- Visão geral das anomalias musculoesqueléticas congênitas
- Anormalidades musculares congênitas
- Artrogripose múltipla congênita
- Anormalidades congênitas do pescoço e dorso
- Anormalidades congênitas dos membros
- Displasia do desenvolvimento do quadril
- Torção femoral (rotação)
- Joelho varo (pernas arqueadas) e joelho valgo (joelhos que se tocam)
- Luxação congênita do joelho
- Torção da tíbia
- Talipes equinovarus (pé torto) e outras anormalidades congênitas dos pés
Artrogripose múltipla congênita refere-se a um grupo de doenças congênitas raras caracterizadas por múltiplas contraturas articulares presentes ao nascimento. Essas doenças resultam da limitação do movimento articular no útero. A inteligência pode estar normal ou prejudicada, dependendo da etiologia subjacente. O diagnóstico é clínico. O tratamento inclui manipulação das articulações, colocação de gesso e às vezes cirurgia.
Recursos do assunto
(Ver também Visão geral das anomalias musculoesqueléticas congênitas.)
A artrogripose não é um diagnóstico específico, mas um achado clínico de contraturas congênitas; estas podem estar presentes em > 300 doenças diferentes. A prevalência foi de 8,5/100.000 nascidos vivos e a mortalidade perinatal foi de 32,5% em um estudo com um banco de dados multinacional (1). Com base nesse alto risco de resultados adversos, o estabelecimento de um diagnóstico específico é importante para prognóstico e aconselhamento genético.
Há 2 tipos principais de artrogripose múltipla congênita (AMC), que representam ≥ 50% dos pacientes (2):
Amioplasia (artrogripose clássica): contraturas simétricas múltiplas ocorrem nos membros. Os músculos afetados são hipoplásticos e têm degeneração fibrosa e gordurosa. Em geral, a inteligência é normal. Cerca de 10% dos pacientes apresentam anormalidades abdominais (p. ex., gastrosquise, atresia intestinal) decorrente da falta de formação muscular. Praticamente todos os casos são esporádicos.
Artrogripose distal: as mãos e os pés estão envolvidos, mas as grandes articulações são normalmente poupadas. Artrogriposes distais são um grupo heterogêneo de doenças, muitas das quais estão associadas a um defeito em um gene específico em um dos diversos genes que codificam componentes do aparelho contrátil. Muitas artrogriposes distais são transmitidas como doenças autossômicas dominantes, mas mutações ligadas ao X também são conhecidas.
Em um estudo com 125 pessoas afetadas, 43% tinham amioplasia, 27% tinham artrogripose distal e 30% tinham outras formas (3).
Referências gerais
1. Hoff JM, Loane M, Gilhus NE, Rasmussen S, Daltveit AK. Arthrogryposis multiplexa congenita: an epidemiologic study of nearly 9 million births in 24 EUROCAT registers. Eur J Obstet Gynecol Reprod Biol. 2011;159(2):347-350. doi:10.1016/j.ejogrb.2011.09.027
2. Hall JG, Kimber E, van Bosse HJP. Genetics and Classifications. J Pediatr Orthop. 2017;37 Suppl 1:S4-S8. doi:10.1097/BPO.0000000000000997
3. Le Tanno P, Latypova X, Rendu J, et al. Diagnostic workup in children with arthrogryposis: Description of practices from a single reference centre, comparison with literature and suggestion of recommendations. J Med Genet. 2023;60(1):13-24. doi:10.1136/jmedgenet-2021-107823
Etiologia da artrogripose múltipla congênita
Muitos processos patológicos que causam imobilização dos membros do feto durante ou logo após a formação embrionária das articulações podem resultar em AMC. A artrogripose múltipla congênita ocorre quando a função e o desenvolvimento neuromusculares do embrião-feto são comprometidos.
Qualquer situação que prejudique a movimentação intraútero por > 3 semanas pode resultar em artrogripose múltipla congênita. As causas podem envolver
Limitação física do movimento (p. ex., decorrente de malformações uterinas, gestações múltiplas, oligoidrâmnio) que causa a síndrome de aquinesia/hipoquinesia fetal (síndrome de Pena-Shokeir), frequentemente associada à hipoplasia pulmonar
Doenças maternas (p. ex., esclerose múltipla, vascularidade uterina deficiente)
Doenças genéticas que afetam o feto (p. ex., neuropatias; miopatias, inclusive distrofias musculares; doenças do tecido conjuntivo; vascularidade fetal deficiente; doença das células da coluna anterior)
Mais de 400 genes foram associados à AMC (1).
Referência sobre etiologia
1. Dieterich K, Kimber E, Hall JG. Central nervous system involvement in arthrogryposis multiplex congenita: Overview of causes, diagnosis, and care. Am J Med Genet C Semin Med Genet. 2019;181(3):345-353. doi:10.1002/ajmg.c.31732
Sinais e sintomas da artrogripose múltipla congênita
As deformidades musculoesqueléticas são evidentes ao nascimento. Artrogripose múltipla congênita não é progressiva, mas os agentes que a causam podem ser progressivos (p. ex., distrofia muscular).
As contraturas das articulações afetadas podem ficar em flexão ou extensão. Na manifestações clássicas da artrogripose múltipla congênita, os ombros são quase sempre aduzidos e rodados internamente; os cotovelos em extensão; punhos e dedos fletidos. Pode haver deslocamento dos quadris, que ficam levemente fletidos. Os joelhos ficam em extensão e os pés frequentemente em posição equinovara. Os músculos do membro inferior são, geralmente, hipoplásicos e os membros tendem a se tornarem tubulares e incaracterísticos. Membrana de tecido mole, às vezes, é encontrada sobre a face ventral das articulações fletidas. A coluna pode ser escoliótica. Exceção feita à ossatura delgada, a radiografia do esqueleto é aparentemente normal.
As limitações físicas podem ser graves. Algumas crianças também têm disfunção primária do sistema nervoso central, que pode estar associada à deficiência intelectual (1, 2).
Durante a cirurgia, a entubação endotraqueal pode ser difícil porque a criança tem mandíbula pequena pouco móvel.
Outras anormalidades que raramente acompanham a artrogripose são microcefalia, fenda palatina, criptorquidia e anormalidades cardíacas e do trato urinário; esses resultados levantam a suspeita de defeito cromossômico subjacente ou síndrome genética.
Referência sobre sinais e sintomas
1. Dieterich K, Kimber E, Hall JG. Central nervous system involvement in arthrogryposis multiplex congenita: Overview of causes, diagnosis, and care. Am J Med Genet C Semin Med Genet. 2019;181(3):345-353. doi:10.1002/ajmg.c.31732
2. Dahan-Oliel N, Cachecho S, Barnes D, et al. International multidisciplinary collaboration toward an annotated definition of arthrogryposis multiplex congenita. Am J Med Genet C Semin Med Genet. 2019;181(3):288-299. doi:10.1002/ajmg.c.31721
Diagnóstico da artrogripose múltipla congênita
Ultrassonografia pré-natal
História e exame físico
Exame genético
Eletromiografia e biópsia muscular
A artrogripose múltipla congênita pode ser detectada com ultrassonografia pré-natal (em um estudo, 37% dos casos foram detectados no período pré-natal na ultrassonografia) (1). Achados ultrassonográficos comuns incluem pé torto, mãos cerradas, diminuição do movimento fetal, contraturas do cotovelo e joelho.
Se um recém-nascido tem múltiplas contraturas, a avaliação inicial deve determinar se a condição é uma amioplasia, artrogripose distal ou outra síndrome em que múltiplas contraturas estão associadas a anomalias congênitas não relacionadas e/ou distúrbios metabólicos. Quando disponível, um geneticista clínico deve coordenar a avaliação e o tratamento; normalmente, profissionais de várias especialidades estão envolvidos. Uma forma sindrômica da artrogripose múltipla congênita é suspeita quando atrasos no desenvolvimento e/ou outras anomalias congênitas estão presentes, e deve-se avaliar nesses pacientes doenças do sistema nervoso central e monitorá-los para sintomas neurológicos progressivos.
A avaliação também deve incluir pesquisas detalhadas de anomalias físicas, cromossômicas e genéticas associadas. Distúrbios específicos que devem procurados incluem a síndrome de Freeman-Sheldon, síndrome de Holt-Oram, síndrome de Larsen, síndrome de Miller, síndrome de pterígio múltiplo e síndrome de DiGeorge (síndrome de deleção 22q11). Os testes podem incluir análise cromossômica por microarranjo ou testes genéticos específicos que são feitos individualmente ou como um painel padrão (2).
Combinar a avaliação clínica com um painel genético específico para artrogripose múltipla congênita utilizando tecnologia de sequenciamento de última geração no recém-nascido pode possibilitar um diagnóstico precoce e melhorar os desfechos de saúde. Essas abordagens podem estabelecer uma etiologia definitiva em 66% dos casos (3).
O sequenciamento total do exoma deve ser considerado quando outros testes não fornecem um diagnóstico definitivo, especialmente em casos familiares (4).
A eletromiografia e a biópsia de músculo são úteis para diagnosticar neuropatias e miopatias. Na artrogripose múltipla congênita clássica, a biópsia de músculo normalmente revela amioplasia, com deposição de tecidos de gordura e fibrosos.
Referências sobre diagnóstico
1. Lemin S, van Bosse HJP, Hutka L, Soberdash S, Patibandla J. Prenatal diagnosis (or lack thereof) of arthrogryposis multiplex congenita and its impact on the perinatal experience of parents: A retrospective survey. Prenat Diagn. 2024;44(5):614-622. doi:10.1002/pd.6569
2. Todd EJ, Yau KS, Ong R, et al. Next generation sequencing in a large cohort of patients presenting with neuromuscular disease before or at birth. Orphanet J Rare Dis. 2015:10:148. doi:10.1186/s13023-015-0364-0
3. Pollazzon M, Caraffi SG, Faccioli S, et al. Clinical and genetic findings in a series of eight families with arthrogryposis. Genes (Basel). 2022;13(1):29. doi:10.3390/genes13010029
4. Hunter JM, Ahearn ME, Balak CD, et al. Novel pathogenic variants and genes for myopathies identified by whole exome sequencing. Mol Genet Genomic Med. 2015;3(4):283–301. doi:10.1002/mgg3.142
Tratamento da artrogripose múltipla congênita
Manipulação e gesso nas articulações
Algumas vezes, cirurgia
Indicam-se avaliação ortopédica precoce e fisioterapia. Manipulação articular e gesso, durante os primeiros meses de vida, podem dar resultados consideravelmente bons. Aparelhos ortopédicos podem ajudar.
Com o tempo, a cirurgia pode ser necessária para alinhar o ângulo da ancilose, porém sem grande melhora para a mobilidade. A transferência muscular pode melhorar a função (p. ex., movimentar cirurgicamente o tríceps de tal forma que ele possa fletir o cotovelo).
Muitas crianças se recuperam muito bem; dois terços delas são capazes de andar após o tratamento (1).
Referência sobre tratamento
1. Hansen-Jaumard D, Elfassy C, Montpetit K, Ghalimah B, Hamdy R, Dahan-Oliel N. A review of the orthopedic interventions and functional outcomes among a cohort of 114 children with arthrogryposis multiplex congenita. J Pediatr Rehabil Med. 2020;13(3):263-271. doi:10.3233/PRM-190657