Glomerulonefrite pós-infecciosa

PorFrank O'Brien, MD, Washington University in St. Louis
Revisado/Corrigido: jun. 2023
Visão Educação para o paciente

A glomerulonefrite pós-infecciosa ocorre após infecção, geralmente, com uma cepa nefritogênica de estreptococo beta-hemolítico do grupo A. O diagnóstico é sugerido por história e urinálise e confirmado pela baixa concentração de complemento e, algumas vezes, pelos exames de anticorpos. O tratamento é de suporte. O prognóstico é excelente.

Etiologia da glomerulonefrite pós-infecciosa

Glomerulonefrite pós-infecciosa (GNPI), uma síndrome nefrítica, é a causa mais comum de doença glomerular em crianças com 5 a 15 anos de idade, sendo rara em crianças < 2 anos e adultos > 40 anos.

A maioria dos casos é causada por cepas nefritogênicas de estreptococo beta-hemolítico do grupo A, principalmente os tipos 12 (que causa faringite) e 49 (impetigo) e estima-se que 5 a 10% dos pacientes com faringite estreptocócia e cerca de 25% daqueles com impetigo desenvolvam essa condição. O período de latência típico é de 6 a 21 dias entre a infecção e o início da glomerulonefrite, mas a latência pode se prolongar por até 6 semanas.

Patógenos menos comuns incluem bactérias não estreptocócicas, vírus, parasitos, riquétsias e fungos (ver tabela Causas da glomerulonefrite). A endocardite bacteriana e a infecção da derivação ventriculoatrial são condições adicionais importantes nas quais ocorre o desenvolvimento de GNPI; as derivações ventriculoperitoneais são mais resistentes à infecção.

O mecanismo da doença é desconhecido, mas acredita-se que os agentes microbianos se ligam à membrana basal glomerular e ativam primariamente a via alternada do complemento tanto diretamente quanto por interação com anticorpos circulantes, causando lesão glomerular, que pode ser focal ou difusa. Como alternativa, imunocomplexos circulantes podem se precipitar na membrana basal glomerular.

Sinais e sintomas de glomerulonefrite pós-infecciosa

Os sinais e sintomas variam desde hematúria assintomática (em cerca de 50%) e leve proteinúria até nefrite completa com hematúria micro ou macroscópica (cor de coca-cola, marrom, enegrecida, ou francamente hemorrágica), proteinúria (às vezes no intervalo nefrótico), oligúria, edema, hipertensão e insuficiência renal. A febre é pouco usual e sugere infecção persistente.

Insuficiência renal que causa sobrecarga hídrica com insuficiência cardíaca e hipertensão grave exigindo diálise afeta 1 a 2% dos pacientes.

Raramente, a síndrome nefrótica pode persistir após o desaparecimento da doença grave.

As manifestações clínicas de GNPI não estreptocócicas podem mimetizar outras doenças (p. ex., poliarterite nodosa, embolia renal, nefrite intersticial aguda induzida por fármacos antimicrobianos).

Diagnóstico da glomerulonefrite pós-infecciosa

  • Evidência clínica de infecção recente

  • Urinálise tipicamente mostrando eritrócitos dismórficos, cilindros hemáticos, proteinúria, leucócitos e células tubulares renais

  • Em geral, hipocomplementemia

Sugere-se glomerulonefrite pós-infecciosa (GNPI) estreptocócica pela história de faringite ou impetigo mais sintomas típicos de GNPI ou achados incidentais na urinálise. A demonstração da hipocomplementemia é essencialmente confirmatória.

São realizados exames para confirmar o diagnóstico dependendo dos achados clínicos. Anticorpos antiestreptolisina O, anti-hialuronidase e antidesoxirribonuclease (anti-DNAase) são comumente dosados. A creatinina e o complemento sérico (C3 e CH50 [atividade de complemento hemolítica total]) são também geralmente dosados; entretanto, em pacientes com resultados clínicos típicos, alguns testes podem ser omitidos. Algumas vezes, outros testes são realizados. A biópsia confirma o diagnóstico, mas raramente é necessária.

O nível de anticorpo antiestreptolisina O, o exame mais comum de evidência laboratorial de infecção estreptocócica recente, eleva-se e permanece elevado por vários meses em cerca de 75% dos pacientes com faringites e em cerca de 50% dos pacientes com impetigo, mas é inespecífico. O teste para estreptozima, que adicionalmente mede o títulos de anti-hialuronidase, antidesoxirribonuclease e outros títulos detecta 95% de faringite estreptocócica recente e 80% de infecções cutâneas.

Urinálise tipicamente mostra proteinúria (0,5 a 2 g/m2/dia); eritrócitos dismórficos; leucócitos; células tubulares renais; e possivelmente cilindros de eritrócitos, de leucócitos e granulares. Uma correlação aleatória (spot) de proteína/creatinina urinárias normalmente está entre 0,2 e 2 (normal, < 0,2), mas pode às vezes estar no intervalo nefrótico ( 3).

A creatinina sérica pode elevar-se rapidamente, mas geralmente o pico fica abaixo do nível que necessita de diálise.

Os níveis de C3 e CH50 caem durante a doença ativa e retornam ao normal dentro de 6 a 8 semanas em 80% dos casos de GNPI; concentrações de C1q, C2 e C4 são apenas minimamente reduzidas ou permanecem normais. Pode surgir crioglobulinemia e persistir por vários meses, ao passo que os complexos imunes circulantes são detectáveis por apenas algumas semanas.

A biópsia mostra glomérulos aumentados e hipercelulares, inicialmente com infiltração neutrofílica e mais tardiamente com infiltração mononuclear. A hiperplasia de células epiteliais é uma característica comum inicial e transitória. Pode ocorrer microtrombose; se a lesão for grave, as alterações hemodinâmicas devido à proliferação celular e edema do glomérulo causam oligúria, às vezes acompanhada de crescentes epiteliais (formados dentro do espaço de Bowman por hiperplasia das células epiteliais). As células endoteliais e mesangiais se multiplicam e geralmente ocorre grande expansão por edema das regiões mesangiais, as quais contêm neutrófilos, células mortas, debris celulares e depósitos subepiteliais de material eletrodenso.

Amostras de biópsia destacando as características da glomerulonefrite pós-infecciosa
Glomerulonefrite pós-infecciosa (hipercelularidade com infiltrado neutrofílico)
Glomerulonefrite pós-infecciosa (hipercelularidade com infiltrado neutrofílico)

Hipercelularidade endotelial e mesangial com infiltrado neutrofílico (coloração prata de Jones, × 400).

Image provided by Agnes Fogo, MD, and the American Journal of Kidney Diseases' Atlas of Renal Pathology (see www.ajkd.org).

Glomerulonefrite pós-infecciosa (crescentes epiteliais)
Glomerulonefrite pós-infecciosa (crescentes epiteliais)

Crescentes epiteliais são especialmente comuns quando a biópsia é tardia, após insucesso do tratamento. O crescente rompeu a cápsula de Bowman (coloração prata de Jones, × 200).

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Image provided by Agnes Fogo, MD, and the American Journal of Kidney Diseases' Atlas of Renal Pathology (see www.ajkd.org).

Glomerulonefrite pós-infecciosa (coloração imunofluorescente)
Glomerulonefrite pós-infecciosa (coloração imunofluorescente)

Na imagem à esquerda, a imunofluorescência anti-IgG demonstra deposição irregular de IgG nas alças capilares (× 400). Na imagem à direita, a imunofluorescência anti-C3 demonstra deposição granular dispersa de C3 nas paredes capilares (× 400).

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Image provided by Agnes Fogo, MD, and the American Journal of Kidney Diseases' Atlas of Renal Pathology (see www.ajkd.org).

Glomerulonefrite pós-infecciosa (depósitos de complexos imunes)
Glomerulonefrite pós-infecciosa (depósitos de complexos imunes)

Depósitos de imunocomplexos na forma de protuberância (cinza escuro) com extenso processo de apagamento e proliferação endocapilar do pé são vistos na micrografia eletrônica (× 11.250).

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Image provided by Agnes Fogo, MD, and the American Journal of Kidney Diseases' Atlas of Renal Pathology (see www.ajkd.org).

A microscopia com imunofluorescência mostra deposição de imunocomplexos com IgG e complemento em um padrão granular. Na microscopia eletrônica, esses depósitos são semilunares ou em forma de corcunda localizados na área subepitelial. A presença desses depósitos e de pequenos depósitos subendoteliais e mesangiais inicia uma reação inflamatória mediada por complemento que causa lesão glomerular. O principal antígeno provavelmente é a cisteína proteinase de zimogênio exotoxina B (zimogênio/SPE B).

Tratamento da glomerulonefrite pós-infecciosa

  • Cuidados de suporte

O tratamento é de suporte e pode incluir restrição de proteínas, sódio e líquidos na dieta e tratamento do edema e da hipertensão nos casos mais graves. Ocasionalmente, a diálise é necessária. Na prática clínica, o tratamento antimicrobiano parece ser preventivo e é instituído apenas quando dentro de 36 horas de infecção e antes do estabelecimento da glomerulonefrite.

Prognóstico para glomerulonefrite pós-infecciosa

Em 85 a 95% dos pacientes, a função renal é mantida ou recuperada. A taxa de filtração glomerular (TFG) geralmente retorna ao normal em 1 a 3 meses, mas a proteinúria pode persistir por 6 a 12 meses e a hematúria microscópica por vários anos. Alterações transitórias no sedimento urinário podem reincidir com pequenas infecções da via respiratória superior. A proliferação celular renal desaparece dentro de semanas, mas a esclerose residual é comum. Em 10% dos adultos e em 1% das crianças, a glomerulonefrite pós-infecciosa evolui para glomerulonefrite rapidamente progressiva.

Pontos-chave

  • Considerar glomerulonefrite pós-infecciosa em pacientes jovens que tiveram faringite ou impetigo, mais sinais de glomerulonefrite.

  • A biópsia confirma o diagnóstico, mas raramente é necessária; a demonstração de hipocomplementemia é essencialmente confirmatória.

  • O tratamento de suporte geralmente leva à recuperação da função renal.

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