Fibrilação atrial

(Fib A)

PorL. Brent Mitchell, MD, Libin Cardiovascular Institute of Alberta, University of Calgary
Revisado/Corrigido: set. 2024
Visão Educação para o paciente

Fibrilação atrial é ritmo atrial irregular e rápido. Os sintomas incluem palpitação e, às vezes, fraqueza, intolerância a esforço, dispneia e pré-síncope. Em geral, pode haver formação de trombos atriais, acarretando risco significativo de acidente vascular encefálico por embolia. O diagnóstico é realizado por ECG. O tratamento consiste no controle da frequência com medicamentos, prevenção de tromboembolia com anticoagulação e, às vezes, conversão ao ritmo sinusal com medicamentos ou cardioversão.

(Ver também Visão geral das arritmias.)

A fibrilação atrial é iniciada e mantida por múltiplos mecanismos estruturais e eletrofisiológicos. No início de seu curso, os mecanismos dominantes são automatismo focal e microrreentrada ("drivers") que se originam predominantemente de mangas musculares em estruturas venosas adjacentes aos átrios, especialmente as veias pulmonares. O remodelamento elétrico atrial então favorece a formação de circuitos de reentrada funcionais, incluindo reentrada em círculo principal e drivers (organização espaço-temporal de frentes de ativação como ondas espirais reentrantes rápidas e localizadas com propagação centrífuga). Por fim, o remodelamento estrutural atrial, incluindo fibrose atrial, permite a reentrada estrutural (frentes de ondas de ativação reentrante circulando uma barreira anatômica como uma cicatriz), a qual, além de outros fenômenos, produz múltiplas ondaletas atriais de ativações desorganizadas. Na fibrilação atrial, os átrios não se contraem e o sistema de condução AV é bombardeado por muitos estímulos elétricos, acarretando inconsistência de transmissão do impulso e frequência ventricular irregularmente irregular, que normalmente se encontra nos limites de frequência da taquicardia.

A fibrilação atrial é uma das arritmias mais comuns, acometendo entre 3 e 6 milhões de adultos nos Estados Unidos (1). Homens e brancos são mais propensos a ter fibrilação atrial do que mulheres e negros. O risco durante a vida de desenvolver fibrilação atrial é de aproximadamente 25% em homens e 20% em mulheres. A prevalência aumenta com a idade; < 1% aos 50 anos, 1 a 4% aos 65 anos, e 6 a 15% aos 80 anos (2). A fibrilação atrial tende a ocorrer em pacientes com cardiopatia subjacente.

Complicações da fibrilação atrial

As contrações atriais ausentes predispõem à formação de trombos; o risco anual geral de eventos embólicos cerebrovasculares é de 3 a 5% e a fibrilação atrial é responsável por aproximadamente 20 a 25% de todos os acidentes vasculares cerebrais (2). O risco de acidente vascular encefálico é maior em pacientes idosos e em pacientes com estenose moderada a grave, valva cardíaca mecânica, hipertireoidismo, hipertensão, diabetes, disfunção sistólica ventricular esquerda ou eventos tromboembólicos anteriores. Esses fatores são considerados em sistemas de escala que preveem o risco de eventos tromboembólicos futuros, como a escala CHA(2)DS(2)-VASc, que é amplamente utilizada em pacientes sem estenose mitral moderada ou grave ou valva cardíaca mecânica (que precisam anticoagulação, independentemente da escala CHA(2)DS(2)-VASc). Embolias sistêmicas também podem causar disfunção ou necrose em outros órgãos (p. ex., coração, rins, trato gastrointestinal, olhos) ou em um membro.

A fibrilação atrial também pode prejudicar o débito cardíaco; a perda da contração atrial pode diminuir o débito cardíaco em até 20% (3) com frequência cardíaca normal. Essa diminuição geralmente é bem tolerada, exceto quando a frequência ventricular torna-se muito rápida (p. ex., > 140 bpm), ou quando os pacientes já têm débito cardíaco limítrofe ou baixo. Nesses casos, pode haver insuficiência cardíaca.

Referências gerais

  1. 1.  Go AS, Hylek EM, Phillips KA, et al: Prevalence of diagnosed atrial fibrillation in adults: national implications for rhythm management and stroke prevention: the AnTicoagulation and Risk Factors in Atrial Fibrillation (ATRIA) Study. JAMA 285(18):2370–2375, 2001. doi: 10.1001/jama.285.18.2370. 

  2. 2.  Andrade J, Khairy P, Dobrev D, et al: The clinical profile and pathophysiology of atrial fibrillation: relationships among clinical features, epidemiology, and mechanisms. Circ Res 114(9):1453–1468, 2014. doi: 10.1161/CIRCRESAHA.114.303211. 

  3. 3. Klavebäck S, Skúladóttir H, Olbers J, et al: Changes in cardiac output, rhythm regularity, and symptom severity after electrical cardioversion of atrial fibrillation. Scand Cardiovasc J 57(1):2236341, 2023. doi: 10.1080/14017431.2023.2236341 

Etiologia da fibrilação atrial

As causas mais comuns da fibrilação atrial são

As causas menos comuns da fibrilação atrial incluem

Fibrilação atrial isolada é a fibrilação atrial sem causa identificável em pacientes com < 60 anos.

Classificação da fibrilação atrial

Fibrilação atrial paroxística é a fibrilação atrial que dura < 1 semana e que se converteu espontaneamente ou por uma intervenção em ritmo sinusal normal. Os episódios podem recidivar (1).

Fibrilação atrial persistente é a fibrilação atrial contínua que dura > 1 semana (1).

Fibrilação atrial persistente de longa da com duração > 1 ano, mas ainda há a possibilidade de restaurar o ritmo sinusal (1).

Fibrilação atrial permanente não pode ser convertida em ritmo sinusal (o termo também abrange os pacientes para os quais foi tomada a decisão de não tentar a conversão para o ritmo sinusal [1]). Quanto mais tempo a fibrilação atrial estiver presente, menor a probabilidade de conversão espontânea e maior a dificuldade de cardioversão, devido ao remodelamento atrial (alterações na eletrofisiologia atrial induzidas por uma frequência atrial rápida, incluindo diminuição da refratariedade atrial, dispersão espacial da refratariedade atrial, redução da velocidade de condução atrial ou combinações desses fatores). (2).

Referências sobre classificação

  1. 1. Joglar JA, Chung MK, Armbruster AL, et al: 2023 ACC/AHA/ACCP/HRS Guideline for the Diagnosis and Management of Atrial Fibrillation: A Report of the American College of Cardiology/American Heart Association Joint Committee on Clinical Practice Guidelines. Circulation 149(1):e1–e156, 2024. doi: 10.1161/CIR.0000000000001193

  2. 2. Allessie M, Ausma J, Schotten U: Electrical, contractile and structural remodeling during atrial fibrillation. Cardiovasc Res54(2):230–246, 2002. doi: 10.1016/s0008-6363(02)00258-4

Sinais e sintomas da fibrilação atrial

Em geral, a fibrilação atrial é assintomática, mas muitos pacientes apresentam palpitação, desconforto torácico ou sintomas de insuficiência cardíaca (p. ex., fraqueza, atordoamento e dispneia), em especial quando a frequência cardíaca está muito elevada (em geral, 140 a 160 bpm). Os pacientes também podem desenvolver sinais e sintomas de acidente vascular encefálico agudo ou de lesão de outro órgão decorrente de embolia sistêmica.

O pulso é irregularmente irregular, com perda das ondas a do pulso venoso jugular. Pode haver deficit de pulso (a frequência ventricular apical é mais elevada do que aquela palpada no pulso) porque o volume de ejeção do ventrículo esquerdo nem sempre é suficiente para produzir uma onda de pressão periférica para um batimento bem correlacionado com o batimento prévio.

Diagnóstico da fibrilação atrial

  • Eletrocardiografia (ECG)

  • Ecocardiografia

  • Testes de função da tireoide

O diagnóstico da fibrilação atrial é feito por ECG (ver figura Fibrilação atrial). Os achados incluem

  • Ausência de ondas P

  • Presença de ondas f (de fibrilação) entre os complexos QRS; ondas f são irregulares no tempo e na morfologia; ondulações da linha de base com frequências > 300 bpm, geralmente mais bem vistas na derivação V1 e nem sempre aparentes em todas as derivações

  • Intervalos R-R anormalmente irregulares

Fibrilação atrial

Outros ritmos irregulares podem se assemelhar à fibrilação atrial na ECG, mas podem ser distinguidos pela existência de discreta onda P ou ondas de flutter que, às vezes, podem se tornar mais visíveis com manobras vagais. O tremor muscular ou a interferência elétrica pode se assemelhar às ondas f, mas o ritmo ventricular subjacente é regular.

A fibrilação atrial também pode produzir um fenômeno que simula ESV ou a taquicardia ventricular (fenômeno de Ashman). Esse fenômeno costuma ocorrer quando um intervalo R-R curto segue um intervalo R-R longo; o intervalo mais longo prolonga o período refratário do sistema de condução infra-hisiano e o(s) complexo(s) QRS subsequente(s) é(são) conduzido(s) de modo aberrante, geralmente com morfologia de bloqueio de ramo direito (1).

A ecocardiografia e os exames de função tireoidiana são importantes na avaliação clínica (2).

A ecocardiografia é realizada para avaliar os defeitos estruturais cardíacos (p. ex., dilatação atrial esquerda, alterações da movimentação de parede VE sugestivas de isquemia prévia ou atual, valvopatias e cardiomiopatia) e para identificar fatores de risco adicionais para acidente vascular encefálico (p. ex., trombo ou estase sanguínea atrial e placa aórtica complexa). Os trombos atriais têm maior probabilidade de se localizar nos apêndices atriais, sendo detectados melhor pelo ecocardiograma transesofágico do que pela ecocardiograma transtorácico.

Dicas e conselhos

  • A fibrilação atrial com complexo QRS largo pode indicar síndrome de Wolff-Parkinson-White; nesses casos, o uso de medicamentos que bloqueiam o nó atrioventricular pode ser fatal.

Referências sobre diagnóstico

  1. 1. Morton MB, Morton JB, Mond HG: Aberrant Ventricular Conduction: Revisiting an Old Concept. Heart Lung Circ 32(5):555–566, 2023. doi: 10.1016/j.hlc.2023.03.001

  2. 2. Joglar JA, Chung MK, Armbruster AL, et al: 2023 ACC/AHA/ACCP/HRS Guideline for the Diagnosis and Management of Atrial Fibrillation: A Report of the American College of Cardiology/American Heart Association Joint Committee on Clinical Practice Guidelines. Circulation149(1):e1–e156, 2024. doi: 10.1161/CIR.0000000000001193

Tratamento da fibrilação atrial

  • Controle de frequência com medicamentos ou ablação AV do nódulo

  • Algumas vezes, controle de ritmo com cardioversão sincronizada, medicamentos ou ablação de substrato da fibrilação atrial

  • Prevenção de tromboembolia

Pacientes com fibrilação atrial hemodinamicamente instável podem se beneficiar da hospitalização. Pacientes com episódios recorrentes não exigem hospitalização, a menos que outros sintomas sugiram a necessidade disso. Uma vez tratadas as causas, o tratamento da fibrilação atrial inclui o controle da frequência ventricular, controle do ritmo e prevenção de tromboembolia.

Controle da frequência ventricular

Pacientes com fibrilação atrial de qualquer duração exigem o controle da frequência (tipicamente para < 100 bpm em repouso) para controlar os sintomas e prevenir a cardiomiopatia induzida por taquicardia (1).

Nos paroxismos agudos de frequência elevada (p. ex., 140 a 160 bpm), utilizar bloqueadores IV do nodo AV (para doses, ver tabela Antiarrítmicos). ATENÇÃO: os bloqueadores do nó AV não devem ser utilizados em pacientes com a síndrome de Wolff-Parkinson-White quando uma via acessória AV está envolvida (indicado pelo complexo QRS alargado); esses medicamentos podem aumentar a frequência de condução pela via acessória, provocando possivelmente fibrilação ventricular (1).

Os betabloqueadores (p. ex., metoprolol, esmolol) são preferidos se houver suspeita de excesso de catecolaminas (p. ex., em doenças da tireoide ou casos desencadeados por exercício físico) (1).

Os bloqueadores dos canais de cálcio não di-hidropiridínicos (p. ex., verapamil, diltiazem) também são eficazes. A digoxina é menos eficaz, mas pode ser preferível se houver insuficiência cardíaca. Esses medicamentos podem ser utilizados por via oral para controle da frequência a longo prazo (1).

Quando os betabloqueadores, bloqueadores dos canais de cálcio não di-hidropiridínicos e digoxina — separadamente ou em conjunto — não forem efetivos, pode ser necessário o emprego de amiodarona (1). A amiodarona também pode converter a fibrilação atrial em ritmo sinusal; entretanto, essa conversão pode não ser desejável em alguns pacientes que não estão recebendo um anticoagulante (ver Prevenção de tromboembolia).

Controle do ritmo

Em pacientes com insuficiência cardíaca ou outro comprometimento hemodinâmico diretamente atribuível à fibrilação atrial de início recente, está indicada a restauração do ritmo sinusal normal para melhorar o débito cardíaco (1). Em outros casos, a conversão da fibrilação atrial ao ritmo sinusal é ideal, mas as medicamentos antiarrítmicos com capacidade de fazer isso (classes Ia, Ic e III) têm risco de efeitos adversos e podem aumentar a mortalidade. A conversão para o ritmo sinusal não elimina a necessidade de anticoagulação crônica.

Para conversão aguda, podem ser utilizadas cardioversão sincronizada ou medicamentos.

Antes de tentar a conversão, deve-se controlar a frequência ventricular para < 120 bpm, e deve-se administrar anticoagulação para a maioria dos pacientes (ver Prevenção de tromboembolia) porque a conversão da fibrilação atrial, independentemente do método utilizado, aumenta transitoriamente o risco de tromboembolia.

Cardioversão sincronizada (200 joules bifásicos, seguidos de 300 e 360 joules bifásicos conforme necessário) converte a fibrilação atrial em ritmo sinusal normal em aproximadamente 90% dos pacientes, embora a taxa de recorrência seja alta (2). A eficácia e a manutenção do ritmo sinusal após o procedimento melhoram com o uso de antiarrítmicos das classes Ia, Ic ou III, durante 24 a 48 horas antes do procedimento. A cardioversão é mais eficaz em pacientes com fibrilação atrial mais recente, fibrilação atrial isolada ou fibrilação atrial com uma causa reversível; é menos eficaz quando o átrio esquerdo está aumentado (> 5 cm) ou se uma cardiopatia estrutural subjacente significativa estiver presente.

Os medicamentos utilizados para a conversão da fibrilação atrial em ritmo sinusal são os antiarrítmicos das classes Ia (procainamida, quinidina e disopiramida), Ic (flecainida e propafenona) e III (amiodarona, dofetilida, dronedradona, ibutilida e sotalol, vernacalanto) (ver tabela Antiarrítmicos). Uma metanálise relatou taxas de cardioversão de 4 horas específicas de medicamentos variando de aproximadamente 25% a 65%; os agentes mais eficazes foram vernakalante IV, flecainida IV, propafenona IV, flecainida oral e ibutilida IV (3). Exceto pela amiodarona e o sotalol, que também diminuem a taxa de resposta ventricular à fibrilação atrial, esses medicamentos não devem ser utilizados até que a frequência tenha sido controlada.

Esses medicamentos conversores em apresentação oral também são utilizados para a manutenção do ritmo sinusal (com ou sem cardioversão prévia). Uma revisão Cochrane descobriu que a eficácia da medicação antiarrítmica variou de 33% a 57%, sendo a amiodarona a mais eficaz (4). No entanto, a medicação antiarrítmica para esse propósito foi associada a mais eventos adversos, incluindo mortalidade. Para a fibrilação atrial paroxística que ocorre sempre ou quase sempre em repouso ou durante o sono, quando o tônus vagal é elevado, os medicamentos com efeitos vagolíticos (p. ex., disopiramida) podem ser particularmente efetivos. Previne-se melhor a fibrilação atrial induzida por esforço com um betabloqueador.

Para certos pacientes com fibrilação atrial paroxística recorrente, que conseguem identificar o início da arritmia pelos sintomas, alguns médicos indicam dose única de flecainida (300 mg para pacientes 70 kg; caso contrário, 200 mg) ou propafenona (600 mg para pacientes 70 kg; caso contrário, 450 mg) que o paciente pode levar consigo e tomar quando ocorrer a palpitação (abordagem "pill-in-the-pocket") (5). Essa conduta deve ser limitada a pacientes sem disfunção do nó SA ou AV, bloqueio de ramo, prolongamento do intervalo QT, síndrome de Brugada ou doença cardíaca estrutural. Seu principal risco (estimado em 1%) é a possibilidade de converter a fibrilação atrial em um ritmo mais lento de flutter atrial com condução 1:1 e frequência de 200 a 240 bpm (5). A frequência dessa complicação pode ser reduzida coadministrando um medi-hicamento de supressão nodal AV (p. ex., um betabloqueador ou um antagonista do cálcio não di-hidropiridínico).

Os inibidores da enzima conversora da angiotensina (ECA), os bloqueadores dos receptores da angiotensina II (BRA) e os bloqueadores da aldosterona podem atenuar a fibrose miocárdica que fornece substrato para a fibrilação atrial, mas o papel desses medicamentos no tratamento de rotina da fibrilação atrial ainda não foi definido.

Procedimentos de ablação para fibrilação atrial

Para pacientes que não são candidatos a controle de frequência ou controle de ritmo ou nos quais essas abordagens foram malsucedidas, pode-se realizar ablação do nó AV para provocar bloqueio cardíaco completo; a inserção de um marca-passo permanente é então necessária. A ablação da via nodal AV lenta (modificação do nó AV) reduz o número de impulsos atriais que alcançam os ventrículos e elimina a necessidade de marca-passo, mas essa abordagem é considerada menos efetiva do que a ablação completa e raramente é utilizada.

Os procedimentos de ablação por catéter que alcançam isolamento elétrico das veias pulmonares do átrio esquerdo podem prevenir a fibrilação atrial sem causar bloqueio AV. O isolamento das veias pulmonares tem menor taxa de sucesso (60 a 80%) e maior taxa de complicações maiores (1 a 5%) do que os procedimentos de ablação utilizados para tratar arritmias supraventriculares (6). Estudos randomizados em pacientes que não receberam antiarrítmicos mostraram uma taxa de recorrência mais baixa para taquiarritmias atriais com ablação (aproximadamente 30%) do que com farmacoterapia (aproximadamente 50%) após 17 meses de acompanhamento e nenhuma diferença significativa nos principais eventos adversos (7). Além disso, a metanálise sugere que, em comparação à terapia medicamentosa, a ablação por catéter reduz a mortalidade por todas as causas, mais evidente em pacientes com insuficiência cardíaca coexistente, e reduz as hospitalizações em pacientes com fibrilação atrial paroxística e naqueles com fibrilação atrial persistente com ou sem insuficiência cardíaca (8). Portanto, as diretrizes conferem à ablação por catéter para controle do ritmo uma indicação de classe I em pacientes com fibrilação atrial nos quais a abordagem de controle do ritmo com medicação antiarrítmica falhou, em pacientes com insuficiência cardíaca coexistente com fração de ejeção reduzida, e em pacientes selecionados como terapia de primeira linha precocemente no curso da fibrilação atrial (1).

Há também um procedimento de ablação cirúrgica de coração aberto para o tratamento de fibrilação atrial (o procedimento do labirinto), mas é reservado principalmente para pacientes com outra indicação para cirurgia cardíaca aberta em vez de utilizado como um procedimento isolado (9).

Ensaios clínicos randomizados abordando a necessidade de anticoagulação oral de longo prazo após um procedimento de ablação aparentemente bem-sucedido estão em andamento. As diretrizes recomendam anticoagulação de longo prazo após a ablação utilizando as mesmas diretrizes que para os pacientes que não tiveram ablação, independentemente do sucesso aparente do procedimento (1).

Prevenção de tromboembolia

São tomadas medidas a longo prazo para prevenir o tromboembolia em certos pacientes com fibrilação atrial dependendo do seu risco estimado de acidente vascular encefálico versus risco de sangramento (p. ex., de acordo com a escala CHA(2)DS(2)-VASc [8] e a ferramenta HAS-BLED [10]).

Tabela
Tabela

As diretrizes para a terapia antitrombótica na fibrilação atrial diferem de acordo com as regiões. As diretrizes nos Estados Unidos são (1).

Recomenda-se terapia anticoagulante oral de longo prazo para pacientes com fibrilação atrial com o seguinte (recomendação classe I):

  • Estenose mitral reumática moderada a grave

  • Valva cardíaca artificial mecânica (com ou sem fibrilação atrial)

  • Fibrilação atrial não valvar (i.e., estenose mitral reumática moderada a grave ausente ou valva cardíaca mecânica) com classificações CHA(2)DS(2)-VASc de ≥ 2 em homens e ≥ 3 em mulheres

  • Cardiomiopatia hipertrófica

O risco anual de tromboembolia para esses pacientes é ≥ 2%.

A terapia anticoagulante oral de longo prazo é razoável para (recomendação da classe IIa):

  • Pacientes com fibrilação atrial não valvar e classificações CHA(2)DS(2)-VASc de 1 em homens e 2 em mulheres

O risco anual de tromboembolia para esses pacientes é de 1 a 2%.

Terapia anticoagulante oral de longo prazo não é recomendada para pacientes com:

  • Fibrilação atrial não valvar e escala CHA (2) DS(2)-VASc de 0 em homens e 1 em mulheres

O risco anual de tromboembolia para esses pacientes é < 1%.

As seguintes recomendações se aplicam aos meios de anticoagulação:

  • Pacientes com fibrilação atrial e valva(s) mecânica(s) cardíaca(s) são tratados com varfarina (recomendação classe I).

  • Pacientes com fibrilação atrial e estenose mitral reumática moderada a grave são tratados com varfarina (recomendação classe I).

  • Pacientes com fibrilação atrial não valvar que são tratados com anticoagulante oral recebem varfarina, apixabana, dabigatrana, edoxabana ou rivaroxabana (recomendação classe I).

  • Quando administra-se varfarina, a razão normalizada internacional (RNI) alvo é 2,0 a 3,0.

  • Para pacientes elegíveis para terapia anticoagulante com varfarina (ou outro antagonista da vitamina K) ou um anticoagulante não antagonista da vitamina K, como apixabana, dabigatrana, edoxabana ou rivaroxabana, os anticoagulantes antagonistas de vitamina K são preferíveis (recomendação classe I).

  • A monoterapia com AAS não é recomendada para a prevenção de tromboembolia.

Essas diretrizes gerais são alteradas em pacientes com insuficiência renal mais do que moderada, com diminuição do entusiasmo pela anticoagulação, à medida que a insuficiência renal progride dos estágios 1, 2 e 3 da doença renal crônica (TFGe > 30 mL/minuto [recomendação classe I]), até a insuficiência renal crônica doença estágio 4 (TFGe de 15 a 30 mL/minuto [recomendação classe IIa]), para doença renal crônica estágio 5 (TFGe < 15 mL/minuto ou em diálise [recomendação classe IIb]).

Como 90% dos trombos atriais esquerdos em pacientes com fibrilação atrial não valvar estão localizados no apêndice atrial esquerdo, a prevenção de AVE nesses pacientes pode ser alcançada por ligadura cirúrgica do apêndice atrial esquerdo ou por oclusão com um dispositivo transcatéter. As diretrizes fornecem uma indicação de classe IIa para o fechamento do apêndice atrial esquerdo em pacientes com fibrilação atrial e uma escala CHA(2)DS(2)-VASc de ≥ 2 quando a terapia antitrombótica apropriada é contraindicada e uma indicação de classe IIb nesses pacientes com base na preferência do paciente (1).

É possível estimar o risco de sangramento de um paciente específico com quaisquer ferramentas prognósticas, das quais a mais utilizada é o HAS-BLED (11) (ver tabela Ferramenta HAS-BLED para prever o risco de sangramento em pacientes com fibrilação atrial). A escala HAS-BLED é mais adequada para identificar as condições que, se modificadas, reduzem o risco de sangramento do que para identificar os pacientes com risco mais alto de sangramento que não devem receber anticoagulação.

Tabela
Tabela

Prevenção de tromboembolia em pacientes submetidos a cardioversão

As diretrizes sugerem as seguintes medidas para prevenção no momento da cardioversão (1):

Anticoagulação em pacientes submetidos a cardioversão

* Pode-se administrar anticoagulante por < 3 semanas se a ETE não apresentar trombo atrial.

ETE = ecocardiografia transesofágica (para excluir trombo atrial esquerdo).

  • Se houver fibrilação atrial > 48 horas, geralmente os pacientes devem receber um anticoagulante oral durante > 3 semanas antes da cardioversão química ou elétrica. Se a cardioversão imediata é desejável, recomenda-se ecocardiografia transesofágica (ETE) para excluir trombo atrial antes da cardioversão. Pode-se administrar anticoagulação por menos tempo antes da conversão se a ETE não apresentar trombo atrial esquerdo. Deve-se manter a anticoagulação por pelo menos 4 semanas após a cardioversão (cada uma é uma recomendação classe I).

  • Se houver fibrilação atrial < 48 horas em pacientes com escala CHA(2)DS(2)-VASc ≥ 2 e anticoagulação terapêutica por > 3 semanas não foi realizada, deve-se realizar a ETE para descartar trombo atrial esquerdo antes da cardioversão (recomendação classe IIb).

  • Se houver fibrilação atrial < 12 horas e os pacientes tiverem escala CHA(2)DS(2)-VASc de 0 a 1 (ver tabela Escala CHA(2)DS(2)-VASc), o benefício da ETE pré-cardioversão e da anticoagulação pericardioversão é incerto (o que implica, sem explicitamente afirmar, que o último grupo de pacientes pode sofrer cardioversão sem uma ETE pré-cardioversão ou anticoagulação pré-cardioversão.

Dicas e conselhos

  • Quando possível, administrar anticoagulação antes de tentar converter a fibrilação atrial ao ritmo sinusal.

  • A conversão para o ritmo sinusal não elimina a necessidade de anticoagulação crônica em pacientes que atendem os critérios para ela.

Referências sobre tratamento

  1. 1.  Joglar JA, Chung MK, Armbruster AL, et al: 2023 ACC/AHA/ACCP/HRS Guideline for the Diagnosis and Management of Atrial Fibrillation: A Report of the American College of Cardiology/American Heart Association Joint Committee on Clinical Practice Guidelines. Circulation 149(1):e1–e156, 2024. doi: 10.1161/CIR.0000000000001193 

  2. 2. Crijns HJ, Weijs B, Fairley AM, et al: Contemporary real life cardioversion of atrial fibrillation: Results from the multinational RHYTHM-AF study. Int J Cardiol 172(3):588–594, 2014. doi:10.1016/j.ijcard.2014.01.099

  3. 3. Tsiachris D, Doundoulakis I, Pagkalidou E, et al: Pharmacologic Cardioversion in Patients with Paroxysmal Atrial Fibrillation: A Network Meta-Analysis. Cardiovasc Drugs Ther 35(2):293–308, 2021. doi: 10.1007/s10557-020-07127-1 

  4. 4. Valembois L, Audureau E, Takeda A, et al: Antiarrhythmics for maintaining sinus rhythm after cardioversion of atrial fibrillation. Cochrane Database Syst Rev 9(9):CD005049, 2019. doi: 10.1002/14651858.CD005049.pub5

  5. 5. Ibrahim OA, Belley-Côté EP, Um KJ, et al: Single-dose oral anti-arrhythmic drugs for cardioversion of recent-onset atrial fibrillation: a systematic review and network meta-analysis of randomized controlled trials. Europace 23(8):1200–1210, 2021. doi: 10.1093/europace/euab014

  6. 6. Voskoboinik A, Moskovitch JT, Harel N, Sanders P, Kistler PM, Kalman JM: Revisiting pulmonary vein isolation alone for persistent atrial fibrillation: A systematic review and meta-analysis. Heart Rhythm 14(5):661–667, 2017. doi:10.1016/j.hrthm.2017.01.003

  7. 7. Razzack AA, Lak HM, Pothuru S, et al: Efficacy and Safety of Catheter Ablation vs Antiarrhythmic Drugs as Initial Therapy for Management of Symptomatic Paroxysmal Atrial Fibrillation: A Meta-Analysis. Rev Cardiovasc Med 23(3):112, 2022. doi: 10.31083/j.rcm2303112

  8. 8. Ravi V, Poudyal A, Lin L, et al: Mortality benefit of catheter ablation versus medical therapy in atrial fibrillation: An RCT only meta-analysis. J Cardiovasc Electrophysiol 33(2):178–193, 2022. doi: 10.1111/jce.15330

  9. 9. Guo Q, Yan F, Ouyang P, et al: Bi-atrial or left atrial ablation of atrial fibrillation during concomitant cardiac surgery: A Bayesian network meta-analysis of randomized controlled trials. J Cardiovasc Electrophysiol 32(8):2316–2328, 2021. doi:10.1111/jce.15127

  10. 10. Lip GY, Nieuwlaat R, Pisters R, et al: Refining clinical risk stratification for predicting stroke and thromboembolism in atrial fibrillation using a novel risk factor-based approach: the Euro Hart Survey on atrial fibrillation. Chest 137(2):263–272, 2010. doi: 10.1378/chest.09-1584

  11. 11. Pisters R, Lane DA, Nieuwlaat R, et al: A novel user-friendly score (HAS-BLED) to assess 1-year risk of major bleeding in patients with atrial fibrillation: the Euro Heart Survey. Chest 138(5):1093–1100, 2010. doi: 10.1378/chest.10-0134 

Pontos-chave

  • Fibrilação atrial é um ritmo auricular anormalmente irregular que pode ser episódico ou contínuo.

  • Complexos QRS são tipicamente estreitos; um complexo aumentado ocorre por defeitos na condução intraventricular ou síndrome de Wolff-Parkinson-White.

  • Os pacientes devem passar por ECG, ecocardiografia e testes de função tireoidiana.

  • A frequência cardíaca deve ser controlada tipicamente para < 100 bpm em repouso; medicamentos de primeira linha incluem betabloqueadores ou bloqueadores dos canais de cálcio não di-hidropiridínicos (p. ex., verapamil e diltiazem).

  • A restauração do ritmo sinusal não elimina a necessidade de anticoagulação, mas pode ajudar os pacientes com sintomas persistentes ou comprometimento hemodinâmico (p. ex., insuficiência cardíaca); cardioversão sincronizada ou medicamentos podem ser utilizados.

  • É necessária anticoagulação por via oral a longo prazo para pacientes com fatores de risco de tromboembolia.

  • Anticoagulação é normalmente necessária antes da cardioversão.

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