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Doença celíaca

(Enteropatia a glúten)

PorZubair Malik, MD, Virtua Health System
Reviewed ByMinhhuyen Nguyen, MD, Fox Chase Cancer Center, Temple University
Revisado/Corrigido: modificado mar. 2025
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Visão Educação para o paciente
A doença celíaca é uma doença imunomediada em indivíduos geneticamente suscetíveis causada por intolerância ao glúten, resultando em inflamação da mucosa e atrofia vilosa, o que causa má absorção. Os sintomas geralmenteincluem diarreia e desconforto abdominal. O diagnóstico é feito por biópsias do intestino delgado, mostrando alterações histológicas características, embora não específicas, como atrofia vilosa, que melhoram com dieta sem glúten.

Recursos do assunto

A doença celíaca é um transtorno de má absorção (1).

Referência

  1. 1. Stanciu D, Staykov H, Dragomanova S, et al. Gluten Unraveled: Latest Insights on Terminology, Diagnosis, Pathophysiology, Dietary Strategies, and Intestinal Microbiota Modulations-A Decade in Review. Nutrients. 2024;16(21):3636. Published 2024 Oct 25. doi:10.3390/nu16213636

Etiologia da doença celíaca

A doença celíaca é uma doença hereditária causada pela sensibilidade a uma fração de gliadina do glúten, uma proteína encontrada no trigo; proteínas similares estão presentes na cevada e no centeio. Em um indivíduo geneticamente predisposto, células T sensíveis ao glúten são ativadas quando peptídeos epitopos derivados do glúten são apresentados. A resposta inflamatória provoca a característica atrofia dos vilos da mucosa do intestino delgado.

Epidemiologia da doença celíaca

A doença celíaca pode afetar até 1,4% da população global, com base em exames sorológicos de doadores de sangue (1). A prevalência global da doença celíaca comprovada por biópsia é cerca de metade disso e varia amplamente de 0,4 a 0,8%, dependendo da região.

A doença afeta aproximadamente 7,5% dos parentes de primeiro grau, com uma prevalência maior em mulheres do que em homens (2). Seu início é geralmente na infância, mas pode ocorrer em fase tardia da vida.

Pacientes com outras doenças, como colite linfocítica, síndrome de Down, diabetes mellitus tipo 1 e tireoidite autoimune (Hashimoto) têm risco de desenvolver doença celíaca.

Referências sobre epidemiologia

  1. 1. Singh P, Arora A, Strand TA, et al. Global Prevalence of Celiac Disease: Systematic Review and Meta-analysis. Clin Gastroenterol Hepatol. 2018;16(6):823-836.e2. doi:10.1016/j.cgh.2017.06.037

  2. 2. Singh P, Arora S, Lal S, Strand TA, Makharia GK. Risk of Celiac Disease in the First- and Second-Degree Relatives of Patients With Celiac Disease: A Systematic Review and Meta-Analysis. Am J Gastroenterol. 2015;110(11):1539-1548. doi:10.1038/ajg.2015.296

Sinais e sintomas da doença celíaca

A apresentação clínica varia o suficiente para que não exista uma apresentação típica. Alguns pacientes são assintomáticos ou apenas apresentam sinais de deficiência nutricional. Outros têm sintomas gastrointestinais significativos.

A doença celíaca pode se manifestar na infância depois da introdução de cereais na dieta. A criança tem insuficiência de crescimento, apatia, anorexia, palidez, hipotonia generalizada, distensão abdominal e perda de massa muscular. As fezes são amolecidas, esfareladas, com cor de barro e mal cheirosas. Crianças mais velhas podem apresentar anemia ou dificuldade para crescer normalmente.

Nos adultos, cansaço, fraqueza e anorexia são mais comuns. Diarreia leve e intermitente algumas vezes é o sintoma inicial. A esteatorreia (fezes malcheirosas, pálidas, volumosas e gordurosas) varia de leve a grave (7 a 50 g de gordura/dia). Alguns pacientes têm perda ponderal, raramente o suficiente para ficarem emagrecidos. Anemia, glossite, estomatite angular e úlceras aftoides são geralmente vistas nesses pacientes. Manifestações da deficiência de vitamina D e cálcio (p. ex., osteomalacia, osteopenia, osteoporose) são comuns. Tanto homens como mulheres podem ter fertilidade reduzida; mulheres podem não ter períodos menstruais.

Cerca de 17% dos pacientes têm dermatite herpetiforme, exantema papulovesicular pruriginosa simetricamente distribuída nas áreas extensoras dos cotovelos, joelhos, coxas, ombros e couro cabeludo (1). Esse exantema pode ser induzido por dieta rica em glúten.

Dermatite herpetiforme nos cotovelos
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Esta foto mostra dermatite herpetiforme (com exantema cutâneo papulovesicular pruriginosa simétrica) na superfície extensora dos cotovelos.
© Springer Science+Business Media
Dermatite herpetiforme causada por doença celíaca
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A dermatite herpetiforme caracteriza-se por aglomerados de lesões intensamente pruriginosas, eritematosas e urticariformes, bem como vesículas, pápulas e bolhas normalmente distribuídas de maneira simétrica nas superfícies extensoras.
Imagem cedida por cortesia de the Public Health Image Library of the Centers for Disease Control and Prevention.

Referência sobre sinais e sintomas

  1. 1. Reunala T, Salmi TT, Hervonen K, Kaukinen K, Collin P. Dermatitis Herpetiformis: A Common Extraintestinal Manifestation of Coeliac Disease. Nutrients. 2018;10(5):602. Published 2018 May 12. doi:10.3390/nu10050602

Diagnóstico da doença celíaca

  • Marcadores sorológicos

  • Biópsia do intestino delgado

(Ver também American College of Gastroenterology's 2023 Guidelines Update: Diagnosis and Management of Celiac Disease.)

Suspeita-se do diagnóstico de doença celíaca clinicamente e por alterações laboratoriais sugestivas de má absorção. A incidência familiar é uma pista importante. A doença celíaca deve ser fortemente considerada em pacientes com deficiência de ferro sem sangramento gastrointestinal óbvio.

A confirmação do diagnóstico depende de biópsias do intestino delgado na segunda porção duodenal. Os achados incluem falta ou encurtamento dos vilos (atrofia vilosa), células intraepiteliais com número aumentado e hiperplasia de criptas. Entretanto, esses achados também podem ser encontrados no espru tropical, hipercrescimento bacteriano do intestino delgado grave, enterite eosinofílica, enterite infecciosa (p. ex., giardíase) e linfoma.

Pela falta de especificidade das biópsias, os marcadores sorológicos podem ajudar no diagnóstico. O anticorpo antitransglutaminase tecidual (tTG)-IgA e o anticorpo antiendomísio IgA (EMA — um anticorpo contra uma proteína do tecido conjuntivo intestinal) têm sensibilidade e especificidade superiores a 90% (1). Esses marcadores também podem ser utilizados para a triagem de populações com alta prevalência de doença celíaca, incluindo parentes de 1º grau dos indivíduos afetados e pacientes com doenças que ocorrem em uma frequência maior em associação com a doença celíaca. Caso nenhum dos testes seja positivo, o paciente deve ser submetido à biópsia de intestino delgado. Se ambos forem negativos, a doença celíaca é bastante improvável. A titulação desses anticorpos diminui em pacientes com dieta sem glúten e, portanto, eles são úteis para monitorar a adesão à dieta. Todos os testes diagnósticos sorológicos devem ser feitos para pacientes que seguem uma dieta contendo glúten.

Os níveis séricos de IgA devem ser medidos simultaneamente com o teste de tTG porque a deficiência de IgA pode levar a resultados falso-negativos. Se a deficiência de IgA for detectada, é recomendado o teste de anticorpos IgG contra tTG e peptídeo de gliadina deamidada (DGP).

Teste de histocompatibilidade pode ser útil em situações clínicas selecionadas. Mais de 95% dos pacientes celíacos têm o haplótipo HLA-DQ2 ou HLA-DQ8 (HLA, human leukocyte antigen) (2), embora esses haplótipos não sejam particularmente específicos para a doença celíaca. Mas dada a alta sensibilidade, testes que não conseguem mostrar HLA-DQ2 ou -DQ8 podem efetivamente descartar a doença celíaca quando a biópsia e os marcadores sorológicos são discordantes.

Outras anormalidades laboratoriais ocorrem com frequência e devem ser pesquisadas. Incluem anemia (anemia por deficiência de ferro em crianças e anemia por deficiência de folato em adultos); hipoalbuminemia, hipocalcemia, hipopotassemia, hiponatremia, elevação da fosfatase alcalina e tempo de protrombina prolongado.

Testes para má absorção não são específicos para doença celíaca. Quando esses testes são realizados, achados comuns incluem esteatorreia de 10 a 40 g/dia e resultados anormais nos testes de D-xilose e (na doença ileal grave) testes de Schilling positivos.

A sensibilidade ao glúten não celíaca (SGNC), ou intolerância ao glúten, é uma reação não mediada pelo sistema imunológico à ingestão de glúten. Sintomas gastrointestinais semelhantes são observados em pacientes com doença celíaca, mas as biópsias mostrarão vilosidades normais e os marcadores sorológicos excluirão a doença celíaca (e alergia ao trigo). Existem alguns relatos de marcadores sorológicos não específicos que podem estar elevados na SGNC (3). Em comparação com a doença celíaca, a sensibilidade ao glúten não tem efeitos negativos graves na saúde geral, e seus efeitos são limitados principalmente a sintomas gastrointestinais desconfortáveis. Como na doença celíaca, o tratamento é evitar o glúten.

Dicas e conselhos

  • Considerar veementemente a doença celíaca em pacientes com deficiência de ferro, mas nenhum sangramento gastrointestinal evidente.

Referências sobre diagnóstico

  1. 1. Rubio-Tapia A, Hill ID, Semrad C, et al. American College of Gastroenterology Guidelines Update: Diagnosis and Management of Celiac Disease [published correction appears in Am J Gastroenterol. 2024 Jul 1;119(7):1441. doi: 10.14309/ajg.0000000000002210]. Am J Gastroenterol. 2023;118(1):59-76. doi:10.14309/ajg.00000000000020751. Epub 2022 Sep 21. Erratum in: Am J Gastroenterol. 2024 Jul 1;119(7):1441. doi: 10.14309/ajg.0000000000002210

  2. 2. Kaukinen K, Partanen J, Mäki M, Collin P. HLA-DQ typing in the diagnosis of celiac disease. Am J Gastroenterol. 97(3):695–699, 2002. doi: 10.1111/j.1572-0241.2002.05471.x

  3. 3. Hill ID, Fasano A, Guandalini S, et al. NASPGHAN Clinical Report on the Diagnosis and Treatment of Gluten-related Disorders. J Pediatr Gastroenterol Nutr. 2016;63(1):156-165. doi:10.1097/MPG.0000000000001216

Tratamento da doença celíaca

  • Dieta sem glúten

  • Suplementos para repor quaisquer deficiências graves

(Ver também the American College of Gastroenterology's 2023 Guidelines Update: Diagnosis and Management of Celiac Disease.)

O tratamento da doença celíaca consiste em dieta sem glúten (evitando-se alimentos que contenham trigo, cevada ou centeio). O glúten é amplamente utilizado em alimentos preparados comercialmente, então os pacientes precisam de uma lista detalhada de alimentos a serem evitados. Recomenda-se que os pacientes consultem um nutricionista e participem de um grupo de apoio ao paciente celíaco (grupos em inglês incluem o Beyond Celiac e a Celiac Disease Foundation). A resposta à dieta sem glúten é geralmente rápida e os sintomas se resolvem em 1 a 2 semanas. Entretanto, a ingestão de pequenas quantidades de alimentos contendo glúten pode impedir a remissão ou induzir recaída.

A biópsia do intestino delgado deve ser repetida depois de 3 a 6 meses de uma dieta sem glúten. Caso a anormalidade persista, outras causas de atrofia vilosa (p. ex., linfoma) devem ser consideradas. A diminuição dos sintomas e melhoria da morfologia do intestino delgado é acompanhada por uma redução nos títulos de anticorpos antiglutaminase antitecidual (AAG) e anticorpos antiendomísio (AEM).

Podem-se suplementar vitaminas, minerais e hematínicos, dependendo das deficiências específicas. Casos mais leves podem não necessitar de suplementação, ao passo que os casos mais graves podem requerer reposição. Para adultos, a reposição inclui sulfato ferroso oral, folato oral, suplementos de cálcio e qualquer multivitamínico padrão. Algumas vezes, crianças (mas raramente adultos) seriamente enfermas ou recém-diagnosticadas necessitam de repouso intestinal e NPT.

Se determinado paciente responder mal à retirada do glúten, então o diagnóstico está incorreto ou a doença se tornou refratária. Corticoides podem controlar os sintomas na doença refratária.

Prognóstico da doença celíaca

As complicações incluem doença refratária, espru colagênico e linfomas intestinais.

Os linfomas intestinais afetam 6 a 8% dos pacientes com doença celíaca, geralmente se manifestando depois de 20 a 40 anos da doença. A incidência de outros cânceres gastrointestinais (p. ex., carcinoma do esôfago ou da orofaringe, adenocarcinoma do intestino delgado) também aumenta (1). A adesão à dieta sem glúten pode reduzir de modo significativo o risco de neoplasia.

Se as pessoas em uma dieta livre de glúten sentem-se bem por um longo período de tempo e depois desenvolvem novamente os sintomas da doença celíaca, os médicos costumam fazer uma endoscopia digestiva alta com biópsia do intestino delgado e/ou uma endoscopia por videocápsula para verificar se há sinais de linfoma intestinal.

Referência sobre prognóstico

  1. 1. Ilus T, Kaukinen K, Virta LJ, et al. Incidence of malignancies in diagnosed celiac patients: A population-based estimate. Am J Gastroenterol. 109(9):1471–1477, 2014. doi: 10.1038/ajg.2014.194

Pontos-chave

  • A doença celíaca envolve uma resposta inflamatória ao glúten que provoca atrofia das vilosidades e má absorção.

  • A prevalência varia em diferentes populações em todo o mundo.

  • Cogite o diagnóstico em caso de presença de anticorpos antiglutaminase antiteciduais e anticorpos antiendomísio nos marcadores sorológicos e confirme o diagnóstico com uma biópsia do intestino delgado.

  • Instruir o paciente a seguir uma dieta livre de glúten e repor quaisquer deficiências de vitaminas ou minerais.

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