedimento de bloqueio do nervo alveolar inferior, se é necessária anestesia da gengiva lateral (bucal) e da mucosa dos molares inferiores e do segundo pré-molar.
Indicações
Uma doença mandibular dolorosa ou seu tratamento, como
Fratura (do osso mandibular, crista alveolar, dentes)
Abscesso dentário (somente se o abscesso estiver distante do local de bloqueio nervoso)
Laceração (mucosa, lábio inferior, pele do queixo)*
* Bloqueio do nervo pode ser preferível à infiltração anestésica local quando a aproximação precisa das bordas da ferida é importante (p. ex., reparo de pele ou lábio), porque um bloqueio do nervo não distorce o tecido como a infiltração local o faz.
Contraindicações
Contraindicações absolutas
Alergia a um agente anestésico ou veículo de entrega (em geral, é possível escolher um anestésico diferente)
Ausência dos marcos anatômicos necessários para orientar a inserção da agulha (p. ex., decorrente de trauma)
Contraindicações relativas
Infecção na via de inserção da agulha: utilizar procedimento de sedação ou outra anestesia.
Coagulopatia*: quando viável, corrigir antes do procedimento.
Gestação: evitar o tratamento no 1º trimestre se for possível esperar.
* Anticoagulação terapêutica (p. ex., para embolia pulmonar) aumenta o risco de sangramento com bloqueios nervosos, mas isso deve ser ponderado em relação ao maior risco de trombose (p. ex., acidente vascular encefálico) se a anticoagulação é revertida. Discutir qualquer reversão prevista com o médico responsável pela anticoagulação do paciente e então com o paciente.
Complicações
Reação alérgica ao anestésico
Toxicidade decorrente de superdosagem de anestésico (p. ex., convulsões, arritmias cardíacas)
Injeção intravascular de anestésico/adrenalina
Hematoma
Neuropatia
Disseminação da infecção, passando a agulha por uma área infectada
Anestesia de ramos do nervo facial (nervo craniano VII) decorrente da inserção excessivamente posterior da agulha
Falha na anestesia
Quebra da agulha e perda da agulha nos tecidos moles
A maioria das complicações resulta de inserção imprecisa da agulha.
Equipamento
Cadeira odontológica, cadeira reta com apoio de cabeça ou maca
Fonte de luz para iluminação intraoral
Luvas não estéreis
Máscara e óculos de segurança ou protetor facial
Compressas de gaze
Swabs estéreis
Espelho dental ou abaixador de língua
Sucção
Equipamento para fazer anestesia local:
Pomada para anestesia tópica* (p. ex., lidocaína a 5%, benzocaína a 20%)
Anestésico local injetável, como lidocaína a 2% com adrenalina † 1:100.000 ou, para anestesia de duração mais longa, bupivacaína a 0,5% com adrenalina† 1:200.000
Seringa de aspiração dentária (com corpo estreito e cartuchos de anestesia injetáveis personalizados) ou outra seringa de corpo estreito (p. ex., 3 mL) com eixo de travamento
Agulha de calibre 25 ou 27: 3 cm de comprimento para bloqueios de nervo
* ATENÇÃO: todas as preparações anestésicas tópicas são absorvidas das superfícies mucosas e pode ocorrer toxicidade quando os limites de dose são excedidos. Pomadas são mais fáceis de controlar do que líquidos e géis tópicos menos concentrados. Raramente, a benzocaína em excesso pode causar metemoglobinemia.
† Dose máxima dos anestésicos locais: lidocaína sem adrenalina, 5 mg/kg; lidocaína com adrenalina, 7 mg/kg; bupivacaína, 1,5 mg/kg. NOTA: solução a 1% (de qualquer substância) representa 10 mg/mL (1 g/100 mL). A adrenalina causa vasoconstrição, que prolonga o efeito anestésico; isso é útil em tecidos bem vascularizados como a mucosa oral. Pacientes com doença cardíaca devem receber somente quantidades limitadas de adrenalina (máximo de 3,5 mL de solução contendo adrenalina a 1:100.000); alternativamente, utilizar anestésico local sem adrenalina.
Considerações adicionais
Documentar quaisquer deficits de nervo preexistentes antes de fazer um bloqueio nervoso.
Sedação pode ser necessária para pacientes que não conseguem cooperar com o procedimento.
O bloqueio do nervo pode falhar se o anestésico não é aplicado suficientemente próximo do nervo.
Utilizar uma agulha nova a cada tentativa (a agulha anterior pode ter sido bloqueada por tecido ou sangue, o que obscureceria a inserção intravascular inadvertida).
Interromper o procedimento de bloqueio do nervo e utilizar um método diferente de anestesia se não tiver certeza de onde está a agulha ou se o paciente não cooperar.
Anatomia relevante
O nervo alveolar inferior é um ramo do nervo mandibular, que é o 3º ramo do nervo trigêmeo.
O nervo alveolar inferior encontra-se inferior e anteriormente ao aspecto medial do ramo mandibular. O nervo, acompanhado pela artéria e veia alveolar inferior, entra no forame mandibular próximo ao ponto médio do ramo mandibular. A partir desse ponto, o nervo percorre e inerva o corpo da mandíbula; um ramo terminal, o nervo mentual, ressurge através do forame mentual na região pré-molar para inervar o lábio inferior e o queixo, bem como a mucosa/gengiva lateral que recobre os dentes incisivos, canino e primeiro pré-molar inferiores. Após essa ramificação, o nervo alveolar inferior continua anteriormente como o nervo incisivo, inervando os dentes remanescentes e o osso anterior ao forame mentual até a linha média.
A língula é a protuberância óssea na margem anterior do forame mandibular.
A incisura da mandíbula é a concavidade da borda anterior do ramo da mandíbula, localizada posteriormente aos molares.
O triângulo pterigomandibular é um espaço adiposo delimitado lateralmente pela incisura coronoide, e medialmente pela rafe pterigomandibular.
A rafe pterigomandibular é uma fina faixa vertical (uma linha tendínea visível onde o bucinador e os músculos constritores superiores da faringe se ligam) que delimita medialmente o triângulo pterigomandibular.
Insere-se a agulha posterolateralmente no triângulo pterigomandibular, paralelo ao e cerca de 1 cm acima do plano oclusal mandibular. A agulha encontrará resistência à medida que atravessa o músculo e tecido conjuntivo.
De maneira ideal, administra-se o anestésico superior e posteriormente adjacente à língula (isto é, um pouco acima do forame mandibular).
O nervo lingual (também um ramo do nervo mandibular) passa próximo da zona de injeção e é tipicamente anestesiado incidentalmente ao realizar bloqueio do nervo alveolar inferior.
Posicionamento
Posicionar o paciente levemente inclinado (posição sentada semi-reclinada), com o occipúcio apoiado e a boca bem aberta, de modo que o local da injeção (lado medial do ramo) permaneça acessível.
Operadores destros devem permanecer à direita do paciente e os sinistros à esquerda.
Descrição passo a passo do procedimento
Preparação
Utilizar luvas não estéreis, máscara e óculos de segurança ou protetor facial.
Utilizar gaze para secar completamente o triângulo pterigomandibular. Utilizar sucção para manter a área seca.
Aplicar uma pequena quantidade de anestésico tópico com aplicadores com ponta de algodão e esperar 2 a 3 minutos para que a anestesia tenha efeito.
Injetar o anestésico local
Instruir o paciente a abrir bem e confortavelmente a boca.
Colocar a ponta do polegar ou dedo indicador na incisura da mandíbula para ajudar a visualizar a altura vertical em que a agulha entrará, e retrair a bochecha para expor o triângulo pterigomandibular.
Colocar e manter o corpo da seringa sobre o 1º e 2º pré-molares inferiores contralaterais.
Manter a agulha paralela — e cerca de 1 cm acima — ao plano oclusal mandibular, no plano vertical da incisura mandibular.
Para estabelecer o ângulo de aproximação e o ponto de entrada corretos, colocar o lado da ponta da agulha contra a borda lateral da rafe pterigomandibular, de tal modo que a ponta agora seja direcionada ao triângulo pterigomandibular, com o bisel voltado para o ramo. Manter esse ângulo de inserção à medida que avança a agulha.
Avançar levemente a ponta da agulha na mucosa. Aspirar, para excluir inserção intravascular, e injetar algumas gotas do anestésico para aliviar a dor causada pela inserção da própria agulha. Repetir essas pequenas injeções após avanços incrementais ligeiramente < 1 cm.
Se o paciente tem parestesia súbita e aguda, tranquilizá-lo de que a agulha está no local correto. Retirar levemente e então redirecionar a agulha pode aliviar essa sensação, mas manter o direcionamento ao ramo medial e ao forame mandibular.
Avançar a agulha até alcançar o ramo (tipicamente depois de inserir cerca de 2 a 2,5 cm) e remover a agulha a 1 mm do osso.
Se a agulha não alcançar o osso mandibular, ela pode estar muito posterior (p. ex., na parótida). Retirar a agulha e redirecioná-la (de modo mais anterior/lateral).
Depois de chegar ao ramo, retirar a agulha afastando-a 1 mm do osso.
Aspirar, para excluir inserção intravascular.
Se a aspiração revelar inserção intravascular, remover a agulha 2 a 3 mm e aspirar novamente antes da injeção.
Injetar lentamente cerca de 2 a 4 mL de anestésico, mas manter cerca de 0,5 mL na seringa para bloquear o nervo bucal.
Bloqueio do nervo bucal
Remover a seringa e reinseri-la um pouco anterior e lateralmente à borda anterior do ramo no nível da superfície oclusal do molar mais posterior. Avançar a agulha posteriormente cerca de 3 a 5 mm. Aspirar, para excluir inserção intravascular, e injetar cerca de 0,25 mL de anestésico.
Massagear os locais de injeção para acelerar o início da anestesia.
Cuidados posteriores
Pedir que o paciente descanse, com a boca relaxada, enquanto espera o início da anestesia (5 a 10 minutos).
Alertas e erros comuns
Para minimizar o risco de quebrar a agulha, não curvá-la antes da inserção, não inserir a agulha em sua profundidade total (isto é, até o canhão) e instruir o paciente a permanecer imóvel, com a boca bem aberta e não deixar que ele segure sua mão.
Pode-se utilizar articaína a 4% com adrenalina 1:100.000 para infiltração supraperiosteal, mas isso não é recomendado para procedimentos de bloqueio nervoso, devido ao risco relatado de parestesia prolongada do nervo lingual.
Dicas e truques
Técnicas de distração (p. ex., conversar com o paciente ou fazer com que ele segure a mão de outra pessoa) podem ajudar a reduzir a ansiedade do paciente.
Injetar a solução anestésica local lentamente (30 a 60 segundos) para reduzir a dor da injeção.