Várias espécies de cogumelos causam toxicidade quando ingeridos. As toxinas e, portanto, os sintomas variam de acordo com a espécie. A identificação das espécies específicas é difícil, então o tratamento normalmente leva em conta os sintomas.
(Ver também Princípios gerais da intoxicação.)
A diferenciação das espécies tóxicas e atóxicas na natureza é difícil, mesmo para pessoas bem-informadas. Regras folclóricas para diferenciar as espécies tóxicas das não tóxicas não são confiáveis e a mesma espécie pode ter graus variáveis de toxicidade dependendo de onde é colhida. Se o paciente comeu um cogumelo não identificável, a identificação da espécie ajuda a determinar um tratamento específico. Todavia, como um experiente especialista raramente está disponível para consulta imediata, o tratamento do paciente é conduzido pelos sintomas. Se uma amostra do cogumelo não digerida ou decorrente de vômito estiver disponível, poderá ser enviada a um micologista para análise.
Todos os cogumelos tóxicos causam vômitos e dores abdominais; outras manifestações variam significantemente de acordo com o tipo de cogumelo. Em geral, aqueles que causam sintomas rapidamente (em 2 horas) são menos perigosos que os que causam sintomas tardiamente (em geral após 6 horas).
O tratamento para a maioria das intoxicações por cogumelo é sintomático e de suporte. Carvão ativado pode ser útil para limitar a absorção. Inúmeras terapias com antídotos foram tentadas, especialmente para a espécie Amanita, mas nenhuma mostrou resultados sistematicamente positivos.
Sintomas gastrointestinais (GI) precoces
Cogumelos que causam sintomas gastrointestinais precocemente (p. ex., Chlorophyllum molybdites, o pequeno cogumelo marrom que frequentemente cresce em gramados) causam gastroenterite, às vezes com cefaleia ou mialgia. A diarreia pode ser sanguinolenta.
Os sintomas desaparecem geralmente em 24 horas.
O tratamento é de suporte.
Sintomas neurológicos precoces
Cogumelos que causam sintomas neurológicos prematuramente incluem os alucinogênicos, que com frequência são ingeridos recreativamente e contêm psilocibina, um alucinógeno. Os mais comuns são membros do gênero Psilocybe, mas alguns outros gêneros também contêm psilocibina.
Os sintomas se iniciam em 15 a 30 minutos, sendo representados por euforia, aumento da imaginação e alucinações. Taquicardia e hipertensão são comuns, e hiper-reflexia ocorre em algumas crianças; entretanto, raramente há sérias consequências.
Para o tratamento, ocasionalmente indica-se sedação (p. ex., com benzodiazepinas).
Sintomas muscarínicos precoces
Certos cogumelos contêm toxinas que estimulam receptores colinérgicos muscarínicos, mimetizando assim os efeitos da acetilcolina sobre esses receptores (as toxinas não estimulam os receptores colinérgicos nicotínicos). Cogumelos que causam precocemente sintomas muscarínicos são os membros dos gêneros Inocybe e Clitocybe.
Os sintomas podem incluir a síndrome SLUDGE (salivação, lacrimejamento, urinação, defecação, paralisia gastrointestinal e êmese) (ver tabela Síndromes tóxicas comuns), miose, broncorreia, bradicardia, diaforese, sibilos e câimbras. Geralmente são leves, iniciam-se em 30 minutos e regridem em 12 horas.
A atropina é administrada para tratar os efeitos muscarínicos graves (p. ex., dificuldade respiratória, bradicardia).
Sintomas gastrointestinais tardios
Cogumelos que causam sintomas gastrointestinais tardios incluem os membros dos gêneros Amanita, Gyromitra e Cortinarius.
O mais tóxico Amanita é Amanita phalloides, responsável por 95% das mortes por intoxicação. A gastroenterite inicial, que pode surgir de 6 a 12 horas após a ingestão, pode ser grave, podendo haver também hipoglicemia. Os sintomas iniciais diminuem por alguns dias; depois, desenvolve-se insuficiência renal e, às vezes, hepática. Os cuidados iniciais são monitoramento adequado da hipoglicemia e, possivelmente, doses repetidas de carvão ativado. O tratamento de insuficiência hepática pode necessitar de transplante; outras terapias específicas (p. ex., N-acetilcisteína, altas doses de penicilina, silibinina, emulsão lipídica) não são comprovadas.
O cogumelo Amanita smithiana causa gastroenterite tardia, normalmente 6 a 12 horas após a ingestão, e insuficiência renal aguda (geralmente em 1 a 2 semanas após a ingestão), que muitas vezes exige diálise.
O cogumelo Gyromitra pode causar hipoglicemia simultaneamente ou logo após uma gastroenterite. Outras manifestações compreendem toxicidade ao sistema nervoso central (p. ex., convulsões) e, após alguns dias, síndrome hepatorrenal. Os cuidados iniciais são monitoramento adequado da hipoglicemia e, possivelmente, doses repetidas de carvão ativado. Para sintomas neurológicos, indica-se piridoxina, 70 mg/kg IV infusão lenta por 4 a 6 horas (dose máxima diária de 5 g); a insuficiência hepática é tratada com medidas de suporte.
A maioria dos cogumelos Cortinarius é endógena na Europa. A gastroenterite pode durar 3 dias. A insuficiência renal causa sintomas como diminuição do volume urinário e dor no flanco, 3 a 20 dias após a ingestão. A insuficiência renal geralmente desaparece espontaneamente, mas pode ser necessária diálise por um breve período se a função renal não melhorar em 3 a 5 dias; a lesão renal crônica pode ser permanente.
Sintomas musculares tardios
Várias espécies de cogumelos causam miotoxicidade tardia com consequente rabdomiólise que, às vezes, é fatal. Tricoloma spp pode causar fadiga, fraqueza muscular, mialgias e rabdomiólise 24 a 72 horas após a ingestão. Russula spp causaram miotoxicidade semelhante afetando o tecido miocárdico, resultando em taquicardia, hipotensão, arritmias e morte. Não há tratamento específico além dos cuidados de suporte.
Síndromes neurológicas tardias
Alguns cogumelos Clitocibe causam eritromelalgia, que consiste em parestesias e disestesias em queimação graves com edema e eritema das extremidades distais, 24 horas após a ingestão. O ácido nicotínico IV pode ser um tratamento eficaz.
Hapalopilus rutilans causa síndrome tardia (mais de 12 horas após a ingestão) do sistema nervoso central com vertigem, ataxia, distúrbios visuais, sonolência e encefalopatia.
Pleurocybella porrigens causa síndrome tardia (entre 1 a 31 dias) com consciência alterada, convulsões, mioclonia, disartria, encefalopatia, insuficiência respiratória e morte.