Ronco

PorRichard J. Schwab, MD, University of Pennsylvania, Division of Sleep Medicine
Revisado/Corrigido: jun. 2024
Visão Educação para o paciente

Ronco é um ruído estridente produzido na nasofaringe durante o sono. Ele é bastante comum, ocorrendo em cerca de 30% dos homens e 10% das mulheres (1); a prevalência aumenta com a idade. Mas como a percepção e a resposta de um parceiro de cama ao ronco são altamente subjetivas e como o ronco varia de noite para outra, as estimativas de prevalência são amplamente diferentes.

O som varia de quase inaudível a um ruído extremamente incômodo que pode ser alto o suficiente para se ouvido em outro ambiente. O ronco geralmente é angustiante para outras pessoas (tipicamente um parceiro de cama ou companheiro de quarto tentando dormir), em vez de para aquele que ronca; raramente, roncadores acordam co o som do seu próprio ronco.

Ronco pode ter consequências sociais significativas. Pode causar conflitos entre parceiros de cama ou colegas de quarto.

Outros sintomas como despertar frequente, ofegar ou se asfixiar durante o sono, sonolência diurna excessiva e cefaleia matinal também podem estar presentes, dependendo da gravidade, causa e consequências do ronco.

Referência

  1. 1. Kara CO, Zencir M, Topuz B, et al: The prevalence of snoring in adult population. Kulak Burun Bogaz Ihtis Derg14(1-2):18-24, 2005. Turco. PMID: 16227718

Fisiopatologia do ronco

O ronco resulta da vibração induzida pelo fluxo de ar dos tecidos moles da nasofaringe, em particular o palato mole. Como em qualquer estrutura física vibratória (p. ex., uma bandeira), a vibração na nasofaringe se desenvolve com base nos fatores de interação, incluindo a massa, rigidez e ligações do elemento vibratório e velocidade e direção do fluxo de ar.

O fato de que as pessoas não roncam enquanto estão acordadas sugere que o relaxamento muscular induzido pelo sono é pelo menos parte da etiologia porque o tônus muscular é o único componente de flutter que pode mudar durante o sono; a massa tecidual e as ligações não mudam. Além disso, se dilatadores faríngeos não conseguem manter abertas as vias respíratórias em resposta à pressão intraluminal negativa induzida pela inspiração, as vias respíratórias superiores se contraem, aumentando a velocidade do fluxo de ar local (para um dado volume inspiratório). A velocidade de fluxo aumentada promove vibração direta e diminui a pressão intraluminal, aumentando ainda mais o fechamento das vias respíratórias e promovendo assim vibração e ronco.

Ronco tende a ocorrer nas vias respiratórias superiores já comprometidas por fatores estruturais, incluindo

  • Micrognatia ou retrognatia

  • Desvio de septo nasal

  • Rinite que provoca edema dos tecidos

  • Obesidade

  • Macroglossia

  • Palato mole aumentado

  • Paredes da lateral da faringe aumentadas

Etiologia do ronco

Ronco primário

Ronco primário é aquele que não é acompanhado por despertares ou despertares excessivos, limitação do fluxo aéreo, dessaturação de oxigênio ou arritmias durante o sono e que ocorre em pessoas que não têm sonolência diurna excessiva. Despertares são transições breves para o sono mais leve ou despertares que duram < 15 segundos e, geralmente, não são observados.

Distúrbios respiratórios do sono

O ronco costuma ser um sintoma de distúrbios respiratórios do sono, que abrange um espectro que vai de síndrome de resistência das vias respiratórias superiores à apneia obstrutiva do sono (AOS). Cada um tem uma fisiopatologia das vias respíratórias superiores obstrutivas semelhante, mas difere em termos de grau e consequências clínicas da obstrução das vias respíratórias. As consequências clínicas envolvem principalmente distúrbios do sono e/ou fluxo de ar.

Pacientes com apneia obstrutiva do sono têm ≥ 5 episódios de apneia ou hipopneia (com cada episódio durando pelo menos 10 segundos) por hora durante o sono [índice de apneia hipopneia (IAH)] mais ≥ 1 dos seguintes:

  • Sonolência diurna, episódios de sono não intencionais, sono não restaurador, fadiga ou insônia

  • Despertar com retenção da respiração, respiração entrecortada, ou sufocação

  • Relatos — pelo cônjuge — de ronco alto, interrupções na respiração, ou ambos durante o sono do paciente

Pode-se categorizar a apneia obstrutiva do sono pela gravidade:

  • Leve: 5 a 15 episódios/hora

  • Moderada: 16 a 30 episódios/hora

  • Grave: > 30 episódios/hora

Síndrome de resistência das vias respiratórias superiores [limitação do fluxo aéreo secundária ao aumento da resistência das vias respiratórias superiores ou despertares relacionados ao esforço respiratório (DRERs)] pode causar sonolência diurna excessiva ou outras manifestações sugerindo apneia obstrutiva do sono, mas com poucos episódios de apneia/hipopneia ou dessaturação de oxigênio; portanto, não atendendo a todos os critérios para apneia obstrutiva do sono.

Complicações

Embora o próprio ronco não tenha efeitos fisiológicos adversos conhecidos, a apneia obstrutiva do sono pode ter consequências (p. ex., hipertensão, acidente vascular encefálico, doenças do coração, fibrilação atrial).

Fatores de risco

Os fatores de risco de ronco incluem

  • Idade avançada

  • Obesidade

  • Consumo de álcool ou outros sedativos

  • Congestão ou bloqueio nasal crônico

  • Mandíbula pequena ou deslocada posteriormente

  • Sexo masculino

  • Estado pós-menopausa

  • Gestação

  • Estruturas anormais que podem bloquear o fluxo de ar (p. ex., grandes tonsilas, um desvio de septo nasal, pólipos nasais, macroglossia, palato mole aumentado, estreitamento da faringe lateral)

Também pode haver risco familiar.

Avaliação do ronco

O principal objetivo é identificar aqueles que roncam com alto risco de apresentar apneia obstrutiva do sono. Muitas pessoas que roncam não têm AOS, mas a maioria dos pacientes que roncam tem AOS (a proporção exata não é conhecida).

Como várias manifestações importantes da AOS são observadas principalmente por outras pessoas, parceiros de cama ou companheiros de quarto também devem ser entrevistados quando possível.

História

A história da doença atual deve abranger a gravidade do ronco, incluindo sua frequência, duração e intensidade. Além disso, deve-se observar o grau do rouco que afeta o parceiro de cama.

A revisão dos sistemas deve buscar os sintomas que sugerem apneia obstrutiva do sono, como a presença de distúrbios do sono como indicado por

  • Número de despertares

  • Episódios apncos testemunhados de respiração intensa/asfixia

  • Presença de sono não reparador ou cefaleias matinais

  • Sonolência diurna excessiva

Pode-se utilizar a Escala de Sonolência de Epworth para quantificar a sonolência diurna. A classificação STOP-BANG (ver tabela Classificação de risco STOP-BANG para apneia obstrutiva do sono) é uma ferramenta útil para prever o risco de apneia obstrutiva do sono em pacientes que roncam.

Tabela
Tabela

A história clínica deve observar a presença de distúrbios que possam estar associados com AOS, especialmente hipertensão, isquemia coronária, insuficiência cardíaca, acidente vascular encefálico, doença de refluxo gastroesofágico (DRGE), fibrilação atrial, depressão, obe­sidade (especialmente obesidade mórbida) e diabetes. Pergunta-se aos pacientes a quantidade de álcool que consomem e quando é consumido em relação à hora de dormir. História de fármacos pode identificar fármacos sedativos ou relaxantes musculares.

Exame físico

O exame deve inicialmente medir altura e peso, além de calcular o IMC.

O restante do exame deve focalizar a inspeção no nariz e na boca de evidências de obstrução. Sinais incluem

  • Pólipos nasais e conchas ingurgitados

  • Palato elevado, arqueado, alto

  • Aumento da língua, das tonsilas, do palato mole, das paredes laterais da faringe ou da úvula

  • Mandíbula pequena ou deslocada posteriormente (retrognatia)

Uma classificação modificada de Mallampati de 3 ou 4 (somente a base ou nenhuma parte da úvula é visível durante a inspeção oral — ver figura Classificação de Mallampati) sugere maior risco de AOS.

Pontuação modificada de Mallampati

Classificação modificado de Mallampati é como a seguir:

  • Classe 1: tonsilas, úvula e palato mole totalmente visíveis.

  • Classe 2: palato duro e mole, parte superior das tonsilas e úvula visíveis.

  • Classe 3: palato mole e duro e base da úvula visíveis.

  • Classe 4: apenas o palato duro visível.

Sinais de alerta

Os achados a seguir são particularmente preocupantes:

  • Apneia ou asfixia testemunhada durante o sono

  • Dores de cabeça matinais

  • Escala de sonolência de Epworth ≥ 10

  • IMC ≥ 35 kg/m2

  • Ronco muito sonoro e constante

  • Hipertensão

Interpretação dos achados

A avaliação clínica não é totalmente confiável para o diagnóstico da apneia obstrutiva do sono, mas pode ser sugestivo. Resultados alarmante se correlacionam claramente com AOS. Mas todos esses resultados ocorrem ao longo de um continuum, e não há um acordo generalizado sobre pontos de corte e ponderação relativa. Contudo, quanto mais resultados alarmantes um paciente tem e mais graves eles são, maior é a probabilidade de AOS.

Exames

Realiza-se testes quando suspeita-se do diagnóstico de apneia obstrutiva do sono; o teste é a polissonografia (em laboratório ou domiciliar). Deve-se realizar polissonografia quando a suspeita clínica de AOSS é significativa. Os pacientes que devem ser testados são aqueles que têm achados alarmantes (particularmente apneia testemunhada), incluindo aqueles cujos resultados dos testes (p. ex., classificação de risco STOP-BANG para AOS) não são suficientemente altos para o diagnóstico da apneia obstrutiva do sono. Contudo, como roncar é muito comum, pode-se realizar uma polissonografia, particularmente o teste domiciliar, que não é tão dispendioso, de forma mais liberal; este exame deve ser considerado quando a suspeita clínica de AOS é baixa.

Pessoas sem sinais ou sintomas de distúrbio do sono, além de ronco, podem não precisar ser testadas, mas devem ser clinicamente monitoradas para o desenvolvimento dessas manifestações.

Tratamento do ronco

O tratamento do ronco associado a outras condições, como obstrução nasal crônica e apneia obstrutiva do sono, são discutidos em outras partes deste Manual.

Globalmente, o tratamento consiste em medidas gerais para controlar os fatores de risco, além de métodos físicos para expandir as vias respiratórias superiores e/ou enrijecer as estruturas comprometidas.

Medidas gerais

Várias medidas gerais podem ser utilizadas para ronco primário. Sua eficácia não foi bem avaliada, principalmente porque a percepção do ronco é altamente subjetiva; entretanto, pacientes específicos podem se beneficiar. As medidas incluem

  • Evitar álcool e drogas sedativas durante várias horas antes de dormir

  • Dormir com a cabeça elevada (mais bem alcançado utilizando dispositivos de posicionamento do leito ou do corpo como cunhas) ou dormir em decúbito lateral

  • Perda ponderal

  • Tratar qualquer congestão nasal (p. ex., com spray de corticoide)

A melhor maneira de elevar a cabeça é colocar calços sob 2 pernas da cama de modo a levantar a cabeceira, ou utilizar um travesseiro que incline toda a parte superior do corpo. Não se devem utilizar travesseiros para levantar apenas a cabeça.

Medidas que forçam o indivíduo a dormir de lado durante a noite podem incluir, por exemplo, a fixação de uma bola de tênis nas costas da camisa de dormir.

Os parceiros de cama podem se beneficiar do uso de tampões de ouvido ou aparelhos com ruído branco. Às vezes, são necessárias configurações alternativas para dormir (p. ex., quartos separados).

Aparelhos orais

Aparelhos orais só são utilizadas durante o sono; eles incluem

  • Dispositivos de avanço mandibular

  • Dispositivos de retenção da língua

Esses aparelhos devem ser colocados por dentistas especialmente treinados. São úteis para pacientes com AOS e são geralmente tidos como eficazes para o ronco simples, embora haja poucos estudos nessa área.

Os efeitos adversos incluem desconforto da articulação temporomandibular (ATM), desalinhamento dental e salivação excessiva, mas a maioria dos pacientes tolera os dispositivos bem.

Os dispositivos de avanço mandibular são mais comumente utilizados. Esses dispositivos, que são feitos por dentistas especialmente qualificados, movem a mandíbula e a língua para a frente em relação ao maxilar e, assim, reduzem o calibre das vias respiratórias durante o sono. A maioria pode ser ajustada incrementalmente após o ajuste inicial para otimizar os resultados (ao contrário dos aparelhos autoajustáveis que podem ser comprados sem prescrição médica).

Dispositivos de retenção da língua utilizam sucção para manter a língua em uma posição anterior. Dispositivos de retenção da língua são mais desconfortáveis do que os dispositivos de avanço mandibular.

Um estimulador muscular da língua removível é projetado para ser utilizado durante o dia a fim de melhorar a função muscular da língua em pacientes com ronco ou AOS.

Pressão positiva contínua das vias respiratórias (CPAP)

Dispositivos de pressão positiva contínua das vias respiratórias mantêm uma pressão constante positiva na via respiratória superior por meio de uma pequena máscara aplicada ao nariz ou à boca e nariz. Aumentando o calibre das vias respiratórias superiores, a pressão positiva contínua das vias respiratórias previne o estreitamento ou colapso das vias respiratórias superiores durante o sono. Portanto, é muito eficaz para AOS e é eficaz para ronco primário. No entanto, os pacientes podem ter dificuldade de tolerar a CPAP, e seu uso no ronco primário é limitado porque não há reembolso por esse uso. Embora os pacientes frequentemente estejam dispostos a utilizar um dispositivo de pressão positiva contínua das vias respiratórias noturno para evitar os sintomas significativos e as consequências a longo prazo da AOS, eles estão menos dispostos a utilizar o dispositivo para controlar o ronco primário, cujas consequências são principalmente sociais.

Cirurgia

Como a patência nasal reduzida promove o ronco, corrigir cirurgicamente as causas específicas do comprometimento das vias respiratórias (p. ex., pólipos nasais, tonsilas hipertrofiadas, desvio de septo) pode ser uma maneira razoável de diminuir o ronco. Entretanto, os estudos ainda não fundamentaram essa teoria.

Vários procedimentos cirúrgicos faríngeos que alteram a estrutura do palato e, às vezes, da úvula foram desenvolvidos para apneia obstrutiva do sono. Alguns também são úteis para o ronco não apneico.

Uvulopalatofaringoplastia envolve a remodelação da úvula, palato e paredes faríngeas para aumentar o tamanho das vias respiratórias. Pode ser eficaz para ronco, embora os efeitos possam durar apenas alguns anos (uvulopalatofaringoplastia). É um procedimento que requer internação e anestesia geral; portanto, sua justificativa apenas para o ronco é limitada (uvulopalatofaringoplastia). Agora também é utilizada com menos frequência do que procedimentos menos agressivos.

Portanto, desenvolveram-se alguns procedimentos ambulatoriais de alteração do palato que requerem apenas um anestésico local:

  • Uvuloplastia assistida por laser é menos invasiva do que a uvulopalatofaringoplastia. Embora alguns pacientes relatem benefícios, estes tendem a diminuir ao longo do tempo (uvulopalatofaringoplastia) e sua utilidade a longo prazo no tratamento do ronco não foi comprovada.

  • Para injeção roncoplástica, um agente escleroterápico é injetado na submucosa do palato mole para endurecê-lo e também a úvula. Sua utilidade somente para o ronco requer estudos adicionais.

  • Para ablação por radiofrequência, uma sonda é utilizada para introduzir energia térmica no palato mole. Estudos limitados demonstraram sua utilidade no tratamento do ronco, mas são necessários estudos mais profundos.

  • Implantes palatinos, feitos de polietileno, pode ser colocados no palatino mole para endurecê-lo. Utilizam-se três implantes pequenos. Sua utilidade para o ronco isoladamente não foi comprovada (uvulopalatofaringoplastia), e esses implantes podem ser expelidos.

Referências sobre o tratamento

  1. 1. Hicklin LA, Tostevin P, Dasan S: Retrospective survey of long-term results and patient satisfaction with uvulopalatopharyngoplasty for snoring. J Laryngol Otol 114(9):675-681, 2000. doi: 10.1258/0022215001906697

  2. 2. Camacho M, Guilleminault C, Wei JM, et al: Oropharyngeal and tongue exercises (myofunctional therapy) for snoring: a systematic review and meta-analysis. Eur Arch Otorhinolaryngol 275(4):849-885, 2018. doi: 10.1007/s00405-017-4848-5

  3. 3. Iyngkaran T, Kanagalingam J, Rajeswaran R, et al: Long-term outcomes of laser-assisted uvulopalatoplasty in 168 patients with snoring. J Laryngol Otol 120(11):932-938, 2006. doi: 10.1017/S002221510600209X

  4. 4. Choi JH, Cho JH, Chung YS, et al: Effect of the Pillar implant on snoring and mild obstructive sleep apnea: A multicenter study in Korea. Laryngoscope 125(5):1239-1243, 2015. doi: 10.1002/lary.24975

Pontos-chave

  • Somente algumas pessoas que roncam têm apneia obstrutiva do sono (AOS), mas a maioria dos pacientes com AOS ronca.

  • Fatores de risco clínicos como apneia noturna ou episódios de asfixia, sonolência diurna e IMC alto ajudam a identificar pacientes com risco de AOS e, portanto, que precisam ser testados com polissonografia ou monitoramento do sono domiliciar.

  • Recomendar medidas gerais para reduzir o ronco (p. ex., evitar álcool e sedativos, dormir com a cabeça elevada ou em decúbito lateral, perder peso).

  • Considerar medidas específicas, como dispositivos de avanço mandibular, procedimentos de alteração do palato e pressão positiva contínua das vias respiratórias para tratar ronco devido à AOS.

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