Nutrição parenteral (NP)

(Nutrição parenteral total)

PorKris M. Mogensen, MS, RD-AP, Department of Nutrition, Brigham and Women's Hospital;
Malcolm K. Robinson, MD, Harvard Medical School
Revisado/Corrigido: set. 2024
Visão Educação para o paciente

A nutrição parenteral (NP) é, por definição, administrada por via intravenosa. A NP pode ser infundida por um dispositivo de acesso venoso central ou periférico, dependendo da osmolaridade da solução.

A NP periférica pode ser infundida por meio de um dispositivo de acesso venoso periférico. A osmolaridade da solução deve ser ≤ 900 mOsm/L. Uma solução com osmolaridade mais alta pode causar tromboflebite.

A NP central requer um dispositivo de acesso venoso central para infusão segura porque as soluções formuladas para NP central têm uma osmolaridade > 900 mOsm/L.

A NP não deve ser utilizada rotineiramente em pacientes com trato gastrointestinal (GI) intacto. Em comparação à nutrição enteral, a NP tem as seguintes desvantagens:

  • Mais complicações

  • Pior preservação da estrutura e função do trato gastrointestinal

  • Maior custo

Indicações para nutrição parenteral

A NP só deve ser indicada para pacientes com trato gastrointestinal não funcionante ou que apresentam distúrbios que requerem repouso intestinal, como (1):

Referência a indicações

  1. 1. Worthington P, Balint J, Bechtold M, et al. When Is Parenteral Nutrition Appropriate?. JPEN J Parenter Enteral Nutr. 2017;41(3):324-377. doi:10.1177/0148607117695251

Necessidades nutricionais e composição das fórmulas

A NP requer que os pacientes recebam água, em geral 25 a 40 mL/kg de peso corporal/dia. Menos água é necessária para pacientes que necessitam de restrição de líquidos, energia, aminoácidos, lipídios, vitaminas e minerais (ver tabela Necessidades diárias básicas do adulto em nutrição parenteral).

Crianças que necessitam de NP podem apresentar diferentes necessidades de líquidos e mais energia (até 120 kcal/kg/dia) e aminoácidos (2,5 a 3,5 g/kg/dia).

Tabela
Tabela

Soluções para nutrição parenteral

Soluções individualizadas de NP podem ser preparadas utilizando técnicas estéreis. Para soluções individualizadas de NP, os eletrólitos podem ser ajustados com base nos resultados laboratoriais e alterações no estado clínico.

Soluções padronizadas de NP comercialmente disponíveis estão disponíveis para instituições que não têm os recursos para criar soluções individualizadas.

Preparações padronizadas de vitaminas e oligoelementos também estão disponíveis para adicionar à NP a fim de atender às necessidades de micronutrientes. A estabilidade da solução de NP depende de muitos fatores. Os médicos devem evitar a adição de eletrólitos a soluções padronizadas de NP para evitar o risco de precipitação de eletrólitos. Como a estabilidade pode ser reduzida por modificações nas soluções de NP, modificações (p. ex., adição de eletrólitos ou outras substâncias) devem ser revisadas por um farmacêutico experiente.

A composição dos macronutrientes da NP varia dependendo do tipo de solução:

  • NP periférica: concentrações menores de aminoácidos e dextrose para manter a osmolaridade baixa, sendo a maior parte das calorias proveniente de gordura

  • NP central: concentrações maiores de aminoácidos e dextrose para fornecer mais energia em menos volume

A dose de aminoácidos baseia-se nas necessidades proteicas calculadas para o paciente.

A disponibilidade de emulsões lipídicas com óleos mistos mudou a abordagem da dosagem de lipídios na NP, com a intenção de equilibrar o fornecimento de nutrientes com potenciais efeitos adversos. O óleo de soja é rico em ácidos graxos poli-insaturados ômega-6, que foram associados a efeitos pró-inflamatórios e imunossupressores. Assim, as emulsões lipídicas tradicionais com 100% de óleo de soja devem ser restritas a < 1 g/kg/dia em pacientes criticamente enfermos, mas podem ser dosadas até 1 g/kg/dia em pacientes estáveis. Emulsões lipídicas de óleos mistos incluem combinações de óleo de soja, azeite, triglicerídeos de cadeia média (TCMs) e óleo de peixe, que têm ácidos graxos poli-insaturados ômega-6 mais baixos e permitem maior distribuição total de gordura. Para adultos (estáveis e gravemente enfermos), pode-se administrar 1 a 1,5 g/kg/dia da mistura de emulsão lipídica do óleo de oliva e óleo de soja, ou 1 a 2 g/kg/dia da mistura de emulsão lipídica de óleo de soja, TCMs, azeite e óleo de peixe. Nos Estados Unidos, a emulsão lipídica de 100% de óleo de peixe não está aprovada para uso em adultos, mas é utilizada como uma terapia para crianças com doença hepática associada a insuficiência intestinal. Considerações adicionais de dosagem (p. ex., aditivos medicamentosos; cálcio, fósforo e magnésio) para assegurar a estabilidade da solução devem ser revisadas por um farmacêutico experiente. A American Society for Parenteral and Enteral Nutrition publicou recomendações para a dosagem apropriada de emulsões lipídicas (1, 2).

Se a energia total fornecida pelos aminoácidos e lipídios for menor que a energia total necessária, normalmente utiliza-se dextrose mono-hidratada para compensar o déficit. Entretanto, a quantidade máxima de carboidratos é geralmente de 5 mg/kg/minuto; administrar acima dessa quantidade pode levar à hiperglicemia. Além disso, a alimentação excessiva pode levar à produção excessiva de CO2 e à esteatose hepática; a superalimentação é frequentemente atribuída ao fornecimento excessivo de carboidratos. O uso de emulsões lipídicas mistas em óleos permite menor fornecimento de carboidratos e pode ajudar a reduzir as complicações do fornecimento excessivo de carboidratos.

Os volumes, tipos e concentrações da solução de NP variam de acordo com os fatores do paciente, como doenças concomitantes e idade:

  • Para pacientes com insuficiência cardíaca, hepática ou renal: ingestão limitada de líquidos

  • Para pacientes com diabetes: emulsão lipídica mista, fornecendo a extremidade superior do intervalo de dosagem recomendado para permitir a redução da administração de dextrose

  • Para neonatos: concentrações mais baixas de glicose (17 a 18%)

Referências sobre soluções

  1. 1. Mirtallo JM, Ayers P, Boullata J, et al. ASPEN Lipid Injectable Emulsion Safety Recommendations, Part 1: Background and Adult Considerations [published correction appears in Nutr Clin Pract. 2022 Apr;37(2):482]. Nutr Clin Pract. 2020;35(5):769-782. doi:10.1002/ncp.10496

  2. 2. Cober MP, Gura KM, Mirtallo JM, et al. ASPEN lipid injectable emulsion safety recommendations part 2: Neonate and pediatric considerations. Nutr Clin Pract. 2021;36(6):1106-1125. doi:10.1002/ncp.10778

Administração da nutrição parenteral

Como em qualquer catéter venoso central, deve-se utilizar técnica estritamente estéril durante a inserção e manutenção do cateter. O lúmen de NP da linha central não deve ser utilizado para qualquer outro propósito. A cada 24 horas deve-se trocar a sonda externa da primeira bolsa de solução de NP do dia. A American Society for Parenteral and Enteral Nutrition recomenda o uso de um filtro em linha de 1,2 micrômetros com a NP para reduzir a exposição a material particulado (1). Curativos devem ser mantidos estéreis e trocados a cada 48 horas.

Se a nutrição parenteral (NP) for administrada fora do hospital, os pacientes e seus cuidadores devem ser ensinados sobre os cuidados adequados com a linha, a administração da NP e a identificação de complicações, incluindo os sintomas de infecção. Deve-se providenciar enfermagem domiciliar qualificada.

A solução de NP é normalmente iniciada com 100 a 150 g de dextrose no primeiro dia. O volume inicial da NP pode ser restrito no primeiro dia, assim líquidos adicionais IV podem ser necessários para atender às necessidades de líquidos.

A NP deve ser ajustada com base na estabilidade eletrolítica e clínica. Se o paciente estiver hiperglicêmico, as concentrações de glicose no sangue devem ser monitoradas e insulina regular deve ser fornecida. Nenhum outro tipo de insulina é compatível com soluções de NP. O nível alvo de glicose no sangue para pacientes que recebem NP é < 180 mg/dL (10 mmol/L) enquanto a solução é infundida. A insulina regular pode ser adicionada diretamente à solução de NP conforme necessário. Uma dose inicial típica é 1 unidade de insulina regular/10 g de dextrose; pacientes com diabetes preexistente podem exigir mais insulina. A colaboração com um endocrinologista pode ajudar a otimizar o controle da glicemia.

Referência sobre administração

  1. 1. Worthington P, Gura KM, Kraft MD, et al. Update on the Use of Filters for Parenteral Nutrition: An ASPEN Position Paper. Nutr Clin Pract. 2021;36(1):29-39. doi:10.1002/ncp.10587

Monitoramento da nutrição parenteral

Uma equipe interdisciplinar de nutrição composta por médico, nutricionista, farmacêutico e enfermeiro, se disponível, deve monitorar os pacientes.

Deve-se obter um hemograma completo. Deve-se monitorar frequentemente peso, eletrólitos, magnésio, fósforo, nitrogênio da ureia sanguínea e creatinina (p. ex., diariamente para pacientes internados, semanalmente para pacientes ambulatoriais). Deve-se monitorar a glicemia a cada 6 horas até os pacientes e seus níveis de glicemia se estabilizarem. Testes hepáticos devem ser monitorados pelo menos semanalmente, mas monitoramento mais frequente pode ser necessário se os resultados dos testes forem anormais. Os níveis de triglicerídeos devem ser monitorados pelo menos 2 vezes/semana em pacientes que recebem emulsões lipídicas. A ingestão e a eliminação de líquidos devem ser monitoradas de modo contínuo.

Quando o paciente se tornar estável, testes sanguíneos podem ser feitos com menos frequência. Exames de sangue não devem ser feitos enquanto a NP está sendo infundida.

Deve-se repetir a avaliação nutricional completa (incluindo cálculo do IMC, medições antropométricas e análise da composição corporal) com a frequência exigida pelo estado clínico do paciente. Ajustes na avaliação nutricional podem ser necessários com mais frequência em pacientes criticamente enfermos e com menos frequência em pacientes ambulatoriais que estejam estáveis e recebendo NP.

Complicações da nutrição parenteral

Cerca de 5% a 10% dos pacientes com acesso de NP apresentam complicações relacionadas com o acesso venoso central.

Os índices de sepse relacionada a catéter diminuíram desde a introdução das diretrizes que enfatizam as técnicas de esterilização para inserção de catéter e os cuidados com a pele ao redor do local de inserção (1). O uso cada vez maior de equipes exclusivas de médicos e enfermeiros especializados em vários procedimentos, como a inserção de catéter, também contribuiu para a diminuição das taxas de infecção relacionada a catéter.

As complicações infecciosas associadas à NP foram reduzidas por alterações na administração da NP, como evitar alimentação excessiva, manter concentrações ideais de glicose no sangue e utilizar emulsões lipídicas mistas.

Anormalidades relacionadas à glicose são comuns. Pode-se evitar hiperglicemia monitorando a glicose plasmática, ajustando a dose de insulina na solução de NP e administrando insulina por via subcutânea conforme necessário. Hipoglicemia pode decorrer da súbita interrupção da infusão contínua de glicose. O tratamento depende do grau de hipoglicemia. Hipoglicemia recente pode ser revertida por glicose a 50% por via intravenosa; hipoglicemia mais prolongada pode requerer infusão de glicose a 5 a 10% por 24 horas antes de retomar a NP via acesso venoso central.

Complicações hepáticas envolvem disfunção hepática, hepatomegalia dolorosa e hiperamonemia. Essas complicações podem ocorrer em várias idades, mas são mais comuns em crianças, especialmente aquelas prematuras (cujos fígados ainda estão imaturos).

Disfunção hepática pode ser transitória, evidenciada pelo aumento de aminotransferases, bilirrubinas e fosfatase alcalina; é comum no início da NP. Elevações persistentes ou tardias podem resultar de excesso de aminoácidos. A patogênese é desconhecida; fatores prováveis que podem contribuir incluem colestase e inflamação. Fibrose progressiva ocorre ocasionalmente. Emulsões lipídicas de óleo de peixe podem ser benéficas; em crianças, emulsão lipídica composta por 100% de óleo de peixe é uma terapia de resgate para essa complicação.

Para crianças que desenvolvem qualquer complicação hepática, a restrição de aminoácidos a 1,0 g/kg/dia pode ser necessária.

Deve-se corrigir as alterações de minerais e eletrólitos séricos modificando as infusões subsequentes ou, se for necessária sua correção urgente, iniciando as infusões apropriadas por acesso periférico. Deficiências de vitaminas e minerais são raras se as soluções forem oferecidas do modo correto. Um nível elevado de nitrogênio da ureia sanguínea talvez reflita uma desidratação, a qual pode ser corrigida administrando-se água na forma de uma solução de glicose a 5% por veia periférica ou aumentando o volume de água fornecido na NP.

Sobrecarga de volume (ganho de peso de > 1 kg/dia) pode ocorrer quando altas necessidades de energia exigirem grandes volumes de líquidos. Um farmacêutico com experiência no controle da NP deve rever a solução para determinar se o volume da solução pode ser reduzido.

Doença metabólica óssea ou desmineralização óssea (osteoporose ou osteomalacia) ocorre em alguns pacientes que recebem NP por > 3 meses. O mecanismo é desconhecido. Doenças avançadas podem causar dor periarticular grave, nos membros inferiores e no dorso.

Reações adversas a emulsões lipídicas (p. ex., dispneia, reações alérgicas cutâneas, náuseas, cefaleia, dor nas costas, transpiração, tontura) são incomuns, mas podem ocorrer precocemente, em particular se lipídios forem dados a > 1,0 kcal/kg/hora. Pode ocorrer hiperlipidemia temporária, principalmente em pacientes com falência renal ou hepática; em geral, o tratamento não é necessário. Reações adversas tardias a emulsões lipídicas são hepatomegalia, elevação moderada das enzimas hepáticas, esplenomegalia, trombocitopenia, leucopenia e, especialmente em crianças prematuras com síndrome da angústia respiratória, anormalidades de funções pulmonares. A prevenção ou minimização dessas reações adversas pode se dar temporária ou permanentemente pela diminuição ou parada da infusão lipídica.

Complicações da vesícula biliar são colelitíase, vesícula gordurosa e colecistite. Essas complicações podem ser causadas ou piorar por prolongada estase biliar. A contração pode ser estimulada oferecendo-se 20 a 30% das calorias em gorduras e cessando-se a infusão de glicose por algumas horas. Ingestão oral ou enteral também pode auxiliar. Tratamento com metronidazol, ácido ursodesoxicólico, fenobarbital ou colecistocinina ajuda alguns pacientes com colestase.

Referência sobre complicações

  1. 1. Centers for Disease Control and Prevention (CDC): Guidelines for the Prevention of Intravascular Catheter-Related Infections (2011). Acessado em 9 de maio de 2024.

Pontos-chave

  • Considerar a nutrição parenteral para pacientes com trato gastrointestinal não funcionante ou que apresentam distúrbios que requerem repouso intestinal completo.

  • Calcular as necessidades de água, energia, aminoácidos, lipídios, vitaminas e minerais.

  • Escolher uma solução com base na idade e estado da função dos órgãos do paciente; soluções diferentes são necessárias para recém-nascidos e para pacientes com função cardíaca, pulmonar ou renal comprometida.

  • Utilizar um acesso venoso central, com técnicas estritamente estéreis durante a inserção e manutenção.

  • Monitorar atentamente complicações nos pacientes (p. ex., relacionadas com o acesso venoso central, alterações da glicemia, de eletrólitos e minerais; efeitos hepáticos ou na vesícula biliar; reações às emulsões lipídicas, e sobrecarga de volume ou desidratação).

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