Hipertireoidismo

(Tireotoxicose, incluindo doença de Graves)

PorLaura Boucai, MD, Weill Cornell Medical College
Revisado/Corrigido: fev. 2024
Visão Educação para o paciente

O hipertireoidismo caracteriza-se por hipermetabolismo e níveis sérios elevados de hormônios tireóideos livres. Os sintomas são palpitações, fadiga, perda ponderal, intolerância ao calor, ansiedade e tremor. O diagnóstico é clínico e por exames de função tireoidiana. O tratamento depende da causa.

(Ver também Visão geral da função tireoidiana.)

Nos Estados Unidos, o hipertireoidismo afeta cerca de 1% dos indivíduos. Pode ocorrer em qualquer idade, mas é mais comum em mulheres entre 20 e 50 anos de idade (1).

O hipertireoidismo pode ser classificado com base na captação de iodo radioativo da tireoide e no nível dos hormônios tireóideos circulantes (ver tabela Resultados de exames laboratoriais da função tireoidiana em várias situações clínicas).

Referência geral

  1. 1. Lee SY, Pearce EN. Hyperthyroidism: A Review. JAMA 2023;330(15):1472-1483. doi:10.1001/jama.2023.19052

Etiologia do hipertireoidismo

O hipertireoidismo pode resultar de aumento de síntese e secreção de hormônio tireóideo (T4 e T3), causado por imunoglobulina tireoestimulante (TSI) ou por hiperfunção autônoma da tireoide. Também pode resultar da liberação excessiva de hormônio tireóideo da glândula tireoide, sem aumento de síntese. Essa liberação é comumente causada por alterações destrutivas, nos vários tipos de tireoidites.

As causas mais comuns hipertireoidismo incluem

  • Doença de Graves

  • Bócio multinodular

  • Nódulo "quente" unico, autônomo, hiperfuncionante

  • Tireoidite

A doença de Graves (bócio difuso tóxico) é a causa mais comum de hipertireoidismo, caracterizando-se por hipertireoidismo e um ou mais dos seguintes achados:

A doença de Graves é causada por autoanticorpos contra o receptor de TSH; diferente da maioria dos anticorpos, que são inibitórios, este autoanticorpo é estimulador, promovendo síntese contínua e secreção excessiva de T4 e T3. A doença de Graves (assim como a tireoidite de Hashimoto) às vezes ocorre com outras doenças autoimunes, incluindo diabetes tipo 1, vitiligo, cabelos prematuramente grisalhos, anemia perniciosa, distúrbios do tecido conjuntivo e síndrome de deficiência poliglandular. A hereditariedade aumenta o risco da doença de Graves, embora os genes paticipantes são desconhecidos.

A patogênese da oftalmopatia infiltrativa (responsável pelo exoftalmo na doença de Graves) é mal compreendida, mas pode ser resultado de imunoglobulinas direcionadas para receptores de TSH na gordura e fibroblastos orbitais, resultando em secreção de citocinas pró-inflamatórias, inflamação e acúmulo de glicosaminoglicanos. Também pode haver oftalmopatia antes do início do hipertireoidismo ou mesmo 20 anos depois do seu surgimento, que piora ou melhora independentemente da evolução clínica do hipertireoidismo. Chama-se de doença de Graves eutireoidiana a oftalmopatia típica observada na presença de função tireoidiana normal (ver foto Manifestações oculares da doença de Graves — exoftalmia).

Bócio uni ou multinodular tóxico (doença de Plummer) às vezes resulta de mutações do gene do receptor de TSH, causando ativação contínua da tireoide. Pacientes com bócio nodular tóxico não apresentam as manifestações autoimunes ou os anticorpos circulantes observados na doença de Graves. Além disso, em contraste com a doença de Graves, bócios uninodulares ou multinodulares habitualmente não entram em remissão.

Doença inflamatória da tireoide (tireoidite) pode ser tireoidite granulomatosa subaguda, tireoidite de Hashimoto e tireoidite linfocítica silenciosa, uma variante da tireoidite de Hashimoto. O hipertireoidismo é mais comum na tireoidite granulomatosa subaguda e resulta de alterações destrutivas da glândula e da liberação dos hormônios armazenados, e não do aumento de sua síntese. A seguir, pode ocorrer hipotireoidismo.

A secreção inapropriada de TSH é uma causa rara. Pacientes com hipertireoidismo primário têm níveis indetectáveis de TSH. Entretanto, os níveis de TSH são detectáveis em pacientes com adenoma hipofisário secretor de TSH ou com resistência hipofisária ao hormônio tireoideo, nos quais os níveis de TSH são altos. O TSH produzido em ambos os distúrbios hipofisários é biologicamente mais ativo do que o TSH normal. Aumento da subunidade alfa do TSH no sangue (útil para o diagnóstico diferencial) ocorre em pacientes com adenoma hipofisário secretor de TSH.

O hipertireoidismo induzido por medicamentos pode ocorrer do uso de amiodarona, de inibidores de ponto de checagem utilizados na terapia contra câncer, alentuzumabe utilizado no tratamento de esclerose múltipla, ou interferon alfa, que podem induzir tireoidite com hipertireoidismo e outras disfunções tireoidianas. Apesar de mais comumente causar hipotireoidismo, o lítio pode, poucas vezes, causar hipertireoidismo. Os pacientes que utilizam esses medicamentos devem ser monitorados rigorosamente.

Tireotoxicose factícia é o hipertireoidismo resultante da ingestão excessiva acidental ou intencional de hormônio tireóideo.

O excesso de ingestão de iodo causa hipertireoidismo com baixa captação tireoidiana de iodo radioativo. Ocorre com mais frequência nos pacientes com bócio nodular atóxico subjacente (sobretudo em pacientes idosos) que recebem medicamentos contendo iodo (p. ex., amiodarona) ou que são submetidos a exames radiológicos com meios de contraste ricos em iodo. A etiologia pode ser o excesso de iodo fornecendo substrato para áreas de tireoide funcionalmente autônomas (isto é, que não estão sob controle do TSH) produzirem hormônios. O hipertireoidismo geralmente persiste enquanto o excesso de iodo permanece na circulação.

Mola hidatiforme parcial (gestação molar) e coriocarcinoma produzem altos níveis séricos de gonadotropina coriônica humana (hCG), um estimulador fraco da tireoide. Os níveis de gonadotropina coriônica humana são mais altos no 1º trimestre da gestação e resultam na redução do TSH e em discreta elevação do T4 livre, observada algumas vezes nessa ocasião. O aumento do estímulo à tireoide pode ser causado por elevação das concentrações de hCG dessializada, uma variante de hCG que parece ser um estimulante tireoidiano mais potente que a hCG mais sializada. O hipertireoidismo na gestação molar, no coriocarcinoma e na hiperêmese gravídica é transitório; a função tireoidiana volta ao normal quando se esvazia a gestação molar, quando se trata de modo adequado o coriocarcinoma ou quando cessa a hiperêmese gravídica.

Hipertireoidismo autossômico dominante não autoimune manifesta-se na infância. Resulta de mutações do gene do receptor do TSH que produz estímulo contínuo da tireoide.

Câncer de tireoide metastático é uma causa possível. A produção excessiva de hormônio tireóideo ocorre raramente em decorrência de carcinoma folicular metastático, em especial nas metástases pulmonares.

O struma ovarii ocorre quando teratomas ovarianos contêm quantidades suficientes de tecido tireoidiano para causar hipertireoidismo verdadeiro. A captação de iodo radioativo ocorre na pelve e a captação da tireoide está suprimida.

Fisiopatologia do hipertireoidismo

No hipertireoidismo, as concentrações séricas de T3 habitualmente se elevam mais que as de T4, provavelmente em razão de aumento de secreção de T3 e da conversão de T4 em T3 nos tecidos periféricos. Em alguns pacientes, apenas o T3 está elevado (toxicose por T3).

A toxicose por T3 pode ocorrer em qualquer das doenças habituais que produzem hipertireoidismo, incluindo doença de Graves, bócio multinodular e nódulo único funcionante autônomo. Se a toxicose por T3 não for tratada, o paciente habitualmente evolui com as alterações laboratoriais típicas do hipertireoidismo (isto é, ou seja, aumento do T4 e da captação de Iodo-123). As várias formas de tireoidites comumente apresentam uma fase de hipertireoidismo seguida de uma fase de hipotireoidismo.

Sinais e sintomas do hipertireoidismo

A maioria dos sinais e sintomas é a mesma, independentemente da causa. As exceções incluem oftalmopatia infiltrativa e dermopatia, que ocorrem apenas na doença de Graves.

Dicas e conselhos

  • Idosos com hipertireoidismo podem ter sintomas semelhantes à depressão ou demência.

A apresentação clínica pode ser dramática ou sutil. Pode haver presença de bócio ou nódulo.

Vários sintomas comuns de hipertireoidismo são decorrentes de maior sensibilidade aos hormônios adrenérgicos, como nervosismo, palpitações, hiperatividade, aumento de sudorese, hipersensibilidade ao calor, fadiga, aumento de apetite, perda ponderal, insônia, fraqueza e aumento da frequência de movimentos intestinais (ocasionalmente diarreia). Pode haver hipermenorreia.

Os sinais podem ser pele quente e úmida, tremores, taquicardia, alargamento da pressão de pulso e fibrilação atrial.

Pacientes idosos, em particular aqueles com bócio nodular tóxico, podem apresentar sintomas atípicos (hipertireoidismo apático ou mascarado) com sintomas mais parecidos com depressão ou demência. A maioria não apresenta exoftalmo ou tremores. Fibrilação atrial, síncope, alterações sensoriais, insuficiência cardíaca e fraqueza são mais prováveis. Os sinais e sintomas podem envolver apenas um sistema orgânico.

Sinais oculares

Os sinais oculares de hipertireoidismo incluem olhar fixo, retração palpebral e hiperemia conjuntival leve, e decorrem, em grande parte, do excesso de estimulação adrenérgica. Geralmente remetem com tratamento bem-sucedido para normalizar os níveis de hormônio tireoideo.

A oftalmopatia infiltrativa, também chamada doença ocular da tireoide, é um desenvolvimento mais grave e é específica da doença de Graves. Pode ocorrer anos antes ou depois do hipertireoidismo. Caracteriza-se por dor orbital, lacrimejamento, irritação, fotofobia, aumento de tecido retro-orbital, exoftalmia e infiltração linfocitária dos músculos extraoculares, provocando fraqueza da musculatura ocular que, com frequência, causa visão dupla.

Manifestações oculares da doença de Graves
Oftalmopatia infiltrativa na doença de Graves
Oftalmopatia infiltrativa na doença de Graves

    Paciente com doença de Graves apresenta sinais oculares, como alargamento das fissuras palpebrais, retração da pálpebra, estrabismo e exoftalmia.

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Com permissão do editor. De Mulligan M, Cousins M. In Atlas of Anesthesia: Preoperative Preparation and Intraoperative Monitoring. Editado por R Miller (editor da série) e JL Lichtor. Philadelphia, Current Medicine, 1998.

Manifestações oculares da doença de Graves — exoftalmia
Manifestações oculares da doença de Graves — exoftalmia

© Springer Science+Business Media

Vista em detalhe da exoftalmia
Vista em detalhe da exoftalmia

© Springer Science+Business Media

Manifestações oculares da doença de Graves — incapacidade de fechar os olhos
Manifestações oculares da doença de Graves — incapacidade de fechar os olhos

© Springer Science+Business Media

Manifestações oculares da doença de Graves — bolsas infraorbitais
Manifestações oculares da doença de Graves — bolsas infraorbitais

© Springer Science+Business Media

Dermopatia infiltrativa

Dermopatia infiltrativa, também denominada mixedema pré-tibial (um termo confuso, pois mixedema sugere hipotireoidismo), caracteriza-se por infiltração sem cacifo por substâncias basais proteicas, geralmente na área pré-tibial. Raramente ocorre na ausência de oftalmopatia de Graves. A lesão habitualmente é pruriginosa e eritematosa nos estágios iniciais e, em seguida, se torna acastanhada. A dermopatia infiltrativa pode surgir anos antes ou depois do hipertireoidismo.

Manifestações do mixedema pré-tibial
Mixedema pré-tibial
Mixedema pré-tibial

    Esta foto mostra um paciente com mixedema pré-tibial, caracterizado por edema não depressível, pele descamativa espessada e hiperpigmentação.

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Foto cedida por cortesia de Karen McKoy, MD.

Mixedema pré-tibial (leve)
Mixedema pré-tibial (leve)

© Springer Science+Business Media

Mixedema pré-tibial em um paciente com doença de Graves
Mixedema pré-tibial em um paciente com doença de Graves

Com permissão do editor. From Burman K, Becker K, Cytryn A, et al. In Atlas of Clinical Endocrinology: Thyroid Diseases . Edited by SG Korenman (series editor) and MI Surks. Philadelphia, Current Medicine, 1999.

Tempestade tireotóxica

A tempestade tireotóxica, uma forma aguda de hipertireoidismo, resulta de hipertireoidismo grave não tratado ou tratado de forma inadequada. É rara, ocorrendo em pacientes com doença de Graves ou bócio multinodular tóxico (nódulo tóxico único é uma causa menos comum e, geralmente, provoca manifestações menos graves). Pode ser precipitada por infecção, trauma, cirurgia, embolia, cetoacidose diabética ou pré-eclâmpsia.

A tempestade tireotóxica produz sintomas abruptos de hipertireoidismo, com uma ou mais das seguintes manifestações: febre, fraqueza significativa e desgaste muscular, inquietação extrema com alterações emocionais, confusão, psicose, coma, náuseas, vômitos, diarreia e hepatomegalia, com icterícia leve. O paciente pode apresentar taquicardia ou colapso cardiovascular e choque. A tempestade tireotóxica é uma emergência que coloca a vida em risco e requer tratamento imediato.

Diagnóstico do hipertireoidismo

  • Medição de TSH

  • T4 livre, mais medição de T3 livre ou T3 total

  • Às vezes, captação de radioiodo

O diagnóstico do hipertireoidismo é feito pela anamnese, pelo exame físico e pelas provas de função tireoidiana. A medição sérica de TSH é o melhor exame, pois o TSH é suprimido em pacientes hipertireoidianos, exceto no caso raro de a etiologia ser um adenoma hipofisário secretor de TSH ou resistência hipofisária à inibição normal pelos hormônios tireóideos.

O T4 livre aumenta no hipertireoidismo. Entretanto, o T4 pode ser falsamente normal no hipertireoidismo verdadeiro em pacientes com doenças sistêmicas graves (similar às falsas concentrações reduzidas que ocorrem na síndrome do paciente eutireoidiano) e na toxicose por T3. Se a concentração de T4 livre for normal e o TSH for baixo em paciente com sinais e sintomas sutis de hipertireoidismo, deve-se medir a concentração sérica de T3 para detectar a toxicose por T3; uma concentração elevada confirma esse diagnóstico.

Em geral, a causa pode ser diagnosticada clinicamente (p. ex., presença de sinais específicos de doença de Graves). Se não for o caso, a captação de iodo radioativo pela tireoide pode ser medida utilizando Iodo-123. Quando o hipertireoidismo é decorrente da produção excessiva de hormônios, a captação de iodo radioativo pela tireoide costuma estar elevada (difusamente na doença de Graves, focalmente no bócio uninodular ou multinodular). Quando o hipertireoidismo é decorrente de tireoidite, ingestão de iodo ou hiperdosagem de hormônio tireóideo, a captação de iodo radioativo é baixa.

Pode-se dosar os anticorpos contra o receptor do TSH para avaliar a doença de Graves. A dosagem é feita nas gestantes com história de doença de Graves durante o 3º trimestre da gestação para avaliar o risco de doença de Graves neonatal; os anticorpos do receptor de TSH atravessam rapidamente a barreira placentária e estimulam a tireoide fetal. A maioria dos pacientes com doença de Graves apresenta anticorpos antitireoperoxidase circulantes e poucos apresentam anticorpos antitireoglobulina.

A secreção inapropriada de TSH é rara. O diagnóstico é confirmado quando ocorre hipertireoidismo com concentrações elevadas de T4 e T3 livres e TSH normal ou elevado.

Se houver suspeita de tireotoxicose factícia, pode ser medida a tireoglobulina sérica, que habitualmente é normal ou de baixa a normal — diferente de todas as outras causas de hipertireoidismo.

Hipertireoidismo subclínico

O hipertireoidismo subclínico consiste na presença de baixas concentrações séricas de TSH em pacientes com concentrações normais de T4 e T3 livres e sintomas de hipertireoidismo ausentes ou mínimos.

O hipertireoidismo subclínico é muito menos comum que o hipotireoidismo subclínico.

Muitos pacientes com hipertireoidismo subclínico tomam levotiroxina. As outras causas de hipertireoidismo subclínico são as mesmas do hipertireoidismo clinicamente aparente.

Pacientes com concentrações séricas de TSH < 0,1 microU/mL (0,1 mU/L) apresentam maior incidência de fibrilação atrial (em particular nos pacientes idosos), redução da densidade mineral óssea, aumento de fraturas e maior mortalidade. Pacientes com concentrações séricas de TSH apenas discretamente abaixo do normal têm menor probabilidade de apresentar essas complicações.

Tratamento do hipertireoidismo

O tratamento do hipertireoidismo depende da causa (1), mas pode compreender

  • Captação de iodo radioativo

  • Metimazol ou propiltiouracil

  • Betabloqueadores

  • Iodo

  • Cirurgia

Iodeto de sódio radioativo (iodo-131, radioiodo)

Nos Estados Unidos, o Iodo-131 constitui o tratamento mais comum para hipertireoidismo. Costuma ser recomendado como tratamento de escolha para doença de Graves e bócio nodular tóxico em todos os pacientes, incluindo crianças. Estudos epidemiológicos relatam um aumento muito pequeno do risco de neoplasias secundárias decorrentes do tratamento com I-131, dependendo do tipo de câncer e da duração do seguimento (2), de modo que alguns médicos preferem utilizar medicamentos antitireoidianos. É difícil ajustar a dosagem de Iodo-131 porque a resposta da glândula não é previsível; alguns médicos administram uma dose padrão de 8 a 15 millicurie. Outros ajustam a dose com base no tamanho estimado da tireoide e na captação de 24 horas para fornecer uma dose de 80 a 120 microcurie/g de tecido tireoidiano.

Quando se administra o Iodo-131 em dose suficiente para causar eutireoidismo, cerca de 25 a 50% dos pacientes passam a apresentar hipotireoidismo mais ou menos 1 ano mais tarde, e a incidência continua aumentando anualmente. Assim, a maioria dos pacientes acaba tornando-se hipotireoidiana e requer reposição hormonal tireoidiana. Entretanto, se forem utilizadas doses mais baixas, a incidência de recidiva é maior. Doses mais altas, como 10 a 20 millicurie, costumam causar hipotireoidismo em 6 meses.

O iodo radioativo não é utilizado durante a lactação porque ele pode entrar no leite materno e causar hipotireoidismo no neonato. Ele não é utilizado durante a gestação porque atravessa a placenta e pode causar hipotireoidismo fetal grave. Não há provas de que ele aumente a incidência de tumores, leucemia, câncer de tireoide ou defeitos congênitos em crianças nascidas de mães com hipertireoidismo prévio que engravidaram após o término do tratamento.

Metimazol e propiltiouracila

Esses medicamentos antitireoidianos bloqueiam a peroxidase tireoidiana, diminuindo a organificação de iodo, e alteram a reação de acoplamento. A propiltiouracila em altas doses também inibe a conversão periférica de T4 em T3.

Metimazol é o medicamento preferido. A dose inicial usual de metimazol é de 5 a 20 mg por via oral 1-3 vezes ao dia. A normalização do TSH atrasa a normalização dos níveis de T4 e T3 em semanas. Portanto, quando os níveis de T4 e T3 normalizam, reduz-se a dose para a menor dose eficaz, geralmente 2,5 a 10 mg de metimazol, uma vez ao dia para evitar a indução de hipotireoidismo. Em geral, o controle é alcançado em 2 a 3 meses. Doses de manutenção de metimazol podem ser mantidas por 1 anos, dependendo das circunstâncias clínicas. O carbimazol, amplamente utilizado na Europa, mas que não está disponível nos Estados Unidos, é rapidamente convertido em metimazol. A dose inicial é semelhante à do metimazol; a dose de manutenção é de 2,5 a 10 mg por via oral uma vez ao dia ou 2,5 a 5 mg duas vezes ao dia.

Por causa da insuficiência hepática grave em alguns pacientes < 40, especialmente crianças, propiltiouracila agora só é recomendada em situações especiais (p. ex., no 1º trimestre de gestação, na tempestade tireotóxica). A dose inicial usual de propiltiouracila é de 100 a 150 mg por via oral a cada 8 horas. Controle rápido pode ser obtido com o aumento da dose de propiltiouracila para 150 a 200 mg a cada 8 horas. Essas doses ou doses mais altas (até 400 mg a cada 8 horas) são geralmente reservadas para pacientes gravemente enfermos, incluindo aqueles com tireotoxicose, para bloquear a conversão de T4 em T3. A dose de manutenção com propiltiouracil é de 50 mg, duas vezes ao dia ou 3 vezes ao dia

Aproximadamente 20 a 50% dos pacientes com doença de Graves permanecem em remissão após um curso de 1 a 2 anos com metimazol ou propiltiouracil. O retorno ao normal ou a diminuição acentuada do tamanho da glândula, a restauração do nível sérico normal de TSH e a resolução dos sintomas de hipertireoidismo são bons sinais prognósticos de remissão a longo prazo. O uso concomitante de tratamento antitireoidiano e levotiroxina não melhora a taxa de remissão em pacientes com doença de Graves. Como o bócio nodular tóxico raramente sofre remissão, o tratamento com medicamentos antitireoidianos é administrado apenas no preparo para tratamento cirúrgico ou com Iodo-131.

Os efeitos adversos incluem exantema, reações alérgicas, função hepática anormal (incluindo insuficiência hepática com propiltiouracila) e, em cerca de 0,1% dos pacientes, agranulocitose reversível. Pacientes com alergia a um dos medicamentos podem tê-la substituída por outra, mas pode ocorrer sensibilidade cruzada. Se ocorrer agranulocitose, o paciente não pode trocar a medicação, devendo-se utilizar outra modalidade de tratamento (p. ex., radioiodo, cirurgia).

Dicas e conselhos

  • Se ocorrer agranulocitose com um dos medicamentos de peroxidase antireoidiana (metimazol ou propiltiouracil), evitar o uso de outro medicamento da mesma classe; em vez disso, utilizar outra terapia (p. ex., radioiodo, cirurgia).

Potenciais efeitos adversos ou outras características variam entre os dois medicamentos e orientam as indicações para cada um. O metimazol precisa ser administrado apenas uma vez ao dia, o que melhora a adesão ao tratamento. Além disso, quando o metimazol é utilizado em doses inferiores a 20 mg por dia, a agranulocitose é menos comum; com propiltiouracila, a agranulocitose pode ocorrer com qualquer dosagem.

O metimazol foi utilizado de maneira bem-sucedida em gestantes e amamentando sem complicações fetais ou infantis, mas raramente o metimazol foi associado a defeitos gastrointestinais e do couro cabeludo em recém-nascidos e com embriopatia rara. Devido a essas complicações, propiltiouracil é utilizado no 1º trimestre da gestação.

A propiltiouracila é preferível para o tratamento da tireotoxicose, pois as altas dosagens utilizadas (acima de 800 mg por dia) bloqueiam parcialmente a conversão periférica de T4 em T3, além de diminuir a produção na tireoide.

A combinação de alta dose de propiltiouracila e dexametasona, também um potente inibidor da conversão de T4 em T3, pode aliviar os sintomas de hipertireoidismo grave em pacientes com tireotoxicose e restabelecer as concentrações normais de T3 em uma semana.

Betabloqueadores

Sinais e sintomas de hipertireoidismo decorrentes de estímulo adrenérgico podem responder a betabloqueadores; o propranolol é o mais utilizado, mas atenolol e metoprolol podem ser preferíveis.

As manifestações que normalmente respondem a betabloqueadores incluem

  • Taquicardia

  • Tremor

  • Alguns sintomas mentais (p. ex., ansiedade)

  • Atraso palpebral

Ocasionalmente, intolerância ao calor e sudorese, diarreia e miopatia proximal também respondem aos betabloqueadores.

As manifestações que normalmente não respondem a betabloqueadores incluem

  • Bócio

  • Exoftalmo

  • Perda ponderal

  • Sopro

  • Aumento do consumo de oxigênio

  • Aumento dos níveis circulantes de tiroxina

Indica-se propranolol para tireotoxicose (ver tabela Tratamento da tireotoxicose). Reduz rapidamente a frequência cardíaca, geralmente 2 a 3 horas após administração por via oral e minutos após administração IV. O esmolol só deve ser utilizado em uma unidade de terapia intensiva porque requer titulação e monitoramento rigorosos. Os betabloqueadores também são indicados para a taquicardia do hipertireoidismo, especialmente nos idosos, pois os antitireoidianos demoram algumas semanas até se tornarem totalmente eficazes.

Os bloqueadores de canais de cálcio podem controlar as taquiarritmias em pacientes para os quais betabloqueadores sejam contraindicados.

Iodo

Iodo em doses farmacológicas inibe a liberação de T3 e T4 em questão horas e também inibe a organificação do iodo, um efeito transitório com duração de alguns dias a uma semana, após o que a inibição usualmente cessa. O iodo é utilizado para tratamento de emergência da tireotoxicose, para pacientes com hipertireoidismo submetidos a cirurgia não tireoidiana de emergência, e (como ele também diminui a vascularização da tireoide) para preparação pré-operatória de pacientes com hipertireoidismo submetidos à tireoidectomia. Iodo geralmente não é utilizado para tratamento de rotina do hipertireoidismo. A dose habitual é 2 a 3 gotas (100 a 150 mg) de uma solução saturada de iodeto de potássio, por via oral, 3 ou 4 vezes ao dia ou iodeto de sódio em soro fisiológico a 0,9% 1 L 0,5 a 1 g, IV administrada lentamente uma vez ao dia.

Complicações da terapia com iodo incluem inflamação das glândulas salivares, conjuntivite e exantema.

Cirurgia

Indica-se a cirurgia para pacientes com doença de Graves cujo hipertireoidismo tenha reincidido após tratamento com doses antitireoidianas e que se recusam a utilizar Iodo-131, pacientes que não toleram outros medicamentos, pacientes com bócios muito volumosos e alguns pacientes mais jovens com adenoma tóxico e bócio multinodular. A cirurgia pode ser realizada em pacientes idosos com bócios nodulares gigantes.

A cirurgia habitualmente restabelece a função tireoidiana normal. As recidivas pós-operatórias variam de 2 a 16%; o risco de hipotireoidismo está diretamente relacionado com a extensão da cirurgia. Paralisia das pregas vocais e hipoparatireoidismo são complicações incomuns. Solução saturada de iodeto de potássio, 3 gotas (cerca de 100 a 150 mg) por via oral 3 vezes ao dia, deve ser administrada por 10 dias antes da cirurgia para reduzir a vascularização da glândula. Deve-se primeiro administrar metimazol porque o paciente precisa estar eutireoideo antes da administração de iodo. Pode-se acrescentar dexametasona para restaurar rapidamente o eutireoidismo. Os procedimentos cirúrgicos no pescoço anterior são mais difíceis em pacientes que foram previamente submetidos a tireoidectomia ou tratamento com iodo radioativo por causa do tecido cicatricial.

Tratamento da tireotoxicose

O regime de tratamento para tireotoxicose é mostrado na tabela Tratamento da tireotoxicose. Abordar também as causas precipitantes.

Tabela
Tabela

Tratamento da dermopatia infiltrativa

Na dermopatia infiltrativa (na doença de Graves), corticoides tópicos ou injeções de corticoide nas lesões pode diminuir a dermopatia. Às vezes, a dermopatia remite espontaneamente após meses ou anos.

Tratamento da oftalmopatia infiltrativa

Oftalmopatia deve ser tratada em conjunto por endocrinologista e oftalmologista e pode necessitar de selênio, corticoides, irradiação orbital e cirurgia. Tireoidectomia cirúrgica pode ajudar a resolver ou prevenir a progressão da oftalmopatia. Teprotumumabe, um inibidor do receptor do fator de crescimento semelhante à insulina tipo 1 (IGF-1), é uma terapia muito eficaz para a oftalmopatia moderadamente grave (3). Radioiodoterapia pode acelerar a progressão da oftalmopatia quando ela está ativa, e é, portanto, contraindicada nesta fase ativa.

Tratamento do hipertireoidismo subclínico

Em pacientes com hipertireoidismo subclínico que tomam levotiroxina, a redução da dose é o tratamento mais apropriado, a menos que o objetivo do tratamento seja manter os níveis de TSH suprimidos em pacientes com câncer de tireoide.

Indica-se o tratamento para pacientes com hipertireoidismo endógeno subclínico (TSH sérico < 0,1 mUI/L [< 0,1 microUI/mL]), em especial aqueles com fibrilação atrial ou redução da densidade mineral óssea. O tratamento usual é Iodo-131, mas baixas doses de metimazol também são eficazes.

Referências sobre o tratamento

  1. 1. Ross DS, Burch HB, Cooper DS, et al: 2016 American Thyroid Association Guidelines for Diagnosis and Management of Hyperthyroidism and Other Causes of Thyrotoxicosis. Thyroid 26(10):1343–1421, 2016. doi: 10.1089/thy.2016.0229

  2. 2. Shim SR, Kitahara CM, Cha ES, Kim SJ, Bang YJ, Lee WJ: Cancer Risk After Radioactive Iodine Treatment for Hyperthyroidism: A Systematic Review and Meta-analysis. JAMA Netw Open 4(9):e2125072, 2021. doi:10.1001/jamanetworkopen.2021.25072

  3. 3. Douglas RS, Kahaly GJ, Patel A, et al: Teprotumumab for the treatment of active thyroid eye disease. N Engl J Med 382(4):341–352. 2020. doi: 10.1056/NEJMoa1910434

Pontos-chave

  • A etiologia mais comum do hipertireoidismo é a doença de Graves, causada pela síntese hormonal excessiva pela glândula tireoide, estimulada por via autoimune.

  • Outras causas do hipertireoidismo são estimulação excessiva de uma glândula tireoide normal [p. ex., pelo hormônio tireoestimulante (TSH), gonadotropina coriônica humana (hCG), ingestão de iodo ou fármacos contendo iodo], síntese hormonal excessiva por uma tireoide anormal (p. ex., bócio nodular tóxico), liberação excessiva de hormônio tireóideo (p. ex., devido à tireoidite) ou ingestão de quantidades excessivas de hormônio tireóideo.

  • Os sinais e sintomas incluem taquicardia, fadiga, perda ponderal, nervosismo e tremor; pacientes com doença de Graves também podem ter exoftalmia e dermopatia infiltrativa.

  • Os níveis de tiroxina (T4) livre e/ou tri-iodotironina (T3) livre ou total são elevados, e o TSH é suprimido (exceto em casos mais raros das causas hipofisárias do hipertireoidismo).

  • A síntese hormonal pode ser suprimida com metimazol (ou, em certos casos, propiltiouracil) e sintomas adrenérgicos são aliviados com betabloqueadores; o tratamento a longo termo pode exigir ablação da tireoide com iodo radioativo ou cirurgia.

  • A crise tireoidea (ou tempestade tireotóxica) — resultante de hipertireoidismo grave não tratado ou inadequadamente tratado — é uma emergência potencialmente fatal que se manifesta com sintomas graves de hipertireoidismo e pode resultar em colapso ou choque cardiovascular; é tratada com um regime de antitireoidianos, iodo, betabloqueadores, corticoides e suporte hemodinâmico.

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