Endoscópios flexíveis equipados com câmeras de vídeo podem ser utilizados para visualizar o trato digestório superior, da faringe às porções iniciais do duodeno e o trato digestório inferior do ânus até o ceco (e algumas vezes o íleo terminal). As partes mais profundas do jejuno e do íleo podem ser avaliadas com enteroscópios especializados, mais longos (p. ex., enteroscopia com duplo balão).
Vários outros procedimentos diagnósticos e intervenções terapêuticas podem ser realizados endoscopicamente. O potencial para combinar diagnóstico e terapia em um único procedimento dá à endoscopia uma vantagem significativa sobre outros procedimentos que fornecem somente imagens (p. ex., estudos radiológicos contrastados, TC, RM) e frequentemente supera o alto custo dos equipamentos e a necessidade de sedação.
Esta foto mostra a visualização endoscópica de um esôfago normal.
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Esta foto mostra uma visualização endoscópica do fundo do estômago normal com pregas gástricas características.
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Esta foto mostra visualização endoscópica do colo saudável com parede muscular semelhante a anel.
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Em geral, a endoscopia requer sedação IV. Exceções são anuscopia e sigmoidoscopia, que normalmente não exigem sedação.
A taxa geral de complicações durante procedimentos endoscópicos convencionais é baixa, com estimativas inferiores a 0,3% e um risco ainda menor de mortalidade (1). As complicações usualmente estão relacionadas com medicamentos (p. ex., depressão respiratória); as complicações do procedimento em si (p. ex., aspiração, perfuração, sangramento) são menos comuns.
O risco de outras complicações, como infarto do miocárdio, acidente vascular encefálico e eventos pulmonares graves, após a colonoscopia de rastreamento ou controle, é baixo, não sendo maior do que após outros procedimentos de baixo risco (p. ex., injeção ou broncoaspiração articular, litotripsia, artroscopia, cirurgia do túnel do carpo ou de catarata), (2, 3).
Referências gerais
1. Kothari ST, Huang RJ, Shaukat A, et al. ASGE review of adverse events in colonoscopy. Gastrointest Endosc. 2019;90(6):863-876.e33. doi:10.1016/j.gie.2019.07.033
2. Wang L, Mannalithara A, Singh G, et al. Low rates of gastrointestinal and non-gastrointestinal complications for screening or surveillance colonoscopies in a population-based study. Gastroenterology. 154(3):540–555, 2018. doi: 10.1053/j.gastro.2017.10.006
3. Vargo, JJ 2nd. Sedation-related complications in gastrointestinal endoscopy. Gastrointest Endosc Clin N Am. 25(1):147–158, 2015. doi: 10.1016/j.giec.2014.09.009
Endoscopia gastrointestinal diagnóstica
Os procedimentos diagnósticos por endoscopia convencional incluem a coleta de amostras teciduais e celulares por escovação ou por biópsia com pinça. Vários tipos de endoscópios apresentam funções diagnósticas e terapêuticas adicionais. Endoscópios equipados com ultrassom podem avaliar o fluxo sanguíneo ou fornecer imagens de lesões da mucosa, da submucosa ou extraluminais. A ultrassonografia endoscópica pode fornecer informações (p. ex., profundidade e extensão das lesões) que não são possíveis pela endoscopia tradicional. Além disso, a punção aspirativa por agulha fina tanto das lesões intraluminais como das extraluminais pode ser feita com a orientação por ultrassonografia endoscópica.
Os endoscópios convencionais não são capazes de visualizar a maior parte do intestino delgado. A enteroscopia por cápsula utiliza um endoscópio mais longo que pode ser avançado manualmente ao duodeno distal ou jejuno proximal.
Enteroscopia assistida por balão
A enteroscopia assistida por balão fornece uma avaliação mais profunda do intestino delgado que vai além da avaliação pela enteroscopia por cápsula. Ela utiliza um endoscópio com 1 ou 2 balões infláveis ligados a um overtube conectado ao endoscópio. Quando o endoscópio é avançado até a maior distância possível, o balão é inflado e ancorado na mucosa intestinal. Retirar o balão inflado puxa o intestino delgado ao longo do overtube como uma manga, desse modo encurtando e esticando o intestino delgado e permitindo um maior avanço do endoscópio.
É possível fazer enteroscopia anterógrada (caudal) ou retrógrada (cefálica) com balão permitindo o exame e a potencial intervenção terapêutica em todo o intestino delgado.
Colonoscopia de rastreamento
A colonoscopia de rastreamento é geralmente recomendada para pacientes com 45 anos ou mais e para todos os pacientes com alto risco de câncer de cólon.
Para informações detalhadas sobre as recomendações de rastreamento de câncer colorretal, ver o tópico Testes de rastreamento de câncer colorretal.
Endoscopia gastrointestinal terapêutica
Procedimentos endoscópicos terapêuticos incluem
Remoção de corpos estranhos
Hemostasia por colocação de hemoclips, injeção de medicamentos, sprays hemostáticos, coagulação térmica, fotocoagulação a laser, bandagem varicosa ou escleroterapia
Diminuição do volume de tumores por laser ou eletrocoagulação bipolar
Terapia ablativa das lesões pré-malignas
Remoção de pólipos
Ressecção de tecido mucoso e/ou submucoso
Dilatação de membranas ou estenoses
Implant de stent
Redução do vólvulo ou intussuscepção
Descompressão da dilatação colônica aguda ou subaguda
Posicionamento do tubo de alimentação
Drenagem dos cistos pancreáticos
Procedimentos bariátricos endoscópicos (p. ex., colocação de balões intragástricos, gastrectomia endoscópica vertical)
Miotomia endoscópica (p. ex., para acalasia esofágica e gastroparesia refratária)
Fundoplicatura transoral sem incisão
Contraindicações à endoscopia gastrointestinal incluem
Contraindicações absolutas à endoscopia incluem
Choque
Infarto agudo do miocárdio
Peritonite
Perfuração aguda
Colite fulminante
As contraindicações relativas incluem a falta de cooperação do paciente, o coma (a menos que o paciente esteja entubado) e as arritmias cardíacas ou isquemia miocárdica recente.
Pacientes tomando anticoagulantes ou em tratamento regular com anti-inflamatórios não esteroides podem fazer a endoscopia diagnóstica com segurança. Entretanto, se houver a possibilidade de realização de biópsia ou terapia térmica, deve-se interromper o uso de anticoagulantes durante um intervalo apropriado antes do procedimento (1). Medicamentos contendo ferro utilizados por via oral devem ser interrompidos 4 a 5 dias antes da colonoscopia, já que alguns vegetais de folhas verde interagem com o ferro e formam um resíduo bastante aderente de difícil remoção pelo preparo do colo, que interfere na visualização.
A American Heart Association e o American College of Cardiology (ACC/AHA) não mais recomendam profilaxia para endocardite para pacientes com endoscopia gastrointestinal de rotina (2). A American Society for Gastrointestinal Endoscopy também não recomenda a profilaxia com antibióticos antes de qualquer procedimento gastrointestinal para os pacientes com enxertos vasculares sintéticos ou outros dispositivos cardiovasculares não valvares (p. ex., dispositivos eletrônicos implantáveis) ou para pacientes com prótese ortopédica (3). No entanto, antibióticos são utilizados antes da colocação de uma gastrostomia endoscópica percutânea (GEP) para prevenir infecção no local e frequentemente antes da colangiopancreatografia retrógrada endoscópica (CPRE) ou outros procedimentos que acessam o sistema hepatobiliar.
Para pacientes em diálise peritoneal, a drenagem do abdome antes da colonoscopia é recomendada para prevenir peritonite (4). O benefício dos antibióticos pré-colonoscopia em pacientes em diálise peritoneal para prevenir peritonite é desconhecido (4, 5).
Referências sobre contraindicações
1. Acosta RD, Abraham NS, Chandrasekhara V, et al. The management of antithrombotic agents for patients undergoing GI endoscopy. Gastrointest Endosc. 83(1):3–16, 2016. doi: 10.1016/j.gie.2015.09.035. Clarification and additional information. Gastrointest Endosc. 83(3):678, 2016.
2. Otto CM, Nishimura RA, Bonow RO, et al. 2020 ACC/AHA Guideline for the Management of Patients With Valvular Heart Disease: A Report of the American College of Cardiology/American Heart Association Joint Committee on Clinical Practice Guidelines [published correction appears in Circulation. 2021 Feb 2;143(5):e229. doi: 10.1161/CIR.0000000000000955] [published correction appears in Circulation. 2023 Aug 22;148(8):e8. doi: 10.1161/CIR.0000000000001177] [published correction appears in Circulation. 2023 Nov 14;148(20):e185. doi: 10.1161/CIR.0000000000001190] [published correction appears in Circulation. 2024 Sep 17;150(12):e267. doi: 10.1161/CIR.0000000000001284]. Circulation. 2021;143(5):e72-e227. doi:10.1161/CIR.0000000000000923
3. ASGE Standards of Practice Committee, Khashab MA, Chithadi KV, et al. Antibiotic prophylaxis for GI endoscopy. Gastrointest Endosc. 81(1):81–89, 2015. doi: 10.1016/j.gie.2014.08.008
4. Li PK, Chow KM, Cho Y, et al. ISPD peritonitis guideline recommendations: 2022 update on prevention and treatment [published correction appears in Perit Dial Int. 2023 May;43(3):279. doi: 10.1177/08968608231166870] [published correction appears in Perit Dial Int. 2024 May;44(3):223. doi: 10.1177/08968608241251453]. Perit Dial Int. 2022;42(2):110-153. doi:10.1177/08968608221080586
5. Yip T, Tse KC, Lam MF, et al. Risks and outcomes of peritonitis after flexible colonoscopy in CAPD patients. Perit Dial Int. 2007;27(5):560-564.
Preparação para endoscopia gastrointestinal
O preparo de rotina para a endoscopia é feito pela suspensão de alimentos sólidos por 8 horas e líquidos por 2 a 4 horas antes do procedimento (ver as diretriezes da American Society of Anesthesiologists Task Force de 2017 [1] e 2023 [2]). Além disso, a colonoscopia requer preparo do colo. Pode-se utilizar uma variedade de métodos, mas todos tipicamente incluem uma dieta líquida exclusiva por 24 a 48 horas e algum tipo de laxante, com ou sem enemas associados (3). É comum fazer o preparo intestinal utilizando grande volume de solução contendo eletrólitos. Essas soluções de preparo estão disponíveis em diferentes volumes (tipicamente variando de 2 L a 4 L) e têm graus variados de eficácia. A administração do preparado em várias etapas, isto é, como administrar metade do volume no dia anterior ao procedimento e metade do volume no dia do procedimento, melhora a adesão do paciente, a qualidade do exame e a taxa de detecção de adenoma (4).
Os pacientes que não toleram esse preparado para limpeza do intestino podem tomar citrato de magnésio, fosfato de sódio, polietilenoglicol, lactulose ou outros laxantes. Enemas podem ser realizados com fosfato de sódio ou água. Os preparados com fosfatos não devem ser utilizados em pacientes com insuficiência renal.
Os agonistas de GLP-1, como a liraglutida e a semaglutida, surgiram como agentes terapêuticos significativos para o tratamento da obesidade e do diabetes tipo 2. Contudo, sua administração antes de procedimentos endoscópicos exige uma consideração cuidadosa devido ao potencial impacto na motilidade gastrointestinal. Esses agentes podem induzir alterações no esvaziamento gástrico, levantando preocupações sobre o risco de esvaziamento gástrico retardado e suas implicações para a sedação e a anestesia durante os procedimentos. Portanto, é prudente que os profissionais de saúde avaliem o momento da administração de GLP-1 em relação às intervenções endoscópicas programadas. As diretrizes apoiam a suspensão de medicamentos GLP-1 de dose semanal na semana anterior à endoscopia (5). Além disso, a avaliação individualizada de fatores específicos do paciente, incluindo a natureza do procedimento e o estado geral de saúde, é essencial para garantir a segurança e a eficácia ideais, pois ainda não há consenso sobre a duração ideal em que esses medicamentos precisam ser suspensos para minimizar o risco de aspiração (6, 7). Em centros ou cenários clínicos onde estiver disponível, a ultrassonografia abdominal para avaliar a presença de conteúdo gástrico pode mitigar o risco de aspiração e ajudar a orientar as discussões sobre os riscos e benefícios do procedimento (5). A adesão a esses princípios pode ajudar a mitigar complicações e melhorar os resultados dos procedimentos nessa população de pacientes.
Referências de preparo
1. Practice Guidelines for Preoperative Fasting and the Use of Pharmacologic Agents to Reduce the Risk of Pulmonary Aspiration. Application to Healthy Patients Undergoing Elective Procedures: An Updated Report by the American Society of Anesthesiologists Task Force on Preoperative Fasting and the Use of Pharmacologic Agents to Reduce the Risk of Pulmonary Aspiration. Anesthesiology. 126(3):376–393, 2017. doi: 10.1097/ALN.0000000000001452
2. Joshi GP, Abdelmalak BB, Weigel WA, et al. 2023 American Society of Anesthesiologists practice guidelines for preoperative fasting: Carbohydrate-containing clear liquids with or without protein, chewing gum, and pediatric fasting duration—A modular update of the 2017 American Society of Anesthesiologists practice guidelines for preoperative fasting. Anesthesiology. 138(2):132–151, 2023. doi: 10.1097/ALN.0000000000004381
3. Gu P, Lew D, Oh SJ, et al. Comparing the real-world effectiveness of competing colonoscopy preparations: Results of a prospective trial. Am J Gastroenterol. 114(2):305–314, 2019. doi: 10.14309/ajg.0000000000000057
4. ASGE Standards of Practice Committee, Saltzman JR, Cash BD, et al. Bowel preparation before colonoscopy. Gastrointest Endosc. 81(4):781–794, 2015. doi: 10.1016/j.gie.2014.09.048
5. Joshi GP, Abdelmalak BB, Weigel WA, et al; American Society of Anesthesiologists (ASA) Task Force on Preoperative Fasting. American Society of Anesthesiologists Consensus-Based Guidance on Preoperative Management of Patients (Adults and Children) on Glucagon-Like Peptide-1 (GLP-1) Receptor Agonists.
6. Hashash JG, Thompson CC, Wang AY. AGA Rapid Clinical Practice Update on the Management of Patients Taking GLP-1 Receptor Agonists Prior to Endoscopy: Communication. Clin Gastroenterol Hepatol. 2024;22(4):705-707. doi:10.1016/j.cgh.2023.11.002
7. Ushakumari DS, Sladen RN. ASA Consensus-based Guidance on Preoperative Management of Patients on Glucagon-like Peptide-1 Receptor Agonists. Anesthesiology. 2024;140(2):346-348. doi:10.1097/ALN.0000000000004776
Endoscopia por videocápsula
Na endoscopia por videocápsula (videoendoscopia sem fio), o paciente engole uma cápsula descartável contendo uma câmera que transmite imagens para um gravador externo; a cápsula não precisa ser recuperada. Essa tecnologia não invasiva fornece diagnóstico por imagem do intestino delgado que, do contrário, é difícil de obter com a endoscopia convencional.
Esse procedimento é particularmente útil em pacientes com sangramento gastrointestinal oculta e para a detecção de anormalidades.
A cápsula endoscópica é mais difícil no colo e, embora seja viável, não é comumente utilizada como uma modalidade para rastreamento de câncer colorretal (1).
Referência sobre endoscopia por videocápsula
1. Vuik FER, Nieuwenburg SAV, Moen S, et al. Colon capsule endoscopy in colorectal cancer screening: a systematic review. Endoscopy. 2021;53(8):815-824. doi:10.1055/a-1308-1297
Informações adicionais
Os recursos em inglês a seguir podem ser úteis. Observe que este Manual não é responsável pelo conteúdo desses recursos.
American Heart Association and American College of Cardiology: 2020 ACC/AHA Guideline for the Management of Patients With Valvular Heart Disease: A Report of the American College of Cardiology/American Heart Association Joint Committee on Clinical Practice Guidelines (2020)
American Society of Anesthesiologists Task Force: 2017 Practice Guidelines for Preoperative Fasting and the Use of Pharmacologic Agents to Reduce the Risk of Pulmonary Aspiration: Application to Healthy Patients Undergoing Elective Procedures: An Updated Report by the American Society of Anesthesiologists Task Force on Preoperative Fasting and the Use of Pharmacologic Agents to Reduce the Risk of Pulmonary Aspiration (2017)
American Society of Anesthesiologists Task Force: 2023 Practice Guidelines for Preoperative Fasting: Carbohydrate-containing Clear Liquids with or without Protein, Chewing Gum, and Pediatric Fasting Duration—A Modular Update of the 2017 American Society of Anesthesiologists Practice Guidelines for Preoperative Fasting (2023)