Os meningococos (Neisseria meningitidis) são diplococos Gram-negativos que causam meningite e meningococemia. Os sintomas são geralmente graves, incluindo cefaleia, náuseas, vômitos, fotofobia, letargia, exantema, falência de múltiplos órgãos, choque e coagulação intravascular disseminada. O diagnóstico é clínico, confirmado por cultura. O tratamento é feito com penicilina ou cefalosporina de terceira geração.
Meningococos são diplococos aeróbios Gram-negativos que pertencem à família Neisseriaceae. Há 13 sorogrupos; 6 sorogrupos (A, B, C, W135, X e Y) causam a maioria das doenças em humanos.
A incidência global da doença endêmica é de 0,5 a 5/100.000, com um aumento no número de casos no inverno e na primavera nos climas temperados. Surtos localizados ocorrem mais frequentemente na África subsaariana entre a Gambia e o Senegal na região oeste e Etiópia, Eritreia e no norte do Quênia: essa região da África subsaariana é conhecida como o cinturão da meningite, englobando 26 países. Nas principais epidemias africanas (que frequentemente são causadas pelo sorogrupo A), as taxas de ataque variaram de 100 a 800/100.000 e afetaram até 200.000 pessoas/ano. Após a utilização generalizada da vacina antimeningocócica A no cinturão da meningite africana, o sorogrupo A foi substituído por outros sorogrupos de meningococos e pelo Streptococcus pneumoniae.
Nos Estados Unidos, a incidência anual varia de 0,12 a 1,1/100.000 pessoas. Nos últimos 20 anos, a incidência da doença meningocócica diminuiu anualmente. A maioria dos casos é esporádica, normalmente em crianças < 2 anos de idade. Surtos de doença meningocócica são raros nos Estados Unidos; apenas aproximadamente 1 em 20 casos (5%) está relacionado com um surto [ver Meningococcal Outbreaks dos Centers for Disease Control and Prevention's (CDC)]. As epidemias tendem a ocorrer nas comunidades semifechadas (p. ex., quartéis, dormitórios de escolas, escolas, creches) e mais frequentemente atingem pacientes de 16 a 23 anos de idade. Os sorogrupos B e C causam 50 a 80% da doença invasiva (1). O sorogrupo A é raro nos Estados Unidos.
Referência
1. Centers for Disease Control and Prevention: The Pink Book: Meningococcal Disease. Acessado em 24/08/2022.
Doenças causadas por meningococos
Meningite e sepsia são responsáveis por mais de 90% das infecções meningocócicas
Meningococcemia
(Ver também Meningite bacteriana em lactentes com mais de 3 meses de idade.)
Infecções em pulmões, articulações, vias respiratórias, órgãos geniturinários, reto, olhos, endocárdio e pericárdio podem ocorrer, mas são menos comuns.
Identificou-se que a N. meningitidis causa uretrite e cervicite. Recentemente, a incidência de uretrite meningocócica aumentou em homens que fazem sexo com homens e normalmente ocorre depois de contato orogenital com um portador meningocócico orofaríngeo. N. meningitidis coloniza a nasofaringe. N. meningitidis também pode causar proctite em homens que fazem sexo com homens.
Fisiopatologia das doenças meningocócicas
Meningococos podem colonizar a nasofaringe assintomaticamente (estado de portador). Apesar das altas taxas de colonização documentadas (5 a 40% das pessoas saudáveis), que podem ser transitórias, breves ou prolongadas, a transição para doença invasiva é rara (< 1%). Uma combinação de fatores é provavelmente responsável pela transição entre estado de portador e doença invasiva, o que ocorre principalmente em pacientes não infectados anteriormente. Os portadores (e pacientes infectados) podem transmitir o microrganismo para pessoas que têm contato direto com secreções respiratórias ou que inalam núcleos de gotículas grandes de um portador ou paciente. As taxas de portador na nasofaringe são mais altas entre os adolescentes e adultos jovens, que servem como reservatórios para a transmissão de N. meningitidis. As taxas de portador aumentam dramaticamente nas epidemias.
Após invadir o corpo, N. meningitidis causa meningite e bacteremias importantes em crianças e adultos, resultando em efeitos vasculares profundos. A infecção pode se tornar rapidamente fulminante. A taxa de casos letais é 4 a 6% somente para a meningite, em comparação a até 40% para a meningococcemia com choque séptico.
Fatores de risco
As pessoas infectadas com mais frequência são
Crianças de 6 meses a 3 anos de idade
Outros grupos de alto risco incluem
Adolescentes e adultos jovens (16 a 20 anos)
Recrutas militares
Calouros universitários que moram em dormitórios
Viajantes para regiões onde a doença meningocócica é comum (p. ex., certos países na África e na Arábia Saudita durante o Hajj)
Pessoas com asplenia anatômica ou funcional ou deficiência do complemento
Pessoas vivendo com infecção pelo HIV
Pessoas tratadas com eculizumabe ou ravulizumabe
Microbiologistas que trabalham com amostras de N. meningitidis
Contatos próximos de pacientes com doença meningocócica invasiva
Infecção ou vacinação conferem imunidade tipo-específica.
Infecção viral antecedente, unidades familiares com muitas pessoas, doença subjacente crônica e tabagismo, tanto ativo como passivo, estão associados a maior risco de doença meningocócica (1).
Referência sobre fisiopatologia
1.Mbaeyi SA, Bozio CH, Duffy J, et al: Meningococcal Vaccination: Recommendations of the Advisory Committee on Immunization Practices, United States, 2020. MMWR Recomm Rep 69(No. RR-9):1–41, 2020. doi: 10.15585/mmwr.rr6909a1
Sinais e sintomas das doenças meningocócicas
Pacientes com meningite comumente relatam febre, cefaleia e rigidez de nuca. Outros sintomas incluem náuseas, vômitos, fotofobia e letargia. Um exantema maculopapular ou hemorrágico petequial surge logo após a instalação da doença. Sinais meníngeos estão presentes com frequência ao exame físico.
As síndromes de meningococcemia fulminante incluem a síndrome de Waterhouse-Friderichsen (sepse, choque profundo, púrpura cutânea e hemorragia suprarrenal), sepse com falência de múltiplos órgãos, choque e coagulação intravascular disseminada. Uma meningococcemia rara e crônica provoca sintomas leves recorrentes (principalmente articulares e cutâneos).
As complicações da meningite meningocócica são comuns e graves. Dos pacientes que se recuperam, 10 a 20% ficam com sequelas graves, como surdez irreversível, retardo mental, ou perda de falanges ou extremidades.
A meningococemia fulminante causa inicialmente petéquias, que coalescem e evoluem rapidamente para equimoses.
Imagem cedida por cortesia de Mr. Gust via the Public Health Image Library of the Centers for Disease Control and Prevention.
Petéquias e púrpura são visíveis na face da criança. O retorno de sangue pela sonda nasogástrica é compatível com coagulação intravascular disseminada, também secundária à meningococemia.
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Imagem cedida por cortesia de Karen McKoy, MD.
As petéquias e a púrpura secundárias à meningococcemia são generalizadas. As lesões tendem a ser comuns no tronco e nos membros inferiores.
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As petéquias são isoladas em algumas regiões e coalescentes, evoluindo para necrose em outras regiões (à esquerda). Uma grande área da necrose é vista (à direita).
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Diagnóstico das doenças meningocócicas
Coloração de Gram e cultura
Às vezes, testes baseados em ácido nucleico (NAAT) como reação em cadeia da polimerase (PCR)
Neisseria são diplococos pequenos e Gram-negativos prontamente identificados com a coloração de Gram e por outros métodos de identificação bacteriológica padrão. Métodos sorológicos, como aglutinação do látex e coaglutinação, permitem um diagnóstico presuntivo rápido de N. meningitidis no sangue, no líquido cefalorraquidiano, no líquido sinovial e na urina. No entanto, os resultados positivo e negativo devem ser confirmados por cultura.
Testes de PCR do líquido cefalorraquidiano, sangue e outros locais normalmente estéreis para N. meningitidis são mais sensíveis e específicos do que cultura e podem ser úteis quando a coloração de Gram do líquido cefalorraquidiano é negativa e quando a administração prévia de antibióticos interfere no isolamento do organismo.
Como os meningococos e gonococos parecem semelhantes à coloração de Gram, deve-se considerar uretrite meningocócica se a secreção uretral mostrar diplococos Gram-negativos, mas o NAAT for negativo para gonococos; essa situação exige cultura da secreção uretral para identificar as espécies Neisseria causadoras da infecção (ver Diseases Characterized by Urethritis and Cervicitis do CDC).
Tratamento das doenças meningocócicas
Ceftriaxona
Dexametasona
Enquanto aguardam a identificação definitiva do agente etiológico, adultos imunocompetentes com suspeita de infecção meningocócica devem receber uma cefalosporina de terceira geração (p. ex., cefotaxima 2 g IV a cada 4-6 horas, ceftriaxona 2 g IV a cada 12 horas) ou meropenem (2 g IV a cada 8 horas) mais vancomicina 15 a 20 mg/kg IV a cada 8 a 12 horas. A cobertura para Listeria monocytogenes deve ser considerada para pacientes imunocomprometidos e com > 50 anos de idade, associando-se ampicilina, 2 g, IV a cada 4 horas. O moxifloxacino, um antibiótico fluoroquinolona, é uma alternativa a pacientes alérgicos à penicilina e às cefalosporinas.
Depois que a N. meningitidis tiver sido definitivamente identificada, o tratamento de escolha é um dos seguintes:
Ceftriaxona 2 g IV a cada 12 horas
Penicilina 4 MUI IV a cada 4 horas
Em muitos países, a penicilina G ainda é a primeira escolha para a doença meningocócica invasiva. Entretanto, como muitos países, incluindo os Estados Unidos, têm maior incidência de isolados com suscetibilidade reduzida à penicilina, esses países normalmente administram o tratamento inicial com uma cefalosporina de terceira geração, como ceftriaxona ou cefotaxima. Além disso, ao utilizar penicilina, o tratamento de acompanhamento com ceftriaxona, ciprofloxacino ou rifampicina é necessário para eliminar o transporte nasofaríngeo. Tem havido relatos de isolados resistentes à penicilina e às cefalosporinas de terceira geração.
Os corticoides diminuem a incidência de complicações neurológicas em crianças e adultos com suspeita de meningite bacteriana por Haemophilus influenzae tipo b ou S. pneumoniae. As evidências são menos claras quando a N. meningitidis é a causa. Entretanto, altas doses de corticoides pioram o resultado no choque meningocócico sem meningite e não devem ser utilizadas nesses casos; mas pode-se utilizar baixas doses de corticoides em pacientes com função suprarrenal inadequada. Quando utilizados, devem ser administrados com ou antes da primeira dose dos antibióticos. Dexametasona, 0,15 mg/kg, IV a cada 6 horas, para crianças e 10 mg IV a cada 6 horas para adultos, é administrada durante 4 dias.
Trata-se a uretrite meningocócica com os mesmos esquemas farmacológicos que a uretrite gonocócica. O risco de transmissão sexual da uretrite meningocócica não está claro; entretanto, pode-se considerar o tratamento dos parceiros sexuais (ver Diseases Characterized by Urethritis and Cervicitis do CDC).
Prevenção das doenças meningocócicas
Profilaxia antibiótica
Contatos íntimos de pessoas com doença meningocócica estão sob risco maior de adquirir doença e devem receber antibiótico profilático.
As opções incluem
Rifampicina, 600 mg (para crianças ≥ 1 mês de idade, 10 mg/kg; para crianças < 1 mês, 5 mg/kg) por via oral a cada 12 horas, por 4 doses
Ceftriaxona, 250 mg (para crianças < 15 anos, 125 mg; para crianças ≥ 15 anos, 250 mg) IM em 1 dose
Em adultos, uma fluoroquinolona (ciprofloxacino ou levofloxacino, 500 mg, ou ofloxacino, 400 mg), por via oral, em 1 dose; para crianças ≥ 1 mês, ciprofloxacino 20 mg/kg por via oral em 1 dose (dose máxima de 500 mg)
Normalmente a azitromicina não é recomendada, mas um estudo recente mostrou que uma única dose de 500 mg era equivalente à rifampicina para a quimioprofilaxia e poderia ser uma alternativa para pacientes com contraindicações aos fármacos recomendados.
Há relatos de doença meningocócica resistente ao ciprofloxacino, embora rara, em diversos países (Grécia, Inglaterra, Escócia, Austrália, Espanha, Argentina, França e Índia) e em 2 estados norte-americanos (North Dakota e Minnesota). Ao escolher um antibiótico para profilaxia pós-exposição, os médicos devem considerar as notificações locais de meningococos resistentes ao ciprofloxacino.
Vacinação
Ver Vacina meningocócica para obter informações adicionais, incluindo indicações, contraindicações e precauções, dosagem e administração e efeitos adversos. Ver também os cronogramas de vacinação para crianças e adultos do Centers for Disease Control and Prevention (CDC) e as recomendações de vacinas meningocócicas do Advisory Committee on Immunization Practices (ACIP).
Há várias vacinas meningocócicas:
Três vacinas conjugadas quadrivalentes (MenACWY-D, MenACWY-CRM e MenACWY-TT) que protegem contra 4 dos 6 sorogrupos patogênicos comuns do meningococo (todos, exceto B e X) estão disponíveis.
Uma vacina conjugada bivalente que protege contra os sorogrupos C e Y só está disponível em combinação com toxoide tetânico e vacina tipo b contra Haemophilus influenzae (Hib-MenCY-TT) está aprovada para crianças de 6 semanas a 18 meses com maior risco de doença meningocócica; entretanto, a Hib-MenCY-TT não está mais disponível nos Estados Unidos (1).
Uma vacina polissacarídea tetravalente (MPSV4) para uso em pacientes selecionados com ≥ 56 anos não está mais disponível nos Estados Unidos.
Há duas vacinas monovalentes que protegem contra o sorogrupo B (MenB-4C e MenB-FHbp) disponíveis.
Todas as crianças devem receber uma vacina conjugada quadrivalente aos 11 anos a 12 anos de idade, com uma dose de reforço aos 16 anos (ver também o cronograma de vacinação infantil de rotina). Também recomendam-se essas vacinas para adultos com maior risco.
Recomenda-se MenB-4C ou MenB-FHbp para pessoas ≥ 10 anos com maior risco de doença meningocócica do sorogrupo B.
Referência sobre prevenção
1. Mbaeyi SA, Bozio CH, Duffy J, et al: Meningococcal vaccination: Recommendations of the Advisory Committee on Immunization Practices, United States, 2020. MMWR Recomm Rep 69(No. RR-9):1–41, 2020. doi: 10.15585/mmwr.rr6909a1
Pontos-chave
Meningite e meningococemia são responsáveis por mais de 90% das infecções meningocócicas.
Um estado de portador nasofaríngeo assintomático; a transmissão na maioria das vezes ocorre por contato direto com secreção respiratória de um portador.
Nos Estados Unidos, a maioria dos casos é esporádica, normalmente em crianças < 2 anos de idade, mas podem ocorrer epidemias, principalmente em comunidades semifechadas (p. ex., quartéis, dormitórios de universidades, escolas, creches) e muitas vezes envolve pacientes de 16 a 23 anos de idade.
Tratar com ceftriaxona ou penicilina; acrescentar dexametasona para pacientes com meningite.
Administrar a contatos próximos um antibiótico profilático.
Vacinar todas as crianças a partir dos 11 ou 12 anos idade, e vacinar seletivamente crianças mais jovens e outras pessoas de alto risco.
Informações adicionais
Os recursos em inglês a seguir podem ser úteis. Observe que este Manual não é responsável pelo conteúdo desses recursos.
Centers for Disease Control and Prevention (CDC): Vaccine schedule for children 18 years of age or younger
CDC: STI Treatment Guidelines 2021: Diseases Characterized by Urethritis and Cervicitis
Advisory Committee on Immunization Practices (ACIP): Meningococcal vaccine recommendations