A síndrome mielodisplásica (SMD) é um grupo de distúrbios clonais das células-tronco hematopoiéticas caracterizados por citopenia periférica, displasia de progenitores hematopoiéticos, hipercelularidade na medula óssea e alto risco de conversão em leucemia mieloide aguda. Os sintomas são atribuíveis à linhagem celular específica mais afetada e podem incluir fadiga, fraqueza, palidez (secundária à anemia), aumento de infecções e febre (secundários à neutropenia) e elevação de sangramento e hematoma (secundários à trombocitopenia). O diagnóstico por hemograma, esfregaço sanguíneo periférico, punção da medula óssea e biópsia. O tratamento com azacitidina pode ajudar; se a leucemia mieloide aguda é incômoda, ela é tratada de acordo com os protocolos usuais.
Não se sabe a quantidade de pessoas diagnosticadas com síndromes mielodisplásicas (SMD) nos Estados Unidos a cada ano. Algumas estimativas colocam essa quantidade em cerca de 10.000, enquanto outras estimam números muito mais altos. A síndrome mielodisplásica é mais comumente diagnosticada em pessoas entre 70 e 80 anos de idade.
Fisiopatologia da síndrome mielodisplásica
Síndromes mielodisplásicas são um grupo de distúrbios clonais de células-tronco hematopoiéticas unificadas pela presença de mutações distintas das células-tronco hematopoiéticas, mais frequentemente nos genes que participam do splicing do RNA. As síndromes mielodisplásicas se caracterizam por uma hematopoiese ineficaz e displásica e compreendem:
Anemia refratária: anemia com reticulocitopenia; medula normal ou hipercelular com hiperplasia eritroide e diseritropoiese; blastos ≤ 5% das células nucleadas da medula
Anemia refratária com sideroblastos em anel: a mesma que a anemia refratária com reticulocitopenia, exceto que os sideroblastos em anel são > 15% das células nucleadas da medula
Citopenia refratária com displasia de multilinhagens: citopenia não restrita a eritrócitos; displasia proeminente dos precursores de leucócitos e megacariócitos
Citopenia refratária com displasia multilinhagem e sideroblastos em anel, com sideroblastos em anel correspondendo a > 15% das células nucleadas da medula
Anemia refratária com excesso de blastos (RAEB): citopenia de ≥ 2 linhas celulares com anomalias morfológicas das células hematopoiéticas; medula hipercelular com diseritropoiese e disgranulopoiese; blastos 5 a 9% (RAEB-I) ou 10 a 19% (RAEB-II) das células nucleadas da medula
Síndrome mielodisplásica não classificada: síndrome mielodisplásica que não se enquadra em nenhuma categoria definida
Síndrome mielodisplásica com del (5q) isolada: tipicamente, anemia e trombocitose graves, com deleção do braço longo do cromossomo 5
Leucemia mielomonocítica crônica (LMMC) e leucemia mielomonocítica juvenil (LMMJ): doenças mielodisplásicas/neoplasias mieloproliferativas mistas; monocitose absoluta (> 1000/mcL [> 1 x 10 9/L]) no sangue; aumento significativo dos precursores de monócitos na medula
Leucemia neutrofílica crônica: caracterizada por neutrofilia e ausência do cromossomo Filadélfia e do gene de fusão BCR-ABL1
A etiologia da síndrome mielodisplásica é desconhecida. O risco aumenta com a idade por causa da aquisição de mutações somáticas que podem promover expansão clonal e dominância de determinada célula hematopoiética, e possivelmente por causa da exposição a toxinas ambientais como benzeno, radiação e quimioterápicos (particularmente nos esquemas prolongados ou intensos e nos esquemas contendo alquilantes, hidroxiureia e/ou inibidores da topoisomerase). É frequente a presença de anomalias cromossômicas (p. ex., deleções, duplicações, anomalias estruturais).
A medula óssea pode ser hipercelular ou hipocelular. A hematopoese ineficaz causa anemia (mais comum), neutropenia, trombocitopenia ou uma combinação dessas citopenias, até ao ponto de ocorrer aplasia de medula. Pacientes com anemia significativa, refratária ou crônica com o tempo desenvolvem sobrecarga de ferro por causa das transfusões e/ou da maior absorção intestinal de ferro.
A produção desordenada de células está também associada às anormalidades morfológicas celulares na medula óssea e no sangue. A hematopoese extramedular pode ocorrer, causando hepatomegalia e esplenomegalia. Pode ocorrer mielofibrose pode durante o curso da síndrome mielodisplásica. A classificação é feita por achados no sangue e na medula óssea, e também por cariótipo e mutação. O clone da síndrome mielodisplásica tende a evoluir para leucemia mieloide aguda.
Sinais e sintomas da síndrome mielodisplásica
Os sintomas da síndrome mielodisplásica tendem a refletir a linhagem de células mais afetadas e podem incluir palidez, fraqueza e fadiga (anemia); febre e infecções (neutropenia); e aumento de hematomas, petéquias, epistaxe e sangramento da mucosa (trombocitopenia). Esplenomegalia e hepatomegalia não são incomuns.
Diagnóstico da síndrome mielodisplásica
Hemograma completo (HC)
Esfregaço periférico
Exame da medula óssea
Suspeita-se de síndrome mielodisplásica em pacientes (especialmente idosos) com anemia refratária, leucopenia ou trombocitopenia. Excluir citopenias secundárias a doenças autoimunes, deficiências de vitamina B12, folato, anemia aplásica idiopática, hemoglobinúria paroxística noturna, deficiência de cobre, toxicidade do zinco ou efeitos farmacológicos adversos.
O diagnóstico é sugerido pelo achado de alterações morfológicas no sangue periférico e na medula óssea em 10 a 20% das células de determinada linhagem, mas é confirmado pela comprovação de anomalias citogenéticas específicas e mutações somáticas. Pode ocorrer hipoplasia da medula óssea.
Anemia é a característica mais comum, associada normalmente a macrocitose e anisocitose. Com os contadores automáticos de células, essas mudanças são indicadas por aumento do volume corpuscular médio e amplitude da distribuição de eritrócitos.
Algum grau de trombocitopenia é normal; no esfregaço sanguíneo, as plaquetas variam em tamanho e algumas aparecem hipogranulares. Pacientes com anemia sideroblástica refratária podem ter trombocitose em combinação com a mutação JAK2 V617F.
A contagem de leucócitos pode estar normal, aumentada ou diminuída. A granularidade citoplasmática do neutrófilo é menor, com anisocitose e números variáveis de grânulos ou, às vezes, nenhum grânulo. Os eosinófilos também podem ter granularidade anormal. As células pseudo-Pelger-Huët (neutrófilos hipossegmentados) podem ser vistas.
A monocitose é característica dos subgrupos da leucemia mielomonocítica crônica e juvenil, e células mieloides imaturas podem ocorrer nesses subgrupos bem menos diferenciados. O padrão citogenético, geralmente, é anormal, com uma ou mais anormalidades citogenéticas clonais frequentemente envolvendo o cromossomo 5 ou 7.
A síndrome de deleção 5q é uma forma singular da síndrome mielodisplásica e ocorre principalmente em mulheres que tipicamente têm anemia macrocítica e trombocitose. A anemia na síndrome de deleção 5q é responsiva àlenalidomida.
Tratamento da síndrome mielodisplásica
Melhora dos sintomas e cuidados de suporte
Quimioterapia
Transplante de células-tronco
Em geral, reserva-se o tratamento para pacientes sintomáticos.
Pacientes sintomáticos geralmente requerem transfusões regulares de sangue e plaquetas. Esses pacientes costumam desenvolver sobrecarga de ferro secundária. Pacientes com síndrome mielodisplásica de baixo risco e nível sérico de ferritina > 1.000 ng/mL (> 1.000 mcg/L) podem se beneficiar da quelação de ferro.
Os agentes estimuladores de eritrócitos (AEE) diminuem a gravidade da anemia em 15 a 20% em pacientes com síndrome mielodisplásica, principalmente em pacientes anêmicos que não dependem de transfusões e têm um nível de eritropoietina < 500 mIU/mL (< 500 IU/L). O tratamento com agentes estimuladores de eritrócitos e o fator estimulador de colônias de granulócitos (G-LCR) pode aumentar a taxa de resposta eritroide para quase 40% na anemia refratária com sideroblastos em anel. Entretanto, em todos os tipos da síndrome mielodisplásica, o tratamento com fatores de crescimento (ESA + G-CSF) não melhora a sobrevida e/ou reduz o risco de transformação em leucemia mieloide aguda. Luspatercept foi bem-sucedido em aumentar o hematócrito em pacientes com SMD de risco muito baixo a intermediário, com sideroblastos em anel nos quais a terapia ESA falhou.
Fármacos utilizados para o tratamento da SMD são
Azacitidina
Decitabina
Lenalidomida
Azacitidina é um análogo nucleosídeo da pirimidina. A azacitidina prolonga a sobrevida geral em comparação com os cuidados de suporte e a quimioterapia convencional. A sobrevida média em pacientes com todos os subgrupos da síndrome mielodisplásica tratados com azacitidina é de 21 meses. Deve-se tratar os pacientes por pelo menos 4 a 6 ciclos e manter pelo tempo que o paciente continuar se beneficiando.
Decitabina também é um análogo nucleosídeo da pirimidina. Induz a remissão em até 43% dos pacientes com síndrome mielodisplásica. Indica-se para o tratamento de pacientes com síndrome mielodisplásica de todos os subtipos.
Azacitidina e decitabina são moduladores epigenéticos que hipometilam o DNA. A hipermetilação de certas regiões do DNA parece prejudicar os genes supressores de tumor e contribuir para a oncogênese na síndrome mielodisplásica.
Lenalidomida é um imunomodulador eficaz para reduzir os requisitos de transfusão de eritrócitos em pacientes com síndrome mielodisplásica com síndrome 5q menos.
Em pacientes com síndrome mielodisplásica hipoplásica, a imunossupressão com ciclosporina com ou sem globulina antitimocítica (ATG) tem sido eficaz, como evidenciado pela melhora da contagem de células e diminuição da necessidade de transfusão.
O transplante alogênico de células-tronco hematopoiéticas ainda é o único tratamento curativo para síndrome mielodisplásica. Indica-se o transplante alogênico de células-tronco hematopoiéticas para pacientes mais jovens clinicamente compatíveis geralmente em grupos de risco intermediário 2 e alto.
Prognóstico da síndrome mielodisplásica (SMD)
O prognóstico da síndrome mielodisplásica depende significativamente da classificação e de qualquer doença associada. Pacientes com síndrome de deleção 5q, anemia refratária ou anemia refratária com sideroblastos anelados têm menor probabilidade de evoluir para as formas mais agressivas.
O Revised International Prognostic Scoring System (IPSS-R) para síndrome mielodisplásica prediz o desfecho dos pacientes com síndrome mielodisplásica. O IPSS-R considera os seguintes fatores de risco:
Citogenética: prognóstico pior associado a anomalias de alto risco ou múltiplas
Porcentagem de blastos na medula óssea: quanto maior a quantidade de blastos (particularmente > 10%), pior o prognóstico
Grau de citopenia: prognóstico pior associado à hemoglobina < 8 g/dL (< 80 g/L), contagem de plaquetas < 50.000/mcL (< 50 × 109/L) e contagem absoluta de neutrófilos (CAN) < 800/mcL (0,8 × 109/L)
O resultado é pior conforme aumenta o número de fatores de risco. Pacientes no grupo de maior risco têm uma sobrevida geral média de 0,8 anos. Pacientes no grupo de menor risco têm uma sobrevida geral média de cerca de 8 anos.
Pontos-chave
A síndrome mielodisplásica é um distúrbio da produção de células hematopoiéticas com proliferação clonal de uma célula hematopoiética anômala.
Os pacientes geralmente têm deficiência de eritrócitos (mais comum), leucócitos e/ou plaquetas.
A transformação em leucemia mieloide aguda é comum.
A azacitidina e decitabina podem melhorar os sintomas e diminuir a taxa de transformação em leucemia aguda.
O transplante de células-tronco é o único tratamento curativo e é o tratamento de escolha para pacientes jovens clinicamente compatíveis.
Informações adicionais
O recurso em inglês a seguir pode ser útil. Observe que este Manual não é responsável pelo conteúdo deste recurso.
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