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Poliomielite

(Paralisia infantil, poliomielite anterior aguda; pólio)

PorKevin Messacar, MD, PhD, University of Colorado Department of Pediatrics, Section of Infectious Diseases
Revisado/Corrigido: set. 2024
Visão Educação para o paciente

A poliomielite por poliovírus é uma infecção neurológica aguda que leva à paralisia flácida aguda causada pelo poliovírus (um enterovírus). As manifestações da infecção por poliovírus incluem doença leve inespecífica, às vezes meningite asséptica sem paralisia e, menos frequentemente, fraqueza flácida de vários grupos musculares (poliomielite paralítica). O diagnóstico da paralisia flácida aguda é clínico, embora o diagnóstico laboratorial seja necessário para confirmar poliovírus, um enterovírus não polio ou outro vírus como a causa da doença. O tratamento é de suporte.

Os poliovírus possuem 3 sorotipos. O tipo 1 é o mais paralitogênico e a causa mais comum de epidemias.

Seres humanos são os únicos hospedeiros naturais. A infecção é altamente transmissível por via fecal-oral ou, menos comumente, respiratória. Infecções assintomáticas e menores são mais comuns do que meningite asséptica ou poliomielite paralítica (< 1%) e são a principal fonte de disseminação. (Ver também Visão geral das infecções por enterovírus.)

Vacinação extensa quase erradicou a doença decorrente do poliovírus do tipo selvagem em todo o mundo. Dois dos três poliovírus do tipo selvagem (tipos 2 e 3) foram erradicados. Esforços para erradicar o poliovírus tipo 1 estão em andamento, uma vez que permanece endêmico no Paquistão e no Afeganistão, e ocorreram casos no Malawi e em Moçambique em 2023. Por outro lado, poliovírus derivado de vacina em circulação, principalmente VOP Sabin tipo 2, foi relatado em outros 31 países, incluindo Estados Unidos, Reino Unido e Israel. (Ver também the Polio Eradication Initiative.)

Nos Estados Unidos, um caso de poliomielite paralítica derivada de vacina foi identificado em uma pessoa não vacinada que a adquiriu no estado de Nova York (NY) em julho de 2022 (1). A vigilância de águas residuais detectou o vírus em amostras em vários condados de Nova York, indicando transmissão local, mas nenhum caso adicional foi identificado após esse surto (2; ver também New York State Department of Health: Wastewater Surveillance). O último caso de poliovírus do tipo selvagem adquirido nos Estados Unidos foi em 1979.

Referências

  1. 1. Link-Gelles R, Lutterloh E, Schnabel Ruppert P, et al: Public Health Response to a Case of Paralytic Poliomyelitis in an Unvaccinated Person and Detection of Poliovirus in Wastewater - New York, June-August 2022. MMWR Morb Mortal Wkly Rep 71(33):1065-1068, 2022. Publicado em 19 de agosto de 2022. doi:10.15585/mmwr.mm7133e2

  2. 2. Ryerson AB, Lang D, Alazawi MA, et al: Wastewater Testing and Detection of Poliovirus Type 2 Genetically Linked to Virus Isolated from a Paralytic Polio Case - New York, March 9-October 11, 2022. MMWR Morb Mortal Wkly Rep. 71(44):1418-1424, 2022. Publicado em 4 de novembro de 2022. doi:10.15585/mmwr.mm7144e2

Fisiopatologia da poliomielite

O poliovírus é liberado nas fezes e na saliva e transmitido por via fecal-oral ou respiratória. Em seguida, replica-se na mucosa orofaríngea e do trato gastrointestinal inferior e penetra nos linfonodos cervicais e mesentéricos. Segue-se uma viremia primária (menor) com disseminação do vírus pelo sistema reticuloendotelial. A infecção pode ser contida nesse ponto ou o vírus pode se multiplicar ainda mais, provocando vários dias de viremia secundária, culminando no desenvolvimento de sintomas e de anticorpos.

Nas infecções paralíticas, os poliovírus entram no sistema nervoso central — por viremia secundária ou migração retrógrada pelos nervos periféricos. Danos significativos ocorrem na medula espinhal e no tronco encefálico, especialmente nas áreas que controlam a função motora e autônoma. A inflamação é composta de danos produzidos por invasão viral primária. Fatores que predispõem à lesão neurológica grave incluem

  • Idade avançada

  • Tonsilectomia recente ou injeção intramuscular

  • Gestação

  • Imunodeficiência humoral

  • Esforço físico simultâneo ao início da fase no sistema nervoso central

Os poliovírus estão presentes na garganta e nas fezes durante o período de incubação e, após o início dos sintomas, persistem por 1 a 2 semanas na garganta e ≥ de 3 a 6 semanas nas fezes.

Dicas e conselhos

  • A maioria das infecções pelo vírus da poliomielite não compromete o sistema nervoso central, nem causa paralisia.

Sinais e sintomas da poliomielite

A maioria (70 a 75%) das infecções por poliovírus não causa sintomas (ver Centers for Disease Control and Prevention: Epidemiology and Prevention of Vaccine-Preventable Diseases, Poliomyelitis). Doença sintomática é classificada como

  • Infecção leve

  • Meningite asséptica por poliovírus sem paralisia

  • Poliomielite paralítica

Infecção menor por poliovírus

A maioria das infecções sintomáticas, em particular em crianças pequenas, é menor, com 1 a 3 dias de febre discreta, mal-estar, cefaleia, dor de garganta e vômitos, que se desenvolvem 3 a 5 dias após a exposição. Não há qualquer sinal ou sintoma neurológico e o exame físico não é relevante, exceto quando houver febre.

Meningite asséptica por poliovírus sem paralisia

Cerca de 1-5% dos pacientes com infecção por poliovírus apresentam comprometimento não paralítico do sistema nervoso central com meningite asséptica (ver Centers for Disease Control and Prevention: Epidemiology and Prevention of Vaccine-Preventable Diseases, Poliomyelitis). Os pacientes costumam apresentar rigidez na nuca e/ou dor lombar e cefaleia que aparecem após vários dias do pródromo semelhante a infecções menores. As manifestações duram de 2 a 10 dias.

Poliomielite paralítica

A poliomielite paralítica ocorre em < 1% de todas as infecções por poliovírus. Pode manifestar-se como doença bifásica em lactentes e crianças pequenas com uma fase paralítica ocorrendo vários dias após a resolução dos sintomas menores. A incubação normalmente é de 7 a 21 dias.

As manifestações comuns da poliomielite paralítica, além de meningite asséptica, são dor muscular profunda, hiperestesia, parestesia e, durante a mielite em atividade, retenção urinária e espasmos musculares. Paralisia flácida e assimétrica pode se desenvolver e evoluir em 2 a 3 dias.

Em geral, disfagia e disfonia são os primeiros sinais de envolvimento bulbar, mas alguns pacientes apresentam paralisia da faringe e não conseguem controlar as secreções orais. Como na paralisia da musculatura esquelética, o comprometimento bulbar pode piorar em 2 a 3 dias e, em alguns pacientes, afetar o centro respiratório e circulatório do tronco cerebral, levando a um comprometimento respiratório. Insuficiência respiratória se desenvolve raramente quando o diafragma ou os músculos intercostais são comprometidos.

Alguns pacientes desenvolvem síndrome pós-poliomielite anos ou décadas depois da poliomelite paralítica. Essa síndrome é caracterizada por fadiga muscular e diminuição da resistência, muitas vezes com fraqueza, miofasciculações e atrofia.

Diagnóstico da poliomielite

  • RM da medula espinal e do cérebro

  • Punção lombar

  • Cultura e testes virais (fezes, garganta e líquido cefalorraquidiano)

  • Testes para outros enterovírus não polio e vírus do Nilo Ocidental

Quando não há manifestações no sistema nervoso central, a poliomielite moderadamente sintomática assemelha-se a outras infecções virais sistêmicas e, geralmente, não é considerada ou diagnosticada, exceto durante uma epidemia.

Meningite asséptica por poliovírus lembra outras meningites virais. Nesses pacientes, normalmente é feita punção lombar; os achados típicos no líquido cefalorraquidiano são glicose normal, proteína ligeiramente elevada e uma contagem celular de 10 a 500/mcL (predominantemente linfócitos). A detecção do vírus em um swab da garganta, fezes ou líquido cefalorraquidiano pode confirmar a infecção pelo poliovírus.

Pode haver suspeita de poliomielite paralítica em crianças não imunizadas ou adultos jovens com paralisia assimétrica dos membros ou paralisias bulbares flácidas sem perda sensorial durante uma doença febril aguda. RM da coluna vertebral e do cérebro pode confirmar mielite da substância cinzenta da coluna vertebral e/ou presença de lesões do tronco cerebral. Entretanto, enterovírus não polio (D68, A71 e outros) e o vírus do Nilo Ocidental podem produzir achados semelhantes. A síndrome de Guillain-Barré causa paralisia flácida, mas pode ser distinguida porque a síndrome de Guillain-Barré geralmente não causa febre, mas causa

  • Fraqueza muscular simétrica

  • Deficits sensoriais em 70% dos pacientes

  • Normalmente, proteína do líquido cefalorraquidiano elevada, mas contagem normal de células do líquido cefalorraquidiano

Dicas epidemiológicas (p. ex., história de imunização, viagens recentes, idade, estação do ano) podem ajudar a levantar suspeitas de infecção por poliovírus. Como a identificação do poliovírus ou outro enterovírus como causa da paralisia flácida aguda é importante por motivos de saúde pública, casos suspeitos devem ser notificados imediatamente ao departamento de saúde local ou estadual para ajudar nos testes diagnósticos. Devem-se coletar swabs nasofaríngeos e orofaríngeos, e amostras de sangue e líquido cefalorraquidiano. Devem-se coletar dois conjuntos de amostras de fezes com intervalo de pelo menos 24 horas para avaliar a presença de poliovírus. Devem-se realizar testes específicos para poliovírus, outros enterovírus e vírus do Nilo Ocidental nessas amostras em conjunto com os departamentos de saúde pública.

Tratamento da poliomielite

  • Cuidados de suporte

O tratamento convencional da poliomelite é de suporte, com repouso e uso de analgésicos e antipiréticos, quando necessário. Não há terapia antiviral específica.

Durante a mielite ativa, precauções para evitar complicações decorrentes da inatividade pelo fato de o paciente permanecer acamado (p. ex., trombose venosa profunda, atelectasia, infecção do trato urinário) e ter imobilidade prolongada (p. ex., contraturas) podem ser necessárias. Insuficiência respiratória pode requerer ventilação mecânica. A ventilação mecânica ou a paralisia bulbar exige terapias respiratórias intensivas.

Prognóstico para infecção por poliovírus

Na meningite asséptica sem paralisia, a recuperação é completa.

Na poliomelite paralítica, aproximadamente dois terços dos pacientes têm fraqueza permanente residual. A paralisia bulbar tem mais probabilidade de resolução do que a paralisia periférica. Relatou-se que a mortalidade é de 2 a 5% em crianças, até 15 a 30% em adolescentes e adultos, e aumenta para 25 a 75% em pacientes com doença bulbar (1). As taxas de mortalidade são melhoradas com os avanços no tratamento de suporte (2).

Referências sobre prognóstico

  1. 1. Centers for Disease Control and Prevention: Epidemiology and Preventionof Vaccine-P reventable Diseases. Hall E., Wodi A.P., Hamborsky J., et al., eds: 14th ed.Washington, D.C. Public Health Foundation, 2021.

  2. 2. Murphy OC, Messacar K, Benson L, et al: Acute flaccid myelitis: cause, diagnosis, and management. Lancet. 2021;397(10271):334-346. doi:10.1016/S0140-6736(20)32723-9

Prevenção da poliomielite

Devem-se imunizar todos os lactentes e crianças com a vacina contra poliovírus. A American Academy of Pediatrics recomenda imunização com a vacina inativada contra poliomielite (VIP) Salk aos 2 meses, 4 meses e aos 6 a 18 meses de idade e uma dose de reforço aos 4 a 6 anos (ver tabela Centers for Disease Control and Prevention: Routine Polio Vaccination). Vacinação na infância produz imunidade em > 95% dos vacinados.

Nos Estados Unidos, a VIP Salk é preferida à vacina oral contra poliomielite (VOP) com vírus atenuado, ou vacina Sabin. O vírus atenuado na OPV se replica no intestino dos receptores e é excretado transitoriamente nas fezes e, portanto, é capaz de disseminação fecal-oral para outros indivíduos, potencialmente imunizando alguns indivíduos que não receberam diretamente a vacina. Mas essa disseminação entre várias pessoas pode levar a mutações do vírus da vacina, muito raramente para uma cepa Sabin pode sofrer mutação para uma cepa (poliovírus derivado da vacina) que pode causar poliomielite paralítica, que resulta em cerca de 1 caso por 2.400.000 doses de OPV. Essa mutação costuma ocorrer no componente do poliovírus tipo 2 da vacina. Por causa disso, a OPV não está mais disponível nos Estados Unidos. Além disso, o poliovírus tipo 2 foi removido da OPV em 2016 em decorrência de surtos resultantes de vírus derivados de vacina circulantes geneticamente divergentes, apesar da erradicação oficial do poliovírus tipo 2 do tipo selvagem. Efeitos adversos graves não foram associados à IPV.

Devido à detecção do poliovírus circulante derivado da vacina tipo 2 nos Estados Unidos, o Advisory Committee on Immunization Practices (ACIP) atualizou as recomendações de vacinação contra poliovírus para adultos em 2023 (1). Adultos não imunizados ou incompletamente imunizados devem receber vacinação primária com VPI, incluindo 2 doses administradas em intervalos de 4 a 8 semanas e uma 3ª dose administrada 6 a 12 meses mais tarde. Adultos imunizados com maior risco de exposição ao poliovírus, como aqueles que viajam para áreas endêmicas ou epidêmicas, podem receber 1 dose de reforço de VPI durante a vida toda. Pacientes imunocomprometidos e seus contatos domiciliares não devem receber OPV.

Referência sobre prevenção

  1. 1. Kidd S, Clark T, Routh J, Cineas S, Bahta L, Brooks O. Use of Inactivated Polio Vaccine Among U.S. Adults: Updated Recommendations of the Advisory Committee on Immunization Practices - United States, 2023. MMWR Morb Mortal Wkly Rep. 2023;72(49):1327-1330. Publicado em 8 de dezembro de 2023. doi:10.15585/mmwr.mm7249a3

Pontos-chave

  • A maioria das infecções por poliovírus é assintomática ou causa doença menor inespecífica ou meningite asséptica sem paralisia; < 1% dos pacientes apresenta a síndrome clássica da fraqueza flácida (poliomielite paralítica).

  • Paralisia flácida assimétrica de membro ou paralisia bulbar sem perda sensorial durante doença febril aguda em uma criança ou adulto jovem não imunizados pode indicar poliomielite paralítica.

  • Deve-se notificar imediatamente os departamentos de saúde locais e estaduais sobre casos suspeitos de poliovírus. Swabs orofaríngeos e nasofaríngeos, fezes (2 amostras separadas por 24 horas), sangue e líquido cefalorraquidiano devem ser coletados para testes em coordenação com os departamentos de saúde.

  • Na poliomelite paralítica, aproximadamente dois terços dos pacientes têm fraqueza permanente residual.

  • Todos os lactentes e crianças devem ser imunizados. Adultos não imunizados ou incompletamente imunizados devem ser vacinados.

Informações adicionais

O recurso em inglês a seguir pode ser útil. Observe que este Manual não é responsável pelo conteúdo deste recurso.

  1. Polio Eradication Initiative: Information about The Global Polio Eradication Initiative, which intends to eradicate polio worldwide through a public-private partnership

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